É muito importante saber quem foi Chico Mendes
Assassinado de forma covarde perto de casa, em Xapuri, no Acre, o ambientalista Chico Mendes foi um líder seringueiro que defendia sua classe e a preservação da Floresta Amazônica. Talvez seu maior legado seja a aliança formada entre seringueiros e líderes indígenas, além de castanheiros, pequenos pescadores e outros moradores de comunidades ribeirinhas.
Todos engajados em manter a vegetação local, da qual suas vidas dependiam diretamente. Seu trabalho motivou a criação de reservas extrativistas, para colheita não predatória de matéria prima, aliando a subsistência das populações locais e proteção ambiental.
Seringueiro desde criança e sindicalista a partir do final dos anos 70, Francisco Alves Mendes Filho liderou, em 1985, o Encontro Nacional dos Seringueiros.
Foi durante o evento que começou a tomar forma a União dos Povos da Floresta, reunindo representantes daquelas populações e classes de trabalhadores a quem sempre interessou conservar a cobertura verde no Norte do país. Em pouco tempo, o ambientalista chamou atenção de organismos internacionais, denunciando a devastação da floresta à ONU, ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e ao Senado dos Estados Unidos.
As denúncias, somadas às desapropriações de terra para criação de reservas extrativistas na região, provocaram a ira de fazendeiros locais, que viam na mobilização liderada pelo sindicalista um obstáculo para seus negócios. Chico relatou diversas vezes, à imprensa e à polícia, que vinha sofrendo ameaças e até mesmo atentados contra sua vida.
Na noite de 22 de dezembro de 1988, ele foi morto com um tiro de escopeta nos fundos de sua casa, quando saiu para tomar banho. Tinha 44 anos e era pai de duas crianças. O crime, cometido pelo filho de um fazendeiro a pedido do pai, gerou comoção nacional, tornando-o um mártir da Amazônia.
No artigo abaixo, publicado pelo GLOBO no dia 28 de maio de 1988, meses antes da morte do ambientalista, o jornalista e escritor Alfredo Sirkis, fundador do Partido Verde, descreve o perigo das motosserras para as florestas do Acre, o ativismo dos seringueiros liderados por Mendes e os atentados contra o ambientalista.
As motos-serras roncam novamente no Acre. Depois de uma pausa que vinha desde as grandes queimadas do ano passado e tiveram graves repercussões internacionais, os desmatadores voltam a agir, a todo vapor. Sua ação só encontra um grande obstáculo pela frente: a consciência ecológica e a disposição de luta e sobrevivência dos seringueiros de Xapuri, liderados por Chico Mendes.
Há mais de cinco anos os seringueiros vêm impedindo desmatamentos através dos chamados empates, atos de resistência pacífica, nos quais eles, suas mulheres e crianças simplesmente se postam entre as árvores e os tratores e motosserras.
Os acontecimentos dessa semana são altamente exemplares: um grande desmate está sendo efetuado no Seringal Equador, perto da BR-317, a 30 Km de Xapuri. E absolutamente ilegal, desrespeita de forma flagrante o Código Fiorestai, a lei 7.511/86 e a portaria 486 do IBDF, atingindo dois tipos de árvores cuja derrubada é expressamente proibida: a seringueira e a castanheira.
O detalhe é que esse desmatamento foi autorizado pelo Delegado Regional do IBDF, João Maía, e está sendo garantido pela Polícia Militar do Estado, a mando de um juiz.
Estão sob o risco de prisão, não os desmatadores, mas os seringueiros que se esforçam em fazer cumprir as leis e proteger o meio ambiente. Por outro lado os seringueiros são ameaçados por bandos armados a soldo dos desmatadores. Chico Mendes já sofreu seis atentados semelhantes aos que custaram a vida de Wilson Pinheiro, líder dos seringueiros de Brasiléia, em 1980.
Tanto os defensores da Amazônia quanto os seus devastadores sabem que no Acre se trava uma batalha decisiva. É um Estado com uma extensão enorme de floresta ainda intacta, mas onde o desmatamento se acelera a uma velocidade alucinante. Os seringueiros são um grão de areia contra buldozers, motosserras e queimadas, comovendo a opinião pública internacional.
É cruel perceber que nos Estados Unidos, na Europa e no Japão há uma aguda preocupação com o destino da Floresta Amazônica, enquanto aqui, em meio à castinceira geral, esse problema é relegado a declarações ocas, sem efeito prático.
O processo de desmatamento no Acre está chegando ao seu ponto crítico com o início visível das primeiras alterações climáticas; calor excessivo, enchentes, novas doenças. Mas esse processo ainda pode ser revertido, desde que se contenha os desmatamentos pela mobilização da sociedade e pelo saneamento imediato do IBDF-AC que está fazendo jus à alcunha de “instituto Brasileiro da Devastação Florestal.
De O Globo