Indústrias dos EUA querem aço brasileiro
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O anúncio de possível sobretaxa deve fazer com que a indústria brasileira de aço e alumínio comece a mobilizar os importadores americanos. Foi a pressão da indústria americana importadora de aço e alumínio – para quem a sobretaxa significa elevação de custo de produção – que resultou, em 2018, na substituição da tarifa adicional dos EUA pelo estabelecimento de cotas à exportação brasileira de aço e alumínio. Se a medida for efetivada, a pressão dos importadores americanos deve se repetir. O que poderá fazer diferença, segundo especialistas, são os votos que a sobretaxa irá trazer ou retirar nas eleições a serem disputadas por Donald Trump em 2020.
A exportações brasileiras de aço que são podem ser alvo da sobretaxa de Trump somaram US$ 2,67 bilhões de janeiro a outubro de 2019. No ano passado 40% das exportações brasileiras desse aço destinaram-se aos EUA. O aço representa cerca de 11% da exportação total brasileira aos americanos. Os Estados Unidos são o segundo parceiro comercial mais importante do Brasil, atrás somente da China. No alumínio o valor é bem menor. De janeiro a outubro foram US$ 151 milhões em exportações brasileiras de alumínio que são alvo da sobretaxa dos EUA. Apesar do valor relativamente baixo, os americanos são compradores importantes. Das exportações brasileiras totais de alumínio, 26% têm como destino os Estados Unidos. Os dados foram coletados pela Barral M Jorge Consultores.
Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio da Barral M Jorge, lembra que o aço brasileiro importado pelos EUA é preponderantemente usado como insumo pela indústria americana. Por isso, não há interesse dessa indústria para uma sobretaxa que significaria elevação de custo de produção. Esse quadro, avalia Barral, não mudou. Mas também, diz ele, pode haver interesse de indústria concorrente à do Brasil. “Ao mesmo tempo a medida protecionista pode agradar aos produtores agrícolas. A diferença deste momento é o componente eleitoral.”
Os produtores agrícolas formam base de apoio importante para Trump e foram um dos principais setores afetados pela guerra comercial com a China, já que as sobretaxas do país asiático em relação aos americanos centraram-se em produtos agrícolas, diz Matheus Andrade, consultor de comércio internacional da Barral M Jorge. “O Brasil e a Argentina são concorrentes dos produtores americanos em itens como soja, milho e até mesmo carne.”
Andrade destaca que o Brasil é um fornecedor relevante de aço aos EUA. Em 2018, das importações americanas de aço sujeitas à sobretaxa, 8,8% vieram do Brasil, o terceiro fornecedor mais importante. O primeiro, diz o consultor, é o Canadá, que no ano passado teve fatia de 18,3%, seguido do México, com 10,2%. “O Brasil é um fornecedor importante, parte de uma cadeia de trocas já estruturada com importadores americanos.”
“Os números mostram que a exportação do Brasil tem acontecido conforme a demanda e estão dentro da cota estabelecida no ano passado”, avalia Castro. Para ele, a medida de Trump pode ser uma retaliação às iniciativas do Brasil e da Argentina de, por meio do Mercosul, assinar um acordo de comércio com a União Europeia.”
O acordo, lembra ele, ainda deve ser aprovado nos Parlamentos dos diversos países. “Mas, quando as novas tarifas estiverem em vigor, a tendência é que primeiro os europeus importem toda a produção agrícola do Brasil para depois passar a comprar a americana”, diz, apesar da diferença de sazonalidade entre a produção brasileira e a americana.
Segundo o Instituto Aço Brasil, a indústria brasileira de aço vem atendendo os volumes anuais definidos como cotas de exportação ao EUA. Marco Polo de Melo Lopes, presidente-executivo da entidade, diz que os EUA não são autossuficientes em aço. A produção fica na casa de 80 milhões de toneladas por ano, diz, enquanto o consumo é da ordem de 100 milhões de toneladas. “Essa decisão surpreende. É um tiro no pé”, afirmou Lopes. Ele disse que veria junto ao governo Bolsonaro como atuar para impedir a sobretaxa anunciada.
Ontem, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, rebateu Trump e negou que o Brasil tem desvalorizado artificialmente o real. Ao falar em São Paulo para empresários sobre a taxa adicional, ele afirmou que por trás da decisão do governo americano está uma “tensão geopolítica” gerada pelo protagonismo da China no cenário econômico mundial.