Governo familiar de Bolsonaro está fadado ao fracasso

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Governar é algo bem mais complexo do que parece supor o presidente Jair Bolsonaro. Não há modelo bem-sucedido de um governo em que o filho do presidente da República chama um ministro de Estado de “mentiroso” pelo Twitter. E, mais grave, com o aval do pai, que, algumas horas depois, replicou o tweet do filho sem a menor atenção aos ritos do cargo para o qual ele foi eleito, e não a sua família.

O caso, que envolveu o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, demandou ação dos ministros militares, que, ontem, não escondiam a preocupação com os rumos de um governo que, recém empossado, já está criando suas próprias crises ao tratar a Presidência da República como extensão da sua casa.

Na área econômica também havia inquietação, ontem pela manhã, com os possíveis efeitos desse episódio no ambiente político do Congresso, que, no dia 20, receberá a proposta da reforma da Previdência. A base de apoio do governo não está tão sólida que não possa, de repente, ruir.

“Esta é uma situação desagradável que precisa ser resolvida. Tem muitas coisas importantes e a atenção deve ser focada em itens relevantes e produtivos”, disse um ministro com gabinete no Palácio do Planalto.

Ontem esse mesmo ministro, assim como o vice-presidente Hamilton Mourão, dentre outros, pretendiam conversar com Bolsonaro sobre as sérias implicações que esse modelo de gestão familiar pode trazer para o país. Na noite de quarta feira o presidente recebeu a visita, no Palácio da Alvorada, dos ministros do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.

As relações de Bolsonaro com Bebianno, alvo do filho vereador no Twitter, não estão boas desde o governo de transição. O ministro, que conduziu o PSL (partido do presidente da República) durante a campanha eleitoral está, agora, no centro de uma denúncia de desvio de R$ 400 mil do fundo partidário para candidatura “laranja” do partido.

Na quarta-feira, questionado por um jornalista sobre eventual mal-estar no governo frente à denuncia, Bebianno respondeu que não havia mal-estar algum, tanto que ele tinha conversado três vezes com Bolsonaro.

Pela rede social, Carlos chamou o ministro de “mentiroso” e negou que o pai, ainda internado no hospital Albert Einstein, tivesse atendido as suas ligações.

À noite Bolsonaro declarou em um programa de televisão que, se o ministro da Secretaria de Governo estiver envolvido no laranjal de falsas candidaturas, ele voltará “às suas origens”. O caso já está sob investigação da Polícia Federal.

As relações de Bebianno com os parlamentares que primeiro apoiaram a candidatura de Bolsonaro à Presidência também não estavam nada bem. Durante a campanha eleitoral, o ministro tratou de afastar os assessores e os deputados mais próximos do candidato. Vencido o pleito, as reações e queixas contra ele não tardaram a aparecer.

Do comando do PSL, Bebianno pretendia ser alçado a ministro da Justiça. Não foi. Ele demorou a ser oficializado como chefe da Secretaria de Governo, posto que ficou sem atribuições por que dele foram retirados a gestão do PPI (Projetos Prioritários de Investimentos) assim como a área de comunicação de governo, responsável pelas verbas publicitárias.

Foi exatamente nessa área que ocorreu o primeiro atrito público entre o Carlos e Bebianno, quando o presidente eleito pensou em colocar o filho no controle da comunicação do governo.

O ministro também tem seus defensores, como o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de quem ele é interlocutor no Palácio do Planalto. “Bebianno é um cara muito correto”, disse o parlamentar.

Ontem o ministro não foi trabalhar. Sua aguardada demissão não aconteceu e, pelo que disse à revista “Crusoé”, ele também não vai pedir demissão. Quanto ao motivo de ele estar sob ataques, respondeu: “O presidente deve estar com medo de receber algum respingo” das investigações sobre desvio de recursos do fundo partidário com uso de falsos candidatos.

Na entrevista que concedeu à uma rede de TV, que foi ao ar na noite de quarta-feira, o presidente disse: “Querem me colocar contra os meus filhos”.

O receio de que a forma de administrar o país envolvendo a família não dê certo e possa produzir mais ruídos do que acertos nem de longe significa querer colocar Bolsonaro contra os seus filhos.

Pretende, sim, que seu governo respeite a liturgia do cargo, que não confere aos filhos o direito de governar.

As 18 empresas estatais dependentes de recursos do Tesouro Nacional demandam cerca de R$ 14 bilhões por ano e empregam 75 mil funcionários. Essa é uma lista de companhias que está na mira do ministro da Economia, Paulo Guedes, quando ele menciona a possibilidade de extinção de estatais.

Mas nem tudo é liquidável e esse é um conjunto de estatais que tem que ser visto com cuidado. Há empresas dependentes do Tesouro que não devem desaparecer do mapa.

Um exemplo é a Embrapa. Com 97% do seu orçamento vindo de recursos da União, ela é uma empresa de pesquisa de importância inquestionável na área agropecuária.

Na mesma lista das dependentes do Tesouro Nacional tem, também, a Valec Engenharia e Construção de Ferrovias S/A. Criada nos anos 1970, ela foi redimensionada e ampliada pelo governo do PT em setembro de 2008, para aumentar os investimentos em ferrovias.

Além da construção da quarentona Norte-Sul que já era da sua alçada, a Valec tornou-se mais recentemente sócia da Transnordestina e responsável pela construção da Oeste-Leste, outro investimento multibilionário que, ao lado da Transnordestina, hoje está entregue às baratas. Essa é, portanto, uma forte candidata à extinção.

Do Valor