Capes retém resultado de edital para estudos sobre derrame de óleo no litoral

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Foto: Fotoarena / Agência O Globo

Em novembro do ano passado, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) lançou um edital para financiar estudos sobre o derramamento de óleo nas praias do Nordeste, e prometeu a divulgação da lista de selecionados para o dia 18 de dezembro de 2019. Quase um mês após esse prazo expirar, ainda não se sabe quantos e quais pesquisadores conquistaram a bolsa.

Publicado em 22 de novembro de 2019, o edital emergencial “Entre Mares” previa a destinação de R$ 1,36 milhão para propostas que buscassem “estudar e combater o derramamento de óleo nas praias brasileiras”.

Em 9 de dezembro, dois dias após o encerramento das inscrições, a Capes anunciou ter recebido 276 propostas. Deveria ter feito a seleção delas até 18/12, mas não o fez até agora.

A Capes negou que haja atraso, pois o edital estabelece que a divulgação dos resultados aconteceria “a partir do dia 18 de dezembro”, sem data-limite especificada. No entanto, ainda segundo o edital, o resultado preliminar seria divulgado a partir do dia 9 de dezembro, e isso não ocorreu. A assessoria da Capes confirmou que os resultados preliminares ainda não foram divulgados, e atribuiu o atraso ao alto número de inscrições recebidas.

A assessoria da Capes informa ainda que o cronograma de implementação das bolsas estaria baseado no calendário acadêmico, cujo início está previsto para março. E que os resultados preliminares devem ser divulgados nos próximos dias.

“Conforme publicado no edital do Programa CAPES Entre Mares, a divulgação do resultado preliminar seria a partir de 9 de dezembro de 2019. A implementação das bolsas de pesquisa está prevista para o 1º semestre de 2020. Todas as etapas previstas no cronograma divulgado no edital estão sendo rigorosamente seguidas, portanto, não há atraso na divulgação do resultado, que será divulgado nos próximos dias”, diz a nota da assessoria. “Foram recebidos 278 projetos, o que evidencia o atendimento a uma demanda de pesquisa que estava reprimida. A Capes se compromete com a excelência das análises efetuadas no edital, independente (sic) da elevada demanda de propostas submetidas”, conclui.

As áreas temáticas prioritárias para seleção de projetos eram: avaliação dos impactos ambientais e socioeconômicos, biorremediadores, dispersão do óleo, processamento de resíduos e tecnologia aplicada à contenção do óleo.

Cada proposta aprovada poderá ter até R$ 100 mil financiados, liberados em uma única parcela, e uma cota de bolsa de mestrado. O projeto deverá ser desenvolvido ao longo de dois anos, podendo ser prorrogado para mais 12 meses.

Além do atraso na divulgação dos selecionados, o baixo valor do edital também foi criticado por especialistas.

Marcelo Soares, pesquisador e professor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará (UFC), compara o programa da Capes com um edital lançado um mês antes, em 23 de outubro, pelo governo de Pernambuco, que destinava R$ 2,5 milhões para o estudo do derramamento — e já tem seu projetos escolhidos e em andamento.

A iniciativa da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe) redirecionou cerca de R$ 208 mil para cada grupo de pesquisa — o dobro, portanto, do valor disponibilizado pelo Governo Federal para cada selecionado do “Entre Mares”.

— Temos 11 estados impactados e uma costa de 3 mil quilômetros impactados e vão financiar 13 propostas de R$ 100 mil — argumenta Soares. — O recurso é muito pouco. Análises químicas de contaminação não são baratas.

O professor da UFC também aponta que o financiamento público é indispensável para dimensionar e entender os vários aspectos do impacto provocado pelo derramamento.

— Nós temos efeitos ecológicos, econômicos, sociais e de saúde pública que não foram analisados de maneira criteriosa — argumenta Soares.

Ele foi um dos poucos pesquisadores a conseguir o financiamento do governo para estudar o óleo no mar do Nordeste. Uma de suas pesquisas, publicada na prestigiada revista científica “Science”, revelou que o derramamento tinha uma extensão maior do que se imaginava: 3 mil quilômetros.

O estudo também apontou que o óleo já havia atingido 40 unidades de conservação, comprometendo os ecossistemas locais e trazendo implicações sociais, econômicas e políticas.

— Foram impactados setores como a pesca artesanal, turismo, saúde de populações tradicionais, banhistas e a qualidade ambiental das nossas praias, mares e estuários. Sem essas informações científicas e criteriosas não temos como elaborar políticas públicas para reduzir os danos, recuperar ambientes, cadeias produtivas e prevenir novas emergências ambientais — afirma Soares.

O Globo