Câmara quer dispositivo anti Moro em PEC sobre foro privilegiado
Foto: Luis Macedo / Agência O Globo
A opção seria uma forma de proteger os parlamentares dos novos responsáveis pelas investigações hoje supervisionadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Líderes argumentam que a restrição se justifica para evitar “ativismo” dos juízes de primeira instância.
Segundo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em debate na Câmara, que já foi aprovada pelo Senado em 2017, somente cinco autoridades teriam direito ao foro especial: presidente da República e vice, presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF).
No fim do ano passado, os deputados fecharam um acordo na tentativa de fazer a proposta avançar. Para votá-la, ficou acertada a alteração no texto, que será feita por emenda do deputado Luiz Flávio Gomes (PSB-SP), especificando que o juiz de primeira instância não pode decretar medidas cautelares contra políticos. De acordo com a emenda, essas medidas teriam de ser decididas por tribunais superiores.
— É a emenda construída para evitar o juiz ativista — justifica o líder do Podemos, José Nelto (Podemos-GO).
A recente aprovação da lei que cria o juiz de garantias também foi vista por deputados como uma medida que atenua um possível “empoderamento” de juízes de primeira instância decorrente do fim do foro privilegiado.
O acordo entre deputados foi fechado no gabinete do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com a presença de líderes da Casa. Segundo Maia, o assunto é “uma demanda da sociedade”.
De autoria do senador Alvaro Dias (Podemos-PR), o projeto retornará ao Senado se for aprovado com a alteração. O relator da proposta na Câmara, Efraim Filho (DEM-PB), confirma o acordo, mas é cauteloso em relação ao calendário da votação. O tema se arrasta na Câmara desde dezembro de 2018, quando foi aprovado em comissão especial.
— Há uma expectativa de votação, mas não uma definição de data. Ainda há estudos debatendo a formatação de um texto que tenha a possibilidade de êxito, porque é preciso ter 308 votos. Não temos que ter açodamento — diz Efraim.
A restrição ao foro vem sendo debatida nos últimos anos em razão dos casos de corrupção investigados pela Lava-Jato contra políticos em exercício de mandato. Em maio de 2018, o STF restringiu o foro a deputados e senadores para crimes sem relação com o exercício do mandato.
Parlamentares avaliam que, com a decisão, houve um desequilíbrio entre os três poderes, pois apenas os políticos tiveram o foro restringido. A nova legislação, assim, acabaria com o que parlamentares consideram um privilégio de autoridades do Judiciário.
Quando os ministros do Supremo abordaram o assunto, não houve nenhuma decisão sobre medidas cautelares, como a prisão preventiva. Os parlamentares, segundo a Constituição, “não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável” e, mesmo nessa hipótese, caberia à Câmara ou ao Senado resolver sobre a manutenção ou não da prisão do parlamentar. Apesar disso, ao elaborar a emenda da PEC do foro, os deputados querem garantir que nenhum parlamentar possa ser “constrangido” por juízes de primeira instância.
Para votar o tema em 2020, a Câmara precisará resolver outro impasse. Um grupo de deputados vê com preocupação a tramitação simultânea de outra iniciativa: a nova regra que permitirá a prisão após condenação em segunda instância. Parlamentares admitem que a segunda iniciativa é a prioridade para setores da sociedade após o STF ter revisto sua posição sobre o assunto. Mas esse texto ainda será debatido em comissão especial.
Caso as duas propostas sejam aprovadas, há o temor de que os políticos fiquem mais vulneráveis diante de decisões da Justiça. Reservadamente, deputados ouvidos pelo GLOBO reconhecem que veem um “ruído” entre as duas propostas que alteram a Constituição.
Presidente da comissão especial que trata da prisão em segunda instância, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM) avalia que as duas propostas podem caminhar juntas:
— Se a PEC do foro está pronta para ser votada, que vote. É importante que seja votada antes da proposta da segunda instância, por uma questão técnica. O que a gente chama de segunda instância é a primeira instância para quem tem foro privilegiado. E o Brasil é signatário de tratados que obrigam o duplo grau de jurisdição. Todo mundo tem o direito a recurso para órgão colegiado, o que não ocorre hoje com quem tem foro privilegiado.