Governo ataca árabes com proposta de embaixada em Jerusalém
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Em nota divulgada após uma reunião do conselho, no Cairo, a Liga Árabe afirmou ainda que as posições brasileiras “representam uma transformação radical de suas posições históricas em relação à questão palestina e ao processo de paz” na região, tendo o Brasil sido “um dos primeiros países a reconhecer o Estado da Palestina, em apoio aos direitos legítimos do povo palestino”.
O escritório foi inaugurado no domingo (15/12), em cerimônia à qual estiveram presentes o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro.
No evento, o deputado sinalizou que a abertura do escritório seria um primeiro passo para a transferência da Embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém. Hoje, a missão fica em Tel Aviv. “[Meu pai] me disse que existe um compromisso firme, que a transferência da Embaixada a Jerusalém será realizada”, disse o deputado.
A transferência da Embaixada para Jerusalém é um tema controverso. Antes de se eleger, Bolsonaro havia se comprometido com a medida, mas recuou após pressões do agronegócio, que temia represálias do mundo árabe, grande cliente da agropecuária brasileira.
O governo israelense diz que Jerusalém é sua capital indivisível, mas os países árabes defendem que a cidade deverá ter sua soberania repartida entre israelenses e palestinos quando o Estado palestino for criado. A posição dos árabes é respaldada pela ampla maioria dos países e pela ONU, que em várias ocasiões se posicionou em favor do status internacional de Jerusalém.
Hoje, só dois países mantêm suas embaixadas em Jerusalém: os Estados Unidos e a Guatemala.
No comunicado divulgado nesta quinta, a Liga Árabe diz que o secretário-geral da organização, Ahmed Abou El-Gheit, enviou em 4 de novembro uma carta ao ministro das Relações Exteriores do Brasil para expressar “sua forte insatisfação com o anúncio do Brasil de abrir um escritório comercial em Jerusalém, alertando que essa etapa afetaria negativamente as relações históricas entre os países árabes e o Brasil”.
A carta exortava o Brasil a “desistir dessa decisão, a fim de preservar as posições históricas e declaradas do Brasil sobre a questão palestina em geral e se recusar a mudar o status quo histórico e legal em Jerusalém”.
Bolsonaro anunciou que abriria um escritório comercial em Jerusalém em março, quando visitou Israel. A decisão frustrou líderes evangélicos brasileiros, que cobravam o cumprimento da promessa de transferir a Embaixada.
“Tem o compromisso (de transferir a Embaixada), mas meu mandato vai até 2022. E tem que fazer as coisas devagar, com calma, sem problema”, disse ele, na ocasião.
A posição dos evangélicos se explica pela crença de que a Bíblia define Israel como terra eterna do povo judeu. Segundo essa visão, o estabelecimento dos judeus na região é necessário para o retorno de Jesus Cristo à Terra.
Historicamente, o Brasil defende negociações que estabeleçam dois Estados na região, um israelense e um palestino. No governo de Michel Temer, o país apoiou uma resolução da ONU contra a transferência da Embaixada dos EUA para Jerusalém.
Segundo analistas, a mudança nessa postura reflete um maior alinhamento entre o Brasil e os EUA na gestão Bolsonaro e a forte influência que os evangélicos exercem sobre o governo.
Outro grupo influente na atual gestão, porém, é o agronegócio, que se opõe à transferência, por temer represálias comerciais.
O Brasil hoje é, no mundo, o maior exportador de carne halal, que segue as regras de abate do Islã.
Em janeiro, representantes do agronegócio e analistas de comércio exterior disseram à BBC News Brasil que o Brasil teria prejuízos caso países árabes decidissem retaliá-lo pela transferência da representação diplomática.
“O mercado árabe é muito mais importante economicamente para o Brasil (do que Israel). Do ponto de vista puramente econômico, esta(ría)mos beneficiando um país que importa pouco em detrimento de um grupo de países que importa muito”, disse, na ocasião, o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.