Violência contra mulher aumenta risco de suicídio
A violência de repetição aumenta o risco não apenas do feminicídio, mas também do suicídio, mostra estudo inédito do Ministério da Saúde obtido pelo Estado. Dados reunidos pela diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis, Maria de Fátima Marinho de Souza, indicam que 4 entre 10 óbitos de mulheres que já tinham registro de atendimento no SUS por violência apresentavam histórico de lesões auto provocadas.
“Esse foi um dado que nos chamou a atenção, principalmente entre mulheres adultas e as idosas”, afirmou Maria de Fátima. Entre adultas, a lesão auto provocada foi identificada em 47,9% dos casos. Entre idosas, o porcentual foi de 49,9%.
A diretora observa que a violência crônica atualmente é classificada como um fator de risco para as lesões provocadas pela própria vítima que, por sua vez, são vistas como um fator de risco para suicídio. “Outro sinal da importância do diagnóstico precoce, de ter uma rede atuante e eficaz para identificar essas vítimas e ajudá-las a superar o ciclo da violência.”
O trabalho coordenado por Maria de Fátima mostra também o perfil dos óbitos de mulheres que eram vítimas de violência crônica. A maior parte das vítimas adolescentes e jovens era negra (52,6% e 52%, respectivamente). E, em todas as fases da vida, a baixa escolaridade foi destaque. Ela foi maioria entre jovens (61,5%), adultas (66,25) e idosas (83,7%). Mais de um terço dos municípios de residências das mulheres, em todos os ciclos de vida, era de até 50 mil habitantes. “É mais um sinal da interiorização da violência”, constata Fátima.
Para a ex-subsecretária de políticas públicas do governo do Distrito Federal, Alexandra Costa, a Escola sem Partido representará um retrocesso para a estratégia de combate à violência contra menores e contra mulheres. “A escola é um espaço para informação, para a construção da cidadania. Impedir a discussão, sobretudo das questões de gênero, é desperdiçar uma oportunidade de prevenção”, observou.
Estudos indicam que cerca de 50% dos abusos cometidos contra menores de 13 anos ocorrem nos ambientes domiciliares. “A escola pode nesses casos ser o primeiro ponto de apoio da criança para que o ciclo de violência seja rompido”, observou.
Também é na escola, afirma Alexandra, que a igualdade de gênero pode ser debatida e consolidada. Um dos exemplos citados é o programa Mulheres Inspiradoras, idealizado pela professora do governo do Distrito Federal, Gina Viera.
A ideia surgiu depois de ver um vídeo de uma aluna de 13 anos dançando uma música com letra que depreciava a mulher. “O projeto procura mostrar histórias de mulheres com características diferentes, mas todas com impacto positivo na comunidade”, conta Alexandra.
No Distrito Federal, a estrutura existente para a prevenção de violência e amparo às vítimas é considerada adequada pelo promotor Fausto Lima. Mas ele observa que não bastam as estruturas de atendimento. “É preciso também que se dê a devida importância para os relatos, que investigações sejam levadas adiante e que a violência ou o ciúme não sejam considerados apenas uma coisa de casal”, observa. “Procuramos aqui fazer um trabalho integrado, há profissionais capacitados, conscientes do grave problema”, observou. Mas ele diz que isso não é regra no País.
Para tentar melhorar a identificação de casos de violência, no Distrito Federal todas as suspeitas de homicídio contra mulheres – qualquer que seja a idade – são registradas como feminicídio. “Se com as investigações outras causas são identificadas, o crime passa a ser classificado como homicídio”, conta Alexandra.
Há também um questionário padrão, que começou a ser usado no Distrito Federal e agora é recomendado em todo o País. Ele traz perguntas simples, para serem preenchidas por mulheres que chegam às delegacias. “Muitas vezes, nem mesmo as vítimas consideram isso como violência. O questionário é importante para depois instruir as investigações”, completa Lima.
A ex-secretária Nacional de Políticas para Mulheres, Marcy Figueiredo informou que a ideia é o uso nacional desse questionário. Para ela, a estrutura de apoio às mulheres vítimas de violência é muito desigual no País. “Em alguns lugares, há equipamentos subutilizados. Em outros locais, a oferta disponível é muito menor do que a demanda.”
Do Estadão