Caso Wajngarten: conflito de interesses pode anular contratos
Relator das contas do primeiro ano do governo Bolsonaro, o ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU), já começou a elencar alguns pontos que deverão ser abordados em sua análise. Entre eles, Dantas cobra uma maior transparência sobre as isenções fiscais dadas pela União e anuncia um inédito capítulo sobre a comunicação governamental. Em entrevista ao GLOBO, Dantas também afirmou que contratos de publicidade estatais poderão ser anulados se ficar comprovado que há conflito de interesses no fato de o secretário de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Fábio Wajngarten, ser dono de uma empresa que presta serviços para emissoras de TV e agências que recebem recursos do governo.
— Esse é um tema delicado. Certamente, se no aprofundamento das análises ficar comprovado esse conflito de interesses, pode vir a causar uma nulidade dos contratos. Veja que o papel do TCU não é julgar o secretário, não temos competência correcional, corregedoria. É óbvio que o fato que foi revelado impõe ao governo algum constrangimento, mas essa análise vai ter que ser política do governo, ao passo que a análise que o TCU vai fazer é mais objetiva — afirmou.
Na semana passada, o Ministério Público junto ao TCU fez uma representação aos ministros pedindo que seja analisada, sob a ótica das contas públicas, a situação do chefe da Secom.
Já a decisão de analisar a política de comunicação do presidente Jair Bolsonaro ocorreu após sucessivas representações chegarem ao tribunal sobre o assunto. Ao longo de 2019, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público de Contas, entrou com uma série de representações contra o governo, questionando atos de censura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) à imagem da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada em 2018 no Rio, e a suspensão do jornal “Folha de S. Paulo” de uma licitação para a compra de jornais, entre outros temas.
— Vou abrir um capítulo na análise das contas do governo sobre a política de comunicação — anunciou Dantas, que considera este ser um assunto do tribunal de contas.
Dantas também não vê mais sentido para o sigilo dos cartões corporativos da Presidência da República. O Palácio do Planalto alega questões de segurança para não divulgar esses gastos.
— É preciso avaliar apenas algumas questões da segurança do presidente, naturalmente, mas isso não pode servir de motivo para uma opacidade completa, uma falta de transparência total desses dados. É claro que talvez não seja desejável que se indique onde a comida dos palácios está sendo comprada, mas não pode haver alegação de segurança nacional quanto a isso — afirmou Dantas.
Isenções Fiscais
Apesar de tecer elogios à equipe do ministro Paulo Guedes (Economia), Dantas avalia que falta esforço para dar transparência e extinguir isenções fiscais. Segundo ele, embora os mecanismos de incentivo sejam uma prática brasileira antiga, o fechamento das contas públicas depende da revisão das renúncias.
— O ministério da Economia vai ter que mostrar sua capacidade, mostrar ao que veio, porque as isenções fiscais, dadas pelo Congresso ou pelo Executivo, têm que ser revistas. Se não houver uma revisão dessas renúncias, as contas não fecham — disse ele.
Segundo o ministro, o Brasil corre o risco de, se não houver um aquecimento forte da economia, ver a situação fiscal se agravar.
— Há quatro anos o Brasil não fecha as contas. Este ano, o déficit foi de R$ 80 bilhões, mas só conseguiu fazer isso com muitas receitas extraordinárias. Primeiro, o BNDES antecipando pagamentos e, segundo, com o dinheiro do leilão da cessão onerosa, receitas extraordinárias que não se repetem — alertou.