Índice de competitividade global de talentos coloca Brasil na 72ª posição entre 129 países
Uma das principais escolas de administração do mundo, a Insead divulgou nesta segunda-feira (21) no Fórum Econômico Mundial de Davos um índice de competitividade global de talentos que deixa o Brasil com a 72ª posição entre 129 países. Na comparação histórica foi a nação que mais caiu desde a primeira divulgação do indicador, em 2013. O professor associado da Insead, Felipe Monteiro, que é um dos responsáveis pela elaboração do índice, explica os principais motivos dessa queda na avaliação. A seguir, trechos da entrevista.
O que mede exatamente o índice global de competitividade de talentos 2019?
Felipe Monteiro: Várias dimensões de um país, ou de uma cidade, de atrair, de reter, e aumentar talentos. O que a gente vê mais e mais é o grau de dependência dos países dos talentos que atraem. Quando mais competitivo for o cenário econômico, quanto mais o trabalho for de alto valor agregado, mais importante será você contar com as melhores pessoas, mais capacitadas, e, ao mesmo tempo, conseguir mantê-las no seu país. Há uma grande variação ao redor do mundo, com países que são mais, ou menos, competitivos para a atração de talentos.
Essa exigência de talentos será cada vez maior na medida em que se atravessa era revolução digital que estamos assistindo. Os empregos no mercado e trabalho vão mudar e vão exigir um nível de capacitação maior dos trabalhadores…
FM: Com certeza. A nossa previsão é a de que, quanto percebermos os efeitos da transformação digital, de novas tecnologias, e de economias integradas, novos ecossistemas, novas plataformas, mais você exigir dos talentos que você tem. E, por outro lado, mais competitiva será essa dinâmica global, porque, todos os países que têm economias mais avançadas, vão estar competindo pelos mesmos talentos.
E possivelmente deixando para trás, aqueles países que não tiverem se preparado, que não investiram nos seus próprios talentos.
FM: Certamente. E é interessante pensar que não é só apenas investir, mas ter a capacidade de retê-los. Você pode imaginar o caso de um país que investiu muito nos seus talentos, mas não consegue mantê-los. É o chamado “brain drain”, quando as pessoas (os cérebros) acabam saindo do seu país.
No ranking de 2019, quais os países que se saíram melhor? Têm sido mais ou menos os mesmos ao longo dos anos, não?
FM: Existe, como você falou, uma estabilidade grande dos países que estão no topo. Esse ano, mais uma vez, a Suíça lidera o nosso ranking, sendo seguida por Singapura, Estados Unidos, Noruega, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Holanda, Reino Unido e Luxemburgo. É um grande número de países europeus entre os 10 com as maiores notas.
O Brasil ficou com a 72ª posição…
FM: O Brasil não está bem posicionado no ranking. Historicamente, nunca esteve.
E por que esses outros países se saem melhor do que o Brasil? E o que eles fazem, que o Brasil não faz?
FM: O interessante de se olhar um índice como o nosso é que temos muitas variáveis. Seria muito difícil você isolar apenas uma razão. É um conjunto de medidas que esses países conseguem colocar entre prática. E aí vai desde o ambiente de negócios à facilidade que eles têm, em termos de contratar, demitir funcionários, qual é a relação entre trabalhadores e as empresas, qual é a qualidade do sistema educacional, qual é a própria atração de talentos e a capacidade de mantê-los, qual é o nível de segurança pessoal que esses talentos têm, qual o nível de atratividade que essas cidades ou países têm. A maneira importante de ver isso é, para estar bem posicionado num índice como esse, você precisa ter esse conjunto que a gente de fato acredita que faz o país competitivo. Não é apenas um elemento.
Quais são as principais deficiências do Brasil no ranking?
FM: Esse ano, pela primeira vez, a gente está fazendo uma análise histórica, comparando os três primeiros anos do índice com os três últimos. Por que isso é importante? Porque se você olha de ano a ano, um único elemento pode distorcer o resultado, com flutuações muito específicas. Nesse ponto, o Brasil está mal. Cai da 50ª para 62ª posição (entre 129 países). É maior queda entre todos os países do mundo nessa comparação histórica que nós estamos fazendo. Variáveis como o quão difícil é contratar, falsidade de fazer negócios, produtividade, o Brasil está mal nesses pontos. E também, em termos de diversidade, em termos de oportunidades de liderança para as mulheres. Um dos pilares do nosso índice é capacidade de reter os talentos. E um dos pontos que vemos é a variável segurança pessoal, e, neste quesito, o Brasil está em 115° lugar.
Entre quantos países?
FM: Entre 129. Então, você olha um tema que pode parecer não diretamente relacionado à competitividade em termos de talento, como segurança. E isso é um fato que não permite ao Brasil reter mais talentos.
O tema do encontro do Fórum Econômico Mundial em Davos esta semana, a “Globalização 4.0”, um momento novo que vivemos em que o mundo está cada vez mais conectado, novas tecnologias avançando, e isso deve mudar as relações entre os países, as sociedades, e as próprias relações de trabalho, etc. Como é que os países podem se preparar para essa Globalização 4.0, que, pelo que os especialistas dizem, é inevitável?
FM: Concordo plenamente com essa avaliação. Ela já está em marcha e vai se acentuar. Vai mudar muito a maneira de gente trabalhar. Você fala na “Revolução Industrial 4.0”, e o tema do nosso relatório esse ano é talento empreendedor. Como é que essas duas coisas estão relacionadas? Quando a gente pensa em transformação digital, são duas palavras: transformação e digital. Então tem essa renovação tecnológica, novas tecnologias digitais em que o talento tem que estar preparado para trabalhar nisso, nova maneira de pensar, de educação. Mas a outra palavra é a transformação. E para ser capaz de transformar as empresas, a gente precisa de um tipo de pessoas que chamamos de talento empreendedor: pessoas que sejam extremamente ágeis, flexíveis, capazes de ter uma mentalidade de aceitar essa mudança e trabalhar com o novo. Isso é uma característica muito forte no nosso relatório e está completamente conectado com essa Revolução Industrial 4.0.
E isso quer dizer, então, que, quanto mais você se preparar para esse momento, maior a sua competitividade no mundo novo. E quem não fizer, vai ficar para trás. Os países que não investirem nisso vão ficar para trás.
FM: Concordo com a sua avaliação. É super importante você se preparar. E a gente perceber que, em termos de talento, dá para ver no relatório também um aumento das desigualdades: de países cada vez mais competitivos em termos de talento e outros que acabam perdendo essa competitividade. Tem que se preparar agora para não perder o bonde.
A gente tem como comparar o desempenho do Brasil no ranking com outros países da América Latina?
FM: A América Latina em geral, talvez com a exceção do Chile, não tem o desempenho forte. Quando compara os países no topo com os que estão no final do ranking. Os latino-americanos estão, em sua maioria, concentrados no final do ranking.