Bolsonaro não quer auxiliares, mas súditos
A semana que passou serviu para comprovar algumas características da Presidência de Jair Bolsonaro que já ficaram óbvias em seu primeiro ano de mandato e que terão profundas consequências para o saldo final deste período, numa perspectiva histórica.
Bolsonaro não quer auxiliares, mas súditos com lealdade cega e irrestrita. A paranoia com possíveis traições é total, e levada ao paroxismo quando envolve ameaças (reais ou virtuais) à sua reeleição em 2022.
E alguns ministros terão sempre de analisar se vale a pena submeterem sua biografia a esse jugo, uma vez que têm uma história anterior ao bolsonarismo, diferentemente de outros. Mas isso também faz com que Bolsonaro não consiga apenas descartá-los ao primeiro sinal de “deslealdade”, como fez com Gustavo Bebianno e Santos Cruz. O que torna o jogo mais complexo e imprevisível.
Sérgio Moro passou a semana na frigideira presidencial, na qual já esteve em diversas ocasiões em 2019. Foi parar lá a despeito de ter declarado lealdade publicamente a Bolsonaro em rede nacional no Roda Viva, mas porque o presidente não o achou suficientemente enfático, viu alguns contrapontos indesejáveis entre a própria conduta e as ideias do ministro da Justiça e, principalmente, porque sentiu que Moro está mais político, mais solto e mais popular do que nunca.
Paulo Guedes, outro dos que têm um currículo que precede a associação com o bolsonarismo, foi a Davos sozinho. Ricardo Salles fugiu da raia, pois não seria possível enrolar no Fórum Econômico Mundial como faz nas entrevistas em série que dá para convencer a opinião pública do impossível: que sua política ambiental não é um fracasso, tanto que o próprio Bolsonaro colocou o vice-presidente, Hamilton Mourão, para intervir nela e tentar limpar a barra do Brasil no exterior.
Coube ao ministro da Economia falar sobre tudo em Davos, já que o próprio presidente também preferiu se ausentar para não responder pelas promessas que fez há um ano, mas não executou. Guedes aproveitou o ensejo para jogar a ideia do imposto sobre o “pecado”, e foi mais um a entrar na lista de desautorizados de Bolsonaro. De leve, com carinho, porque também aqui o presidente sabe que não pode prescindir do Posto Ipiranga.
Enquanto toureia os ministros que têm mais popularidade que ele, ou que têm uma vida própria quando resolverem sair, Bolsonaro pode ter o alento de contar com a vassalagem daqueles que só podem ser ministros em seu governo, pois não eram nada antes e voltarão a não ser nada depois.
Podem ser campeões na esperada lealdade, mas são candidatos a ser entraves no caminho da tão sonhada reeleição. O “imprecionante” Abraham Weintraub, na semana de colapso do Sisu e do Enem, e enquanto a solução para o Fundeb segue longe de ser alcançada, entregou ao público mais performances bizarras nas redes sociais, se ocupando de atacar colunistas críticos ao seu chefe. Nota 10 na régua bolsonarista, pode respirar aliviado na cadeira, mesmo colocando a Educação do País de cabeça para baixo.
Idem quanto a Damares Alves e sua canhestra política de abstinência sexual para jovens, e a Ernesto Araújo indo à Índia pregar contra a globalização pela enésima vez. Agora até um criacionista apareceu para cuidar da Capes, ligada ao MEC do ministro “imprecionante” e responsável, vejam só, por pesquisa.
E é neste time que Regina Duarte se prepara para entrar. Ela tem um currículo brilhante, uma trajetória exitosa e uma coragem imensa, pois a chance de arriscar tudo isso num “namoro” furado com Bolsonaro é enorme. Ainda assim, pode se juntar a Moro e Guedes no time dos que têm a perder, mas representam algum alento diante do resto do pessoal. Boa sorte para ela.