Gestão Temer resultou em aumento da desigualdade social

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Marcado pela crise econômica e imposição de um teto de gastos públicos, o governo Michel Temer chega ao fim com aumento da desigualdade social, além de estagnação em alguns indicadores sociais, de saúde e educação.

Com orçamentos limitados ou reduzidos, houve fechamento de unidades para entrega de medicamentos no Farmácia Popular e uma nova política de atenção básica, que abriu espaço para um menor número de profissionais em unidades de saúde.

Para tentar imprimir a marca de mudança pós impeachment de Dilma Rousseff (PT), Temer apressou o lançamento de reformas estruturais que já eram discutidas em outras gestões. É o caso da reforma do ensino médio e da finalização da Base Nacional Comum Curricular, que define o que alunos devem aprender na atenção básica.

A crise e a baixa capacidade do país de ampliar investimentos sociais se refletem no aumento do número de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, com rendimentos menores de R$ 232 por mês. Segundo estudo da FGV Social, de setembro, o país contabiliza 23,3 milhões de pessoas nessa situação, um salto de 33% em quatro anos.

O volume de beneficiados pelo programa Bolsa Família foi mantido: cerca de 14 milhões de famílias.
Com o país em crise, houve aumento nas taxas de mortalidade infantil e materna, registrados em 2016 e divulgados neste ano. Também cresceram as mortes consideradas prematuras por doenças crônicas entre pessoas de 30 a 69 anos.

No mesmo ano, a vacinação de crianças atingiu seu pior índice e o país voltou a ter aumento de doenças quase eliminadas, como a malária e o sarampo.

Para Ronald Santos, que foi presidente do Conselho Nacional de Saúde, a piora coincide com a queda no financiamento, o que desequilibrou parte da assistência em saúde. “A situação, que já era crítica, ficou ainda mais”, afirma.

Ele lembra que, em meio à falta de recursos, o governo passou a discutir os limites da gestão. “Houve um embate de tratar a saúde como direito ou negócio. Se for tratar como negócio, ao fim vai chamar para si a responsabilidade de quem vai viver ou morrer.”

Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, avalia que o reajuste pelo teto de gastos foi a “principal marca negativa” da gestão. “É absolutamente incompatível com as necessidades do SUS.”

Na análise de estudiosos da área social, o teto de gastos, aprovado em dezembro de 2016, congelou os orçamentos em níveis considerados baixos e que haviam sido enxugados.

Na educação, o governo Temer abraçou como bandeiras políticas consideradas mais baratas do que enfrentar as metas do PNE (Plano Nacional de Educação). Aprovado em 2014, o plano prevê pontos que vão da valorização dos professores à inclusão de crianças e jovens fora da escola e das universidades.

Tanto a reforma do ensino médio, que vai flexibilizar a grade horária dos estudantes, quanto a Base ganharam prioridade. “A base é muito mais barata do que atacar questões como valorização de carreira, infraestrutura das escolas”, diz Fernando Cássio, professor da Universidade Federal do ABC.

O documento é apontado por especialistas como uma ferramenta importante para garantir equidade do sistema, uma vez que define direitos de aprendizagem a ser buscados por todas as redes. Os efeitos dependem do sucesso de implementação.

Segundo Claudia Costin, da FGV, o tema também dominou a agenda educacional quando foi desenvolvido em outros países. “São construções importantíssimas”, diz ela, que é colunista da Folha.

Mas Claudia também critica o teto de gastos. “O país precisa tornar a profissão de professor mais atrativa. E não tem como mexer em salário colocando um teto.”

Outra meta educacional que não esteve entre as prioridades foi a inclusão. Há 2,7 milhões de crianças e jovens fora da escola.

São, sobretudo, crianças de até 4 anos sem vagas em creches e pré-escolas e jovens entre 15 a 17 anos que deviam estar no ensino médio, mas abandonaram os estudos.

Com relação a creches, o governo federal tem uma política de colaboração com municípios. A efetivação desses investimentos tem patinado desde o governo Dilma.

Em maio de 2016, havia 2.127 obras de creches em andamento e 412 paralisadas. Até dezembro deste ano, 947 foram concluídas, mas 328 continuam paralisadas e 2.208, em execução.

A ONG Transparência Brasil fez um estudo sobre obras de creches e escolas com recursos do governo federal no período de 2007 a 2018. Estima-se que foram repassados R$ 1 bilhão para obras paralisadas.

“Há uma péssima implementação e monitoramento. Quanto mais burocracia o governo federal coloca, mais difícil é para os municípios conseguirem a verba”, diz a diretora de operações da Transparência, Juliana Sakai.

Segundo o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), a contratação e gestão das obras são atribuição do governo local. Ao órgão, diz a nota, cabe o acompanhamento dos trabalhos e a liberação gradual dos recursos.

Pesquisas têm mostrado que o acesso à educação na primeira infância tem grande potencial de impacto na vida adulta. Menos de um terço das crianças até 3 anos estão em creche.

Com relação a esse tema, o governo Temer apostou no programa Criança Feliz, que visita famílias para orientações sobre desenvolvimento infantil. O programa atingiu, segundo o governo, 355 mil crianças e 65 mil grávidas.

O desafio do país nos anos seguintes não é falta de vaga, mas fazer com que os estudantes permaneçam na escola –e aprendam. Quatro em cada dez jovens de até 19 anos parou de estudar antes de completar o ensino médio.

O governo lançou um programa de incentivo a escolas de tempo integral de ensino médio, com foco nas que têm alunos mais pobres.

Entre 2017 e 2018 foram apoiadas 981 escolas, e gasto R$ 1 bilhão. A previsão é ter mais 220 escolas em 2019.

Mudanças de rumo em programas-chave na área da saúde geraram polêmica. Unidades próprias do Farmácia Popular foram fechadas sob a justificativa de que até 80% dos gastos ocorriam com logística e manutenção das unidades. Usuários, no entanto, passaram a relatar dificuldades para ter acesso a produtos.

Qualificado como “temporário” pelo ministro Ricardo Barros no início de sua gestão, o Mais Médicos acabou mantido. Neste ano, no entanto, uma tentativa de alterar parte das regras do programa acabou por deixar mais de 2.000 vagas sem reposição.

Da FSP