NYT critica denúncia contra Glenn

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Foto: Jimmy Chalk/The New York Times

Promotores federais no Brasil acusaram o jornalista americano Glenn Greenwald de crimes cibernéticos por seu papel em trazer à luz mensagens de celular que envergonharam os promotores e mancharam a imagem de uma força-tarefa anticorrupção.

Em uma denúncia criminal divulgada na terça-feira, os promotores da capital, Brasília, acusaram Greenwald de fazer parte de uma “organização criminosa” que invadiu os celulares de vários promotores e outros funcionários públicos no ano passado.

Greenwald, um crítico ardente do presidente de extrema direita do Brasil, Jair Bolsonaro, é uma figura profundamente polarizadora no Brasil, onde seu trabalho é elogiado por esquerdistas e condenado como partidário e pesado por funcionários do governo Bolsonaro.

A organização de notícias que Greenwald co-fundou, The Intercept Brasil, publicou artigos no ano passado com base nas mensagens vazadas de celulares que levantavam questões sobre a integridade e os motivos dos principais membros do sistema judicial brasileiro.
Os artigos questionam a imparcialidade de um ex-juiz, Sérgio Moro, e de alguns dos promotores que trabalharam em uma investigação de corrupção que levou várias figuras políticas e empresariais poderosas à prisão. Entre eles estava um ex-presidente, um popular esquerdista cuja convicção abriu o caminho para a eleição de Bolsonaro. Moro foi o juiz que lidou com esse caso. Ele agora é ministro da Justiça de Bolsonaro.

Em uma declaração, Greenwald chamou as acusações de “uma tentativa óbvia de atacar a imprensa livre em retaliação pelas revelações que relatamos sobre o ministro Moro e o governo Bolsonaro”.
Greenwald disse que pretendia continuar publicando e apresentar o caso contra ele como um teste da democracia brasileira.

“Não seremos intimidados por essas tentativas tirânicas de silenciar jornalistas”, disse ele.

Em uma denúncia criminal de 95 páginas, os promotores dizem que o The Intercept Brasil, a organização de notícias que Greenwald cofundou, recebeu mais do que meramente as mensagens hackeadas e supervisionou a publicação de informações dignas de nota.

Citando mensagens interceptadas entre Greenwald e os hackers, os promotores dizem que o jornalista desempenhou um “papel claro na facilitação da prática de um crime”.

Por exemplo, os promotores afirmam que Greenwald incentivou os hackers a excluir arquivos que já haviam sido compartilhados com o The Intercept Brasil, a fim de cobrir seus rastros.

Os promotores também dizem que Greenwald estava se comunicando com os hackers enquanto monitoravam ativamente as conversas privadas no Telegram, um aplicativo de mensagens. A denúncia acusou outras seis pessoas, incluindo quatro que foram detidas no ano passado por conexão com o uso de celulares.

Especialistas jurídicos e políticos de esquerda criticaram a decisão de acusar Greenwald, limitando as evidências apresentadas contra ele.

Thiago Bottino, especialista jurídico da Universidade Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, disse que os promotores não descreveram evidências que sugiram que Greenwald violou a lei.

“Não há nada na denúncia mostrando que ele ajudou ou guiou” os hackers, disse ele.

Bottino disse que a jurisprudência brasileira oferece aos jornalistas amplas proteções. “Você não pode punir um jornalista por divulgar um documento que foi obtido por meios criminais”, disse ele.

Gleisi Hoffman, presidente do Partido dos Trabalhadores, o maior partido da oposição, classificou a acusação de abuso de poder.

“Eles querem um estado policial, com mais farsas, ilegalidades e atos arbitrários”, escreveu ela em uma mensagem no Twitter.
Greenwald se mudou para o Brasil em 2005, depois de conhecer David Miranda, um homem brasileiro com quem se casou mais tarde e que se tornou congressista federal no ano passado.

Greenwald ficou conhecido por seu papel na divulgação de documentos classificados de segurança nacional vazados pelo ex-contratado pela Agência de Segurança Nacional Edward Snowden em 2013. Ele foi co-fundador do The Intercept Brasil em 2016.

Greenwald expressou preocupação no ano passado que as autoridades poderiam acusá-lo criminalmente como represália pela reportagem do The Intercept Brasil com base nas mensagens vazadas.

Bolsonaro deixou poucas dúvidas de que gostaria de ver o jornalista punido. No final de julho, o presidente usou um termo irônico para se referir a Greenwald e disse que o jornalista “pode acabar na prisão”.

As preocupações de Greenwald foram parcialmente baseadas em relatórios de que autoridades federais estavam investigando suas finanças.

Esses relatórios levaram um juiz da Suprema Corte, Gilmar Mendes, a emitir uma ordem extraordinária proibindo a polícia federal de investigar o papel de Greenwald na disseminação das mensagens hackeadas.

Os promotores disseram na terça-feira que cumpriram essa ordem até encontrarem mensagens de áudio que, segundo eles, envolviam Greenwald em atividades criminosas.
As acusações foram uma “grande surpresa”, disse Greenwald em uma entrevista na terça-feira, porque a Polícia Federal emitiu um relatório em dezembro que o impedia de se envolver em uma conduta criminosa relacionada a hackers por telefone.
Greenwald disse que era metódico ao lidar com a fonte que lhe deu as conversas vazadas, atento às lições que aprendeu no caso Snowden.
“A única coisa que não pude fazer é dar orientação”, disse Greenwald. “Isso está cruzando uma linha. Eu fui muito cuidadoso.
O promotor que abriu o caso, Wellington Oliveira, acusou o presidente da Ordem dos
Um juiz federal recentemente negou provimento ao caso, declarando que o argumento de Oliveira não tinha uma base legal sólida.
O Comitê para a Proteção dos Jornalistas expressou preocupação com o caso contra Greenwald.
“Acusar jornalistas de atividades criminosas baseadas em interações com fontes envia uma mensagem assustadora para os repórteres que trabalham em matérias sensíveis em um momento em que a mídia brasileira está cada vez mais sendo atacada por funcionários de seu próprio governo”, disse Natalie Southwick, coordenadora do programa no comitê. quem monitora a liberdade de imprensa na América Latina.

The New York Times