Diplomatas brasileiros reclamam de decadência do Itamaraty

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O Itamaraty vive um processo de desmonte de décadas de tradição diplomática sob a liderança do chanceler Ernesto Araújo. A reclamação foi feita por diversos funcionários do ministério ao jornal britânico The Guardian, em reportagem publicada nesta terça-feira (25).

A reportagem –assinada por Tom Phillips, correspondente do jornal britânico na América Latina– descreve o Ministério das Relações Exteriores como “uma joia do estadismo latino-americano”. Mas, de acordo com o texto, muitos diplomatas temem que a “revolução bolsonariana na política externa” possa prejudicar a posição do Brasil no mundo.

“Eu sinto desgosto”, disse ao jornal Rubens Ricupero, ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos. “O que eu ouço dos meus colegas que ainda estão ativos é que, no corpo diplomático, há quase uma completa rejeição ao ministro e às diretrizes atuais … Ele não é levado a sério –nem dentro nem fora do ministério”.

Já Roberto Abdenur, ex-embaixador na China, Alemanha e Estados Unidos, afirmou que “nossas relações exteriores atuais levam o Brasil de volta a um período da história em que o Brasil nem mesmo existia: a Idade Média”.

Para Marcos Azambuja, ex-secretário-geral do Itamaraty, “houve uma mudança –e temo que seja uma mudança para pior”. “Eu não imaginei que isso pudesse acontecer”, acrescentou.

A reportagem avalia algumas das principais mudanças nas relações internacionais do Brasil desde que Araújo assumiu o comando da pasta. O texto cita, por exemplo, o surgimento de desavenças em relação à China, principal parceiro comercial do país, e a aproximação com líderes da direita nacionalista, como o presidente americano, Donald Trump, e o premiê húngaro, Viktor Orbán.

A reportagem também diz que, graças às mudanças em curso no Itamaraty, o Brasil arrisca perder o papel de liderança na agenda climática internacional e, ao abraçar o governo de Binyamin Netanyahu em Israel, compromete as relações com parceiros do Oriente Médio.

“Eu diria que esta é mudança mais dramática na política externa brasileira em um século”, disse ao jornal britânico Oliver Stuenkel, especialista em relações internacionais na Fundação Getúlio Vargas em São Paulo.

No texto, Araújo é descrito como um “chanceler pró-Trump e defensor da Bíblia que diz que o aquecimento global é uma conspiração marxista e que o nazismo é um movimento de esquerda”.

A reportagem também relata o desconforto em relação a Olavo de Carvalho, guru ideológico do governo, e ao deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente que “é amplamente visto como o chanceler de fato do Brasil”.

Alguns diplomatas reclamam do papel de destaque dado por Eduardo a Steve Bannon. Ex-auxiliar de Trump e líder do grupo populista de direita conhecido como O Movimento, Bannon foi convidado para jantar com Jair Bolsonaro durante sua visita a Washington em março.

“Estamos na situação perversa, absurda de ter um cidadão estrangeiro influenciando a política externa do Brasil”, afirmou Abdenur ao jornal britânico.

Da FSP