Cabral gera conflito entre PF e MPF

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Foto: Vagner Rosário/VEJA.com

Desde que começou a confessar os crimes, em depoimentos regulares na 7ª Vara Federal Criminal do Rio, o ex-governador Sérgio Cabral nunca comoveu a força-tarefa da Lava-Jato no Rio. Os procuradores da República do grupo sempre desconfiaram de que as revelações espontâneas de Cabral eram seletivas, escondiam dados essenciais sobre a dinâmica da organização criminosa comandada pelo ex-governador e tinham como único objetivo tumultuar o processo legal e abrir caminho para a saída da prisão após três anos.

O acordo de delação firmado com a Polícia Federal aumentou as suspeitas da força-tarefa. Para os procuradores da República que tiveram acesso ao conteúdo, as revelações acrescentam muito pouco ao que já se sabe, não apresentam provas de corroboração e omitem fatos como a participação da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo na organização. Para agravar, a força-tarefa se surpreendeu ao saber que o acordo de colaboração foi firmado com delegados federais de Brasília que nunca participaram das investigações sobre o esquema Cabral.

Os doleiros Vinícius Claret, o Juca Bala, e Cláudio Barboza, o Tony, personagens centrais da investigação por terem ajudado Cabral a esconder US$ 100 milhões no Uruguai, por exemplo, não foram procurados pelos delegados do acordo.

Desde que a força-tarefa foi montada no Rio, no primeiro semestre de 2016, nunca houve uma efetiva parceria entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal em torno das investigações. A rigor, praticamente toda a apuração foi conduzida pelos procuradores da República, cabendo aos delegados e agentes federais a execução de medidas cautelares de prisão e de busca e apreensão. Com o acordo revelado nesta segunda-feira, a distância entre os dois órgãos tende a se ampliar.

Integrantes da força-tarefa do MPF pretendem se empenhar pessoalmente para convencer o ministro Edson Fachin, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), a não homologar a delação. Para isso, já contam com o apoio do procurador-geral da República, Augusto Aras, que se convenceu de que a delação é nula. Para isso, os procuradores da República elencaram uma lista de perguntas que, ao longo dos três anos de Cabral atrás das grades, ficaram sem respostas claras.

A força-tarefa alertou ainda que mesmo as informações provenientes da confissão voluntária de Cabral foram recebidas com reservas e pouco usadas nos desdobramentos das investigações. Desconfiados da qualidade dos dados, os procuradores da República temiam que as confissões do ex-governador maculassem os inquéritos. Além disso, a força-tarefa lembrou a Augusto Aras que Cabral nunca devolveu os valores desviados.

Assim como o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, a delação de Cabral esbarra na ideia cristalizada no MPF de que não é negócio trocar o certo pelo duvidoso. Na visão dos procuradores, a prisão de ambos representa um triunfo na luta contra a impunidade. Mesmo não sendo homologado pelo ministro Fachin, o acordo negociado significa agora um risco à estratégia. Os procuradores temem que o Judiciário passe a enxergar Sérgio Cabral como uma espécie de réu-colaborador, cessando assim, em tese, as razões da prisão preventiva.

O Globo