Justiça condena assassinos de brasileiro em Londres

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Foto: Reprodução

Três adolescentes foram condenados pela morte do capoeirista e motoboy brasileiro Iderval da Silva, de 46 anos, espancado em Londres em maio de 2019.

Silva trabalhava como entregador da Uber Eats e foi atacado bairro Battersea, no sul de Londres, quando tentou impedir que sua moto fosse roubada. Ele chegou a ser internado, mas morreu três dias depois.

Jadan Richards, de 19 anos, e um jovem de 16 anos, que não teve o nome revelado por ser menor de idade, ambos de Wandsworth, no sudoeste de Londres, foram condenados por homicídio doloso — quando há intenção de matar.

Um outro jovem, de 17 anos, foi condenado por homicídio culposo — quando não há intenção de matar.

O promotor Tony Badenoch disse durante o julgamento que o brasileiro estacionou a moto do lado de fora de um café, quando o grupo de jovens avistou o veículo e um deles tentou furtá-lo.

Silva percebeu a movimentação e tentou impedir que levassem a moto. Ele foi, então, alvo de um “momento explosivo e rápido de violência”, segundo as palavras do promotor.

O brasileiro foi deixado inconsciente no chão e morreu três dias depois, de um sangramento no cérebro provocado pelas agressões.

Jasire Frazer, de 18 anos e dois jovens de 17 anos, foram inocentados das acusações de homicídio, enquanto Jadan Richards, de 19 anos, um jovem de 16 e outro de 17 anos foram condenados.

A promotora Sally-Anne Russell declarou, no julgamento, que trata-se de “um caso trágico de um homem que morreu tentando proteger sua propriedade”.

“Testemunhas assistiram com horror à forma como o ataque se desenrolou sem qualquer provocação”, afirmou.

“Elas correram para ajudar Silva, depois que os jovens fugiram, mas o grau da violência foi tamanho que ele morreu poucos dias depois.” Paramédicos atenderam Silva na avenida Charlotte Despard e o levaram ao hospital, mas ele não resistiu.

Tarif Farooqi, da Polícia Metropolitana de Londres, disse que os jovens “atacaram de maneira agressiva e sem piedade.”

“Os agressores, que conheciam uns aos outros, claramente haviam decidido usar aquele dia para cometer um crime”, disse. “Por causa disso, a família de Silva perdeu um indivíduo muito querido, que tentava garantir o sustento de seu filho e de outros parentes.”

Natural de Presidente Prudente, interior de São Paulo, Iderval é descrito por amigos como uma pessoa pacífica e tranquila, que gostava de ensinar capoeira e era querido pelos alunos.

Em 2000, emigrou do Brasil para Portugal. Sua mulher e seu filho se mudaram para o país europeu um ano depois. Ali, ele trabalhou como segurança e deu aulas de capoeira e forró.

Conhecido como contramestre Bugrão no mundo do esporte, Silva viajava frequentemente pela Europa, convidado para dar aulas de capoeira em países como Espanha, Alemanha e Finlândia.

O filho dele tinha 24 anos na época do crime. Ele mora em Portugal e chegou a viajar a Londres após o ataque para acompanhar as investigações e a liberação do corpo do pai.

“Ele era uma pessoa muito calma, pacífica, muito responsável com horários, superatencioso com os alunos de capoeira e ajudava em projetos sociais”, diz sua ex-mulher, a esteticista Luciana Pereira Vicente, de 44 anos, que mora em Portugal.

Há cerca de dois anos, Iderval se mudou para o Reino Unido com a intenção de ampliar seu projeto de capoeira. Morou durante um período na cidade King’s Lynn, a 170 km de Londres, e em março se mudou para a capital. Vivia em Croydon, subúrbio no sul de Londres.

Iderval e o amigo André Luiz Maciel, também capoeirista, pretendiam montar no Reino Unido uma sede da associação de capoeira que os dois tinham em Portugal. “Tivemos bastante dificuldades em ter espaço. Viemos com essa intenção. Pensamos: não tem programas para adolescentes na rua, não tem basquete, vôlei, judô. A ideia era oferecer a capoeira.”

Ele diz que os dois, por não terem “sucesso financeiro ainda” e para “pagar as contas”, começaram a entregar comida via Uber Eats. Um grupo de brasileiros, muitos deles entregadores de Uber e outros aplicativos em Londres, fez um protesto com buzinaços após o ataque.

Maciel afirma que testemunhou o momento do crime. “Alguém subiu na moto dele e eu pensei que fosse algum amigo nosso. Em questão de segundos, teve uma luta. No meio da luta estavam os meninos do bairro”, afirma.

Maciel diz que “congelou” quando viu o ataque. “Não consegui reagir.” Ele não sabe dizer quantas pessoas atacaram seu amigo.

A morte de Silva no ano passado assustou os colegas de profissão e escancarou a difícil vida dos motoboys na capital britânica.

O roubo de motos não é a única ameaça que os entregadores em duas rodas dizem ter que enfrentar nas ruas de Londres, onde, segundo relatos, vivem uma rotina de medo e violência.

Atraídos por um mercado de entregas aquecido e pelo câmbio favorável, brasileiros trabalham em grande número como motoboys em Londres.

Eles reclamam, principalmente, do furto e roubo de motos e de comida que transportam, que se transformaram em ameaças constantes e crescentes na rotina dos entregadores.

Os motoboys dizem que o mercado de entregas em Londres é dominado por brasileiros que levam vantagem por serem mais ágeis e ousados no trânsito. Não existem, contudo, números oficiais sobre a quantidade de entregadores que nasceram no Brasil e trabalham no Reino Unido.

Faltam estatísticas oficiais, mas sobram histórias de tensão, ameaça e violência. Segundo motoboys ouvidos pela BBC News Brasil, não é exagero comparar o medo que sentem em Londres com a violência que também deixa muita gente assustada no Brasil.

O paulista Welington Silva, de 42 anos, teve a moto furtada na noite de Natal e, por duas vezes, foi assaltado por grupos de adolescentes que levaram as refeições que ele transportava. Ladrões também levaram a moto do entregador paranaense César Farias, de 29, que precisou pagar resgate para recuperar seu principal instrumento de trabalho.

Já o mineiro Kleverson Saad, de 41 anos, já bateu para não ter a moto roubada, mas apanhou de um grupo que queria pegar a comida que ele entregava. Depois de evitar um roubo batendo nos ladrões, foi orientado pela polícia a mudar de casa.

“Me disseram que um dos integrantes do grupo, que acabou morrendo na perseguição policial, tinha um tio que havia sido morto e o pai estava na prisão. Era de uma família complicada. A polícia disse que poderiam voltar (para se vingar)”, conta.

O paranaense Fernando Pansera, de 41, nunca foi roubado, mas teve a placa da moto clonada e levou multas de infrações que não cometeu.

O número de roubos e furtos de motocicletas praticamente duplicou entre 2013 e 2016, último ano em que a polícia metropolitana de Londres divulgou estatísticas específicas de roubo de motos.

Foram registrados 7.385 casos em 2013 e 14.043 em 2016. O índice de motos recuperadas também aumentou ao longo desses anos — mais da metade dos veículos são encontrados.

BBC