EUA: Câmara nomeia deputados que levarão impeachment de Trump ao Senado

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Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP

A presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, a democrata Nancy Pelosi, anunciou o nome dos parlamentares que terão um papel equivalente ao de promotores no julgamento do presidente Donald Trump no Senado. Este é o primeiro passo para que as duas acusações contra Trump, aprovadas pela Câmara em 18 de dezembro, sejam encaminhadas ao Senado, o que provavelmente acontecerá ainda nesta quarta-feira.

A decisão de Pelosi põe fim a quase um mês de impasse desde que a votação na Câmara abriu caminho para o processo de impeachment do presidente. Ele foi acusado de abuso de poder e obstrução do Congresso, depois de uma investigação legislativa para apurar as denúncias de que pressionou o governo da Ucrânia para que investigasse o ex-vice-presidente Joe Biden (2009-2017), seu potencial rival nas eleições de 2020. Para isso, acusaçao sustenta que Trump reteve um pacote de ajuda à Ucrânia de quase US$ 400 milhões e usou como barganha uma visita do presidente ucraniano, Volodymir Zelenski, à Casa Branca.

Nas próximas horas, o plenário da Casa deverá votar para aprovar os nomes selecionados por Pelosi, após um breve debate. Dada a maioria democrata, é improvável que haja obstáculos.

Os sete deputados escolhidos por Pelosi, todos democratas, são Adam Schiff, da Califórnia, Jerry Nadler, de Nova York — presidentes respectivamente das Comissões de Inteligência e de Justiça da Câmara, que lideraram a investigação legislativa —; Zoe Loefgren, da Califórnia; Hakeem Jeffries, de Nova York; Val Demings, da Flórida; Jason Crow, do Colorado; e Sylvia Garcia, do Texas. O grupo será liderado por Schiff, que assumiu papel de protagonismo durante o inquérito na Câmara.

— A ênfase está no nível de conforto no tribunal. A ênfase está em construir o argumento mais forte possível para proteger e defender a Constituição em nome do povo americano — disse Pelosi ao apresentar os nomes.

Após serem formalmente empossados no final da tarde, os parlamentares atravessarão o Capitólio e entregarão ao Senado, formalmente, as acusações contra Trump. Segundo o presidente da Casa, o republicano Mitch McConnell, o julgamento começará na próxima terça-feira.

Em seu anúncio, Pelosi justificou a sua demora para enviar as acusações ao Senado, afirmando que esperava “receber a cortesia” de saber as regras do julgamento do Senado com antecedência. Apesar disso não ter acontecido, ela disse que o “tempo foi nosso amigo”, pois trouxe à tona novas “evidências incriminantes”, que evidenciam a campanha de pressão do governo americano na Ucrânia.

Com as acusações na mão, ela esperava forçar McConnell a aceitar novas testemunhas e provas — e pediu garantias de que isso aconteceria antes de enviar formalmente as acusações. Por mais que quatro republicanos tenham demonstrado apoio à convocação de novas testemunhas, parece improvável que os democratas consigam realizar seu desejo, já que possuem a maioria no Senado.

Segundo Schiff, o atraso deu à equipe “a oportunidade de mostrar ao povo americano a necessidade de um julgamento justo”. Nadler, por sua vez, se referiu ao argumento de que os democratas deveriam deixar o futuro de Trump ser decidido nas urnas, afirmando que o impeachment é uma tentativa de impedir o presidente de “fraudar a próxima eleição”.

A resposta de Trump ao anúncio de Pelosi veio minutos depois no Twitter: “Aqui vamos de novo, uma nova falcatrua dos democratas que não fazem nada. Todo esse trabalho deveria ter sido feito pela Câmara, e não pelo Senado”.

Em nota, a porta-voz da Casa Branca, Stephanie Grisham, chamou o processo de “ilegítimo” e acusou Pelosi de “mentir” ao chamar o inquérito de impeachment de “urgente”, dada a demora para que as acusações sigam para o Senado. Ela disse ainda que o presidente está ansioso para ter um julgamento justo no Senado e espera ser exonerado, pois “não fez nada de errado”.

Na prática, os deputados escolhidos por Pelosi atuarão como promotores criminais. Eles apresentarão o caso investigado pelas comissões da Câmara aos membros do Senado, que atuarão como jurados. Trump será defendido por seus advogados de defesa e o presidente da Suprema Corte, o juiz John Roberts, presidirá o julgamento — função que, ao que tudo indica, será meramente cerimonial.

É provável que cada deputado tenha um papel diferente na apresentação das provas, mas ainda não está claro como essa divisão acontecerá. Para que o Senado aprove o afastamento do presidente — algo que seria inédito na História dos EUA —, serão necessários dois terços dos votos. Dada a maioria republicana de 53 assentos, parece improvável que 67 dos 100 senadores votem pelo impeachment.

Também não se sabe ao certo quanto tempo os deputados terão para falar no Senado. No julgamento do democrata Bill Clinton (1993-2001), defesa e acusação tiveram 24h para apresentarem seus argumentos e os senadores tiveram 16 horas adicionais para questioná-los. Acusado de mentir em juízo e tentar obstruir as investigações no caso ligado às suas relações extraconjugais com Monica Lewinsky, o ex-presidente foi inocentado pela Casa menos de um mês depois.

Novos detalhes sobre a campanha de pressão do presidente contra a Ucrânia vieram à tona na quinta-feira.Dezenas de páginas de recados, mensagens de texto e outros registros mostram o trabalho realizado pelo advogado pessoal de Trump, o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, e seu sócio Lev Parnas, ao representar o presidente.

Fornecidos por Parnas, os documentos contêm uma série de conversas com o promotor ucraniano Yuri Lutsenko, que ajudava Giuliani a buscar informações prejudiciais a Biden. Em uma das mensagens de WhatsApp, Lutsenko reclama que o governo americano ainda não havia demitido a embaixadora do país na Ucrânia, Marie Yovanovitch. A diplomata era uma das principais vozes contra a corrupção na Ucrânia, vista como inimiga por Lutsenko, apontado como corrupto em seu país.

“Se você não tomar uma decisão sobre a Madame, você está colocando em xeque todas as minhas alegações. Incluindo sobre B”, disse Lutsenko. “E aqui você não consegue nem se livrar de uma idiota [mulher]”, concluiu, postando um emoji fazendo cara feia.

“Ela não é uma idiota qualquer, acredite em mim”, respondeu Parnas. “Mas ela não vai escapar.” Yovanovitch foi retirada de seu posto por Trump no final de abril de 2019, com o apoio de Giuliani.

Os documentos de Parnas também incluem uma carta enviada por Giuliani em maio de 2019, solicitando um encontro com o presidente ucraniano. Na correspondência, o advogado diz que Trump tinha “conhecimento e dado autorização” para as suas ações — o primeiro documento que veio a público que diz isso.

Parnas só agora foi autorizado judicialmente a entregar seus documentos ao Congresso. Mais materiais, segundo fontes do NYT, deverão ser divulgados em breve.

O Globo