Grampos revelam detalhes do modo de agir de milícia no Rio

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Foto: Fabiano Rocha / Agência O GLOBO

Uma operação do Ministério Público do Rio (MPRJ) e da Polícia Civil levou à prisão nesta terça-feira 14 pessoas que, de acordo com a investigação, estariam ligadas a uma milícia da Muzema , na Zona Oeste, que age em diversas frentes criminosas, como exploração imobiliária clandestina, loteamento, construção, venda , locação e financiamento ilegais de imóveis, além de prestação de serviços clandestinos. Diálogos interceptados pelos investigadores com autorização da Justiça entre os próprios integrantes da quadrilha revelam detalhes de como o grupo opera.

Entre os presos, estão Bruno Pupe Cancella e Leonardo Igrejas Esteves Borges. As investigações apuraram que Bruno teria movimentado R$ 24,9 milhões nos últimos quatro anos. Ele foi preso em casa, um apartamento no bairro do Anil, em Jacarepaguá.

Leonardo Igrejas já estava sendo procurado. Ele atuaria na movimentação de dinheiro para construções irregulares. Igrejas foi preso no apartamento na Avenida Lúcio Costa em frente à Praia da Barra da Tijuca. Envolvidos na ocupação irregular, venda e comercialização dos imóveis, Antonio de Brito Machado e Thiago de Farias Martins são outros alvos da operação.

Também foi pedida à justiça a prisão da servidora pública Letícia Champion Ballalai Cancella, mulher de Bruno Pupe Cancella, mas não foi concedida. O MP e a Polícia investigam se Letícia, que é concursada e trabalha na Secretaria municipal de Fazenda, usava o cargo para ajudar a milícia que atua na Zona Oeste da cidade. Letícia Champion está na prefeitura desde janeiro de 2006. Ela é agente de trabalho de engenharia na Secretaria de Fazenda com salário de R$ 2.207,65 por mês.

Crimes investigados

Supressão de vegetação protegida, dano às áreas circundantes ao Parque da Tijuca, extração de recursos minerais sem autorização, parcelamento clandestino do solo para fins urbanos, falsificação de documentos, corrupção de agentes públicos, ligações clandestinas de água e energia, ocultação de bens adquiridos com os proventos das atividades ilícitas e exploração imobiliária clandestina.

Nos bastidores do poder

Segundo denúncia do MP, Letícia Cancella, funcionária da prefeitura, “desempenha papel de relevo” na quadrilha. Numa ligação, o marido dela, Bruno Cancella, pede à Letícia que consulte o IPTU de um imóvel. “Só vou à prefeitura na terça-feira”, respondeu.

O crescimento da Muzema

Conversas flagradas durante as investigações mostram o deslumbramento dos milicianos com a Muzema. Em ligação para Bruno Cancella, um homem diz que a comunidade está crescendo muito. Bruno responde: “Cada vez mais vai crescer. Eu comecei lá em 2014. O bairro tá ficando bonito”.

Para evitar demolição

Ao saber de uma operação para demolir prédios na Muzema, a quadrilha busca “amigos” dentro de órgãos públicos. “Ele tem o contato do maluco lá, que parece que é o cara que nomeou o subprefeito lá da Barra… um tal de El Tchaco”, diz um homem numa das escutas. Sem ajuda, eles recorrem a estratégia de colocar famílias nos imóveis ainda em construção.

Negócio de milhões

Num dos grampos, feitos com autorização judicial, dois homens falam sobre um empreendimento com 55 lotes, onde seriam construídos apartamentos vendidos a R$ 200 mil, cada. O terreno seria de 11 mil metros quadrados. Eles fazem as contas sobre os gastos e chegam ao resultado: “Tá falando de 6 pratas e meia”, diz um deles. O outro responde: “Resultadozinho bom, pô”.

Propina depois de ‘gato’

Numa ligação gravada no dia 3 de dezembro do ano passado, dois homens conversam sobre um “gato” na rede de água. Segundo o MP, houve pagamento de propina a agentes públicos. “Veio perícia da Cedae aqui, perícia da Civil, já estão atrás do nosso prédio. Não adianta. Vai ter que dá alguma coisa. Só que eles falaram que é para ontem porque a mulher da perícia criminal está aqui e ela vai fazer o laudo”, diz um dos milicianos.

Ritmo acelerado

Bruno Cancella diz a Bernardo Mesquita, que foi denunciado, que a construção de prédios na Muzema é a jato: “Em 60 dias, um andar, entendeu?”.

De O Globo