Relator da ONU denuncia EUA e Reino Unido no caso Assange-Manning
Foto: Matt Dunham/AP Photo
Nils Melzer, relator especial das Nações Unidas, criticou ferozmente a contínua violação dos “direitos humanos” denunciantes do WikiLeaks pelos governos da OTAN.
O relator especial da ONU Nils Melzer criticou os governos do Reino Unido e dos EUA pela forma como estão tratando os denunciantes da WikiLeaks Julian Assange e Chelsea Manning, respectivamente.
Em uma carta publicada na terça-feira (31) e enviada em 29 de outubro para o governo do Reino Unido, o relator especial da ONU tece duras críticas à forma como Julian Assange está sendo tratado, citando a deterioração da saúde do fundador do WikiLeaks, e pedindo sua libertação, ou pelo menos melhoria das condições na prisão.
A minha carta ao governo do Reino Unido de 29 de outubro de 2019, detalhando violações graves do processo, expressando alarme quanto às condições de detenção e saúde de Assange, reiterando as minhas perguntas e apelando para sua rápida libertação. 60 dias e sem resposta
Segundo relata a carta, Assange está sendo submetido a tratamento “desnecessário, desproporcional e “discriminatório” na Prisão de Belmarsh de alta segurança.
As minhas conclusões oficiais, apoiadas por especialistas médicos, fornecem inquestionavelmente “motivos razoáveis para acreditar” que os funcionários britânicos contribuíram para a tortura psicológica ou maus tratos de Assange, seja por perpetração, tentativa, cumplicidade ou outras formas de participação [no processo]
O “exame forense e psiquiátrico completo” realizado durante a visita em 9 de maio de 2019 mostrou “um padrão claro de sintomas típicos de pessoas que foram expostas a tortura psicológica por um período prolongado de tempo”, segundo disse o relator da ONU.
“Estou muito preocupado que, se o Reino Unido não tomar medidas urgentes para aliviar a situação do Sr. Assange, a sua saúde possa em breve atingir uma fase crítica, incluindo o risco de morte”.
Além disso, uma eventual extradição para os EUA o exporia a “um risco real de violações graves […] incluindo tortura e outros tratamentos ou castigos cruéis, desumanos ou degradantes”, algo que já aparenta estar acontecendo com o denunciante no Reino Unido.
Melzer exigiu igualmente que as autoridades britânicas fornecessem detalhes das medidas que tomaram para proteger Assange da tortura e de outros abusos e, se tais medidas não foram tomadas, explicar como essa falha é “compatível com as obrigações de direitos humanos” que o Reino Unido subscreveu sob o direito internacional.
Em um telefonema recente de Julian Assange permitido no Natal pelas autoridades britânicas, Vaughan Smith, seu amigo e jornalista, relatou que o denunciante soava muito diferente do habitual, parecendo sedado, e com dificuldade em falar. “Estou morrendo aos poucos”, disse Assange ao amigo durante a conversa.
Relativamente à ativista detida pelos norte-americanos, uma carta escrita em novembro e divulgada na terça-feira (31), junto com a carta relativa a Assange, diz também que Manning está sofrendo “uma medida de coerção aberta e progressivamente severa”, que cumpre “todos os elementos constitutivos de tortura”.
A minha carta oficial para o governo dos EUA de 1 de novembro de 2019 explicando por que é que a detenção contínua de Chelsea Manning não é uma sanção legal, mas uma medida coerciva aberta e progressivamente severa, que consiste em tortura, e que deve ser suspensa e abolida sem demora
Melzer disse que a detenção coerciva também parece ser “incompatível com as obrigações internacionais quanto aos direitos humanos” dos EUA, de acordo com várias convenções internacionais.
“A prática de privação coerciva da liberdade por desprezo civil […] envolve infligir intencionalmente sofrimento mental e emocional progressivamente severo para fins de coerção e intimidação por ordem das autoridades judiciais”, escreveu o especialista em tortura.
O relator da ONU acrescentou que as vítimas deste tipo de confinamento coercitivo prolongado têm demonstrado “sintomas pós-traumáticos e outras consequências graves e persistentes para a saúde mental e física”.
Manning está atualmente na prisão por desrespeito ao tribunal depois que se recusou a testemunhar perante um grande júri federal que estava tentando levantar acusações adicionais contra o WikiLeaks e Julian Assange.
Quanto à própria denunciante, ela continua chamando sua detenção de “inútil” e “cruel”, e está “totalmente comprometida com seus princípios”, de acordo com seus advogados.
Manning já foi condenada a 35 anos em uma prisão militar em 2011, tendo iniciado detenção de fato no ano anterior. Sua sentença foi comutada pelo então presidente Barack Obama em janeiro de 2017.
O fundador do WikiLeaks, Julian Assange, que está preso em Londres à espera de uma audiência de extradição para os EUA, foi acusado de conspiração para cometer intrusão informática com Chelsea Manning para hackear computadores do Departamento de Defesa e obter acesso a segredos do Estado norte-americano.
Em 2010, o WikiLeaks divulgou o curta-metragem Assassinato Colateral, mostrando um ataque indiscriminado dos EUA em Bagdá em 2007, que matou 12 pessoas, incluindo dois jornalistas da Reuters.
Os procuradores norte-americanos estão tentando forçar Manning a testemunhar no julgamento de Assange se ele for extraditado para os EUA.