Óleo atingiu 57 unidades de conservação

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Um levantamento preliminar liderado por cientistas da Universidade Federal do Ceará (UFC) indica que o derramamento de óleo que se iniciou há quase quatro meses no Nordeste atingiu 57 unidades de conservação do país.

Segundo o biólogo que coordena o trabalho, há confirmação de que houve intrusão de contaminantes em pelo menos 40 dessas áreas, e outras 17 ainda estão sendo avaliadas.

Marcelo Soares, do Instituto de Ciências do Mar da Universidade Federal do Ceará (Labomar-UFC), afirma que sete diferentes categorias de áreas protegidas foram afetadas, três delas de uso sustentável (como reservas extrativistas), e quatro de proteção integral (como parques nacionais e estaduais).

O trabalho final de cruzamento de dados para determinar quantas unidades de conservação foram atingidas deve terminar em 15 dias, diz Soares, e será publicado. Mas detalhes sobre a dimensão do impacto ainda dependem de levantamentos em cada uma das unidades de conservação.

Regionalmente, universidades têm iniciativas fragmentadas de avaliação dos impactos, mas, à exceção do trabalho coordenado pela UFC, não há uma articulação nacional para tentar dimensionar o impacto.

O Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA) liderado pela Marinha para responder ao desastre com o óleo chegou a publicar uma estimativa de que 15 unidades de conservação tinham sido atingidas, mas todas elas são federais. O número não leva em conta, porém, áreas de proteção estaduais e municipais.

Impacto invisível
Em seu último boletim de situação, o Ibama informa que mais da metade das 999 localidades atingidas em algum momento pelo derramamento não possuem mais óleo “observado”. Nas praias restantes, diz a Marinha, há apenas focos isolados de óleo, e não há mais as grandes “manchas” que caracterizaram o desastre em suas primeiras semanas.

“A situação caminha para a normalidade, sendo que as poucas localidades ainda afetadas apresentam somente vestígios esparsos”, afirma o GAA, em comunicado.

— De fato, tem diminuído o número de ocorrências, e elas estão surgindo agora com pequenos tamanhos, de forma fragmentada, ou no aspecto microscópico — afirma Soares.

Para o biólogo, porém, a ausência de impacto observável não permite descartar riscos.

— Esse é um dos momentos mais perigosos que existe, porque o óleo tem componentes invisíveis a olho nu, mas com altíssimo potencial toxicológico e carcinogênico. O fato de a praia estar sem óleo não significa que ela esteja limpa — diz.

Soares e outros pesquisadores desejam fazer um mapeamento da contaminação da costa brasileira com análises químicas, mas o recurso que o grupo solicitou à Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) está atrasado.

O GAA sugere uma situação de controle sobre a situação.

“Grande parte do óleo encontrado já foi retirado das áreas atingidas e destinado ao descarte adequado”, afirma, em comunicado. “Em alguns casos, a limpeza natural pode ser menos danosa ao ambiente do que técnicas ativas de limpeza.”

Segundo o oceanógrafo Ademilson Zamboni, da ONG Oceana, aquilo que a Marinha sugere pode se aplicar mesmo a muitos casos, mas é preciso acessar informações ponto por ponto.

— Depende muito do tipo de praia. Numa praia muito aberta, com uma dinâmica muito forte de correnteza, é muito pouco provável que uma quantidade baixa de óleo cause contaminação substancial — explica o pesquisador.

— Mas, em praias que são protegidas por recifes de corais, em bancos de corais, onde parte do óleo ficou retido por um tempo, a permanência da contaminação é maior.

Rodolitos e pescadores
Uma das preocupações mais marcantes dos biólogos é com os chamados bancos de rodolitos, formações agregadoras de algas e líquens similares a corais, que representam alguns dos ambientes marinhos mais biodiversos da costa do Brasil. Em correspondência enviada à revista Science, o ecólogo Paulo Horta, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), descreve a preocupação.

“O derramamento ameaça severamente esses ecossistemas, que compreendem impressionantes 200 bilhões de toneladas, desde a latitude 5° Norte até 27° Sul ao longo da costa brasileira, e cobrem um uma área potencial de 229 mil km² de leito marinho”, escreve.

Nas unidades de conservação que abrigam atividades de desenvolvimento sustentável, como a pesca familiar, por exemplo, também sabe-se pouco sobre o tamanho do dano.

A demanda por pescado diminuiu com as notícias do desastre ambiental, mas não há pesquisa ainda quantificando o impacto econômico. Zamboni está articulando uma rede de pesquisa com outras ONGs, incluindo a Conservation International e a Rare, para estudar o tamanho do problema.

Soares, da UFC, afirma que universidades públicas do Nordeste também estão tentando se integrar para realizar esse trabalho, mas a demora no aporte de recursos da Capes atrapalha a iniciativa.

O Globo.