Doria adota discurso “social” por 2022

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Foto: Bruno Castilho/Folhapress

O governador João Doria (PSDB-SP) lança nesta quinta (17) aquele que pretende ser seu principal programa social, o Vale do Futuro.

Se bem sucedida, a ação terá uma função maior em 2022: embasar o discurso do tucano de combate à pobreza, em especial no Nordeste, caso ele seja mesmo candidato a presidente da República.

O vale em questão é o do Ribeira, a região mais pobre de São Paulo, no sudeste do estado.

Coincidentemente, é a área onde cresceu o presidente Jair Bolsonaro (PSL), presumível rival de Doria daqui a três anos e envolvido em polêmicas constantes com o tucano.

O governador descarta a ideia de conveniência política do projeto, que prevê R$ 2 bilhões de investimentos na região até 2022, metade disso oriunda do setor público.

“O Vale do Futuro é um resgate histórico de uma dívida com o Vale do Ribeira, para garantir o desenvolvimento econômico e social da região durante os próximos 20 anos”, disse o tucano.

Hoje, o Ribeira tem um Índice de Desenvolvimento Humano, o indicador das Nações Unidas sobre qualidade de vida, de nível médio. Já o resto do estado é considerado de alto nível. “As pessoas morrem dez anos antes por lá, isso tem de mudar”, afirmou o secretário Marco Vinholi (Desenvolvimento Regional).

O objetivo declarado do Vale do Futuro é trazer a região para o patamar médio do estado em 2022 e a desenvolver plenamente até 2030.

Além da questão de gestão pública, há a leitura política. Pesquisas qualitativas à disposição do PSDB mostram, desde a montagem da fracassada campanha de Geraldo Alckmin à Presidência em 2018, que o tucanato que domina o Governo de São Paulo desde 1995 não possui uma marca social forte.

O programa Bom Prato, de restaurantes populares, costuma ser vendido como a grande vitrine tucana no setor. Não é visto, por estrategistas eleitorais, como algo à altura das pretensões do partido.

Entre outros fatores, essa deficiência do cartão de visitas eleitoral paulista contribuiu para insucesso crônico do PSDB no Nordeste em pleitos presidenciais desde 2002.

Na mão inversa, o antigo rival PT capitaliza o caráter social de suas políticas e é quase imbatível na populosa região —onde venceu mesmo durante a onda Bolsonaro, em 2018.

Até aqui, a área de segurança tem sido o principal alvo de promoção por parte do governo paulista. Com números positivos colhidos até aqui e boa avaliação atestada em pesquisas internas, ela estrelou recentemente uma campanha de TV de R$ 12,7 milhões.

Enquanto o projeto social pode mirar eleitoralmente um reduto petista, a área de segurança pública fala ao eleitorado conservador de Bolsonaro, do governador fluminense Wilson Witzel (PSC) e do próprio Doria, todos presidenciáveis hoje.

Vinholi também contemporiza tal caráter. “O Vale do Futuro é um projeto do estado, não de um só governo”, disse ele, que também preside a seção paulista do PSDB.

O programa prevê dez ações, sete delas sobre emprego e renda e as restantes, sobre qualidade de vida.

No Ribeira, a evasão escolar e a migração de jovens são constantes. Segundo o governo, o acesso à pré-escola é pior lá do que na média paulista em 59% das cidades. Para tanto, uma velha invenção tucana que ganhou fama nos governos do PT foi repaginada.

Será o Prospera, piloto específico para estudantes do último ano do ensino fundamental e todos os três do médio nos moldes do antigo Bolsa Escola.

Ganhando cerca de R$ 1.000 por ano no período, o aluno será bonificado com R$ 1.200 se tiver boas notas no Enem. Mas ele perde a bolsa se não for aprovado na classe regular e não atestar frequência.

O universo de atingidos é restrito a 4.000 jovens, e os valores parecem baixos. Mas se uma família recebe a média paulista do Bolsa Família, R$ 176, pode ter um reforço de quase 50% na ajuda mensal.

Além disso, aludindo a uma crítica ao programa federal, o piloto de Doria prevê a identificação de vocações e o foco na qualificação técnica de alunos ao fim do ensino médio.

Vinholi afirma que as restrições fiscais do estado serão contornadas por remanejamentos e por financiamentos externos junto ao CAF, o banco latino-americano de desenvolvimento.

O programa também cita, aqui de forma bastante otimista a esta altura, a entrada de R$ 3,3 bilhões em concessões na região —o aeroporto de Registro, capital regional, é uma das primeiras da lista.

A área social do governo paulista perdeu, neste ano, 13% de seu orçamento de R$ 833 milhões. A culpa, diz o governo, foi o rombo deixado pela gestão de Márcio França (PSB), que era vice de Alckmin e foi derrotado na eleição por Doria.

Imediatamente, o Vale do Futuro colocará R$ 75 milhões em financiamento para empreendedores por meio do Banco do Povo Paulista, segundo a secretária Patricia Ellen (Desenvolvimento Econômico). O Sebrae firmou convênio, em valor a ser definido por decreto, para abrir cursos e oficinas locais.

O governo estima 2.000 empregos diretos a serem abertos, e conta com a instalação de uma unidade do Boticário na região. “Conversamos com os prefeitos e mapeamos as oportunidades. Teremos foco em projetos de turismo, é uma região com cidades históricas e biodiversidade. É muito carente de desenvolvimento econômico”, afirmou Ellen.

Na via contrária da imagem associada a Bolsonaro, há uma preocupação em demonstrar atenção ao ambiente —a região concentra 21% da mata atlântica remanescente no Brasil e tem 100 km de litoral.

Além de ecoturismo, o programa prevê premiar as prefeituras que mais preservarem, destinando fatias maiores dos 25% de distribuição discricionária do ICMS, principal imposto estadual. O nome fantasia disso é ICMS Ecológico.

Gargalos na infraestrutura viária serão atacados também, com o Departamento de Estradas de Rodagem prometendo R$ 200 milhões em 12 obras no curto prazo.

Folha