Proposta de Guedes sem a contribuição patronal teria efeito incerto sobre emprego

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O ministro da Economia, Paulo Guedes, propõe um sistema de capitalização da Previdência que promete aumentar a capacidade de crescimento de longo prazo da economia. Inspirado na experiência chilena, uma das ideias é que o regime não tenha contribuição patronal, o que em tese ampliaria os níveis de emprego.

Mas a pesquisa econômica mostra resultados ambíguos dessa proposta sobre a economia. O economista Jonathan Gruber, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), concluiu em um estudo muito citado que o corte de contribuições patronais no Chile na década de 1980 não levou a aumento de emprego. “Na média, os impostos sobre folha de pagamentos caíram 25% ao longo de seis anos”, diz do artigo acadêmico. “Estimo que o efeito foi totalmente nos salários, sem efeito nos empregos.”

“O efeito em vários países, inclusive no Chile, é aumentar o salário real sem impacto no emprego”, afirma o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper.

Ele explica que, embora legalmente a incidência dessa contribuição é sobre as empresas, quem acaba arcando com o encargo na prática são os trabalhadores. Ele pondera que, em alguns países, acontece alguma variação no emprego, e não o ganho concentrado no salário real.

Do ponto de vista da teoria econômica, o esperado é justamente que o corte de contribuições patronais seja repassado aos salários. Mas pode haver impactos diferentes quando o mercado de trabalho tem imperfeições. Uma recente pesquisa dos economistas Adriana Kugler, Maurice Kluger e Luiz Herrera-Prada mostra que um corte de encargos na folha de pagamentos na Colômbia em 2012 levou a formalização de trabalhadores.

Segundo reportagem publicada ontem no Valor, Guedes tem defendido em conversas recentes que um corte de contribuições patronais durante 20 anos levaria ao aumento dos níveis de emprego, sobretudo entre os mais jovens. Para ele, a economia será impulsionada pela instituição do regime de capitalização.

Assim, no futuro o governo teria mais espaço para cobrar impostos para custear o eventual complemento da aposentadorias, se a poupança capitalizada pelos trabalhadores for insuficiente para a sua subsistência.

Não há, por outro lado, evidências conclusivas de que a proposta de capitalização tenha impacto sobre a poupança privada. Os economistas sabem muito pouco sobre como estimular a poupança privada. O poder de influência mais direto é na poupança do setor público.

“O Chile teve um bom desempenho econômico, sobretudo a partir de dos anos 1980, fruto de um pacote muito complexo de agendas de reformas institucionais”, afirma Lisboa “Não se identifica um fator específico como o responsável pelo crescimento.”

Lisboa é um antigo defensor da reforma da Previdência. Como secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula, foi autor de uma proposta de redução horizontal de contribuição patronal para incentivar a formalização do trabalho.

“Para a capitalização gerar crescimento, é necessário que ela gere alguma queda do consumo”, afirma o economista Samuel Pessôa, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). “Tem que olhar os detalhes da proposta para saber se a queda de consumo ocorrerá.”

O desenho da reforma importa pelos incentivos que cria para os trabalhadores pouparem mais de sua renda. “O problema de nosso sistema previdenciário não é ser de repartição”, argumenta Pessôa. “É ser muito generoso.”

Ou seja, na medida em que, de forma geral, garante uma renda satisfatória na velhice, o sistema desincentiva a poupança. Ele cita um trabalho acadêmico de Ricardo Brito e Paulo Minari, do Insper, que mostra que 95% da população não necessita poupar durante a vida ativa, pois desfrutará de um aumento da renda na aposentadoria, dado o regime previdenciário atual.

Outra preocupação citada por outros economistas é se a proposta contempla uma sólida base financeira para bancar a transição do atual regime de repartição para capitalização – sem a qual geraria mais incerteza fiscal e volatilidade macroeconômica.

Do Valor