MPF incluiu Glenn às pressas na denúncia
Foto: Jorge William/Agência O Globo
O jornalista americano Glenn Greenwald e outras seis pessoas foram denunciados ontem pela Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) no âmbito da Operação Spoofing, que investigou a invasão de celulares de autoridades por hackers. Entre as vítimas estão o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava-Jato no Paraná.
A grande surpresa da denúncia – entregue à Justiça Federal em Brasília – foi a inclusão de Greenwald, que é o responsável pela divulgação das informações roubadas mas que não era nem sequer investigado no processo. A ação contra o jornalista foi criticada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Segundo o procurador Wellington Divino Marques de Oliveira, que assina a denúncia, um arquivo de áudio com uma conversa entre Greenwald e um dos hackers levantou suspeitas contra o jornalista. Com a análise do diálogo, diz o procurador, “ficou comprovado que ele (Greenwald) auxiliou, incentivou e orientou o grupo durante o período das invasões”.
Na conversa, o hacker Luiz Henrique Molição pede orientação a Greenwald sobre como proceder com os arquivos após a publicação das matérias pelo site “The Intercept Brasil”. O jornalista, porém, deixou claro que não poderia dar conselhos ao interlocutor, mas garantiu que manteria o sigilo da fonte.
Em seguida, o hacker pede orientação sobre se deveria armazenar ou apagar o conteúdo das mensagens. O jornalista afirma que manterá os arquivos mas que o hacker poderia apagá-los caso entendesse que não teriam mais utilidade. Greenwald ressaltou, contudo, que essa era uma opção de Molição e repetiu que não poderia lhe aconselhar.
Na avaliação do Ministério Público Federal (MPF), o jornalista sabia que a invasão dos celulares ainda estava em andamento mas, mesmo assim, disse ao hacker que sustentaria a versão de que o contato com os criminosos só se deu após a coleta de todo o material extraído das vítimas. Greenwald, assim, teria agido “como partícipe nas condutas funcionando como garantidor e orientador da associação criminosa”.
Em seu despacho, o procurador aponta ainda que o jornalista não foi investigado pela Polícia Federal devido a uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele, no entanto, afirma que vai enviar uma cópia da denúncia à Procuradoria-Geral da República para subsidiar eventual pedido de revogação da decisão.
O advogado de Greenwald, Rafael Borges, disse que ainda está analisando o envio de uma reclamação ao Supremo referente ao descumprimento da liminar.
Para a OAB, a denúncia descreve um fato que não pode ser considerado crime. “A participação em qualquer delito exige investigação ou colaboração efetiva para a sua prática, e nenhuma das mensagens do jornalista incluídas no expediente do MPF indica quaisquer desses comportamentos”, afirmou em nota.
No Twitter, Maia classificou a denúncia como uma ameaça à liberdade de imprensa. “Jornalismo não é crime. Sem jornalismo livre não há democracia”, disse.
A denúncia menciona os crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e interceptação telefônica ilegal. A peça foi encaminhada à 10ª Vara Federal de Brasília e ficará a cargo do juiz Ricardo Leite.
As apurações confirmaram que Walter Delgatti Netto e Thiago Eliezer Martins Santos eram os mentores e líderes do grupo. Danilo Cristiano Marques agia como “testa-de-ferro” de Delgatti, proporcionando meios materiais para a execução dos crimes.
Já Gustavo Henrique Santos, outro denunciado, era programador, desenvolveu técnicas que permitiram a invasão do aplicativo de mensagens e perpetrava fraudes bancárias. Sua mulher, Suelen Oliveira, agia como laranja e “recrutava” nomes para participarem dos crimes. Luiz Molição invadia terminais informáticos, aconselhava Delgatti sobre condutas que deveriam ser adotadas e foi o porta-voz do grupo nas conversas com Greenwald.
O advogado Ariovaldo Moreira, que representa Delgatti, SSantos e Suelen, afirmou em nota que a denúncia confirma que “as acusações são de cunho político e desprovidas de qualquer embasamento técnico”. Os advogados dos demais denunciados não se pronunciaram ou não foram localizados pela reportagem.