Netanyahu usa Bolsonaro para desviar foco de seus escândalos de corrupção

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Benjamin Netanyahu deixou para trás um clima tenso em Israel, onde enfrenta um escândalo de corrupção e se viu forçado a convocar eleições antecipadas para abril, para abraçar uma atmosfera mais aprazível no Rio de Janeiro. O premiê conservador desembarcou no Brasil com a mulher Sara e o filho Yair em uma viagem de cinco dias, todo um gesto para dar as boas-vindas ao ultradireitista Jair Bolsonaro, que toma posse na presidência brasileira na terça-feira e tem como um das bandeiras fazer de Israel um “irmão” do Brasil. “Israel é a terra prometida e o Brasil é a terra da promessa. Israel quer ser parceiro do Brasil nessa empreitada”, retribuiu Netanyahu após um encontro com o brasileiro no Forte de Copacabana nesta sexta.

Houve extensa troca de elogios e promessas de parcerias inéditas. De fato, o encontro é um marco histórico. É a primeira vez que um primeiro-ministro de Israel vem ao Brasil desde a criação do Estado judeu, em 1948. Bolsonaro no poder, por sua vez, representa uma guinada pró-Tel Aviv na tradicional posição moderada do Brasil no conflito do Oriente Médio, com a defesa da solução dos dois Estados (Israel e Palestina).

O encontro deixou evidente, no entanto, que nem todos os planos são de simples execução ou se tornam realidade sem custos. Depois de prometer durante a campanha e mesmo já eleito que mudaria a embaixada brasileira para Jerusalém, Bolsonaro ignorou o tema no encontro desta sexta-feira. O futuro Governo sofre pressão, inclusive de seus próprios integrantes e apoiadores ligados ao agronegócio, para estudar melhor o traslado da representação diplomática –já feito Donald Trump. Há o temor de que a mudança traga represálias comerciais dos países árabes, entre os principais compradores de frango brasileiro.

Negócios em segurança

Saia ou não saia a troca do local da embaixada, Netanyahu já tem motivos para satisfação. O entusiasmo de Bolsonaro pode se converter em negócios, em especial na área de segurança e de tecnologia, pontos fortes da exportação de Israel. “Entendemos que a nossa cooperação mútua pode render enormes benefícios aos nossos povos, na economia, na segurança, na agricultura, em recursos hídricos, indústria, em todos as esferas da atividade humana”, disse o israelense.

A exibição de aliança estratégica é também mais um capítulo da articulação de uma espécie de “internacional da direita”, ou da ultradireita, pelo mundo, na qual o premiê israelense quer jogar como um ator relevante e o brasileiro se apresenta como novo garoto do bairro. Antes da simbólica visita a Bolsonaro, Netanyahu recebeu em seu país Matteo Salvini, o populista vice-primeiro-ministro italiano. Também recebeu, por exemplo, o presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, e o chefe do Executivo da Hungria, Viktor Orbán. O ultranacionalista húngaro, não por acaso, é um dos esperados chefes de Estado na posse de Bolsonaro, em Brasília, na terça – ao todo, 12 mandatários devem vir, mas o cerimonial do futuro presidente se recusa a divulgar a lista de nomes completa alegando questões de segurança.

“Foi com muita alegria que hoje conheci a um homem que para mim é exemplo de patriotismo, abnegação e de trabalho por seu povo. Um capitão (do Exército) como eu, com uma história que serve de exemplo a todo cidadão de bem”, elogiou Bolsonaro. Para o futuro presidente brasileiro, o afago do israelense é o ápice de uma bem-sucedida aliança com o empresariado judeu conservador no Brasil, um dos primeiros setores da elite a lhe abrir as portas sem se importar com seu histórico de frases racistas e homofóbicas. Sem falar que a visita também lhe rende prestígio com outro público estratégico: os evangélicos. Uma das principais bases do futuro Governo, os neopentecostais fomentam uma relação forte com Israel em nome dos “valores judaico-cristãos”.

No Rio, Netanyahu visitou ainda nesta a sinagoga Beit Yaakov ao lado de Bolsonaro. No domingo, há a previsão de que se reúna com jornalistas, líderes da comunidade judaica e Amigos Cristãos de Israel antes de viajar a Brasília na segunda. Após a posse na terça, o premiê volta para Israel – e para seus problemas internos.

Do El País