Por que mulheres são minoria na política

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Foto: Luis Macedo/Agência Câmara/Reprodução

Durante os últimos 20 anos, venho fazendo palestras e cursos de comunicação e formação política para partidos brasileiros. Alguns até patrocinados por entidades internacionais, como a fundação alemã Konrad Adenauer. Nos últimos 10 anos, desde a aprovação da Lei 12.034/2009, quando a cota das mulheres em campanhas passou a ser obrigatória, parte dessas mentorias foi direcionada à formação e preparação das candidaturas de mulheres, uma vez que os partidos têm dificuldade de cumprir a legislação e preencher os 30% de vagas a elas destinadas. Dessa atuação, decorre a experiência adquirida que embasa a constatação aqui apresentada.

As pré-campanhas para as eleições municipais deste ano estão em andamento, assim como as articulações para alianças adiantadas para posterior registro das candidaturas. Mas, para aqueles como eu, que já estão desenvolvendo o trabalho de comunicação dos partidos, uma constatação que se evidencia nos municípios é que mais uma vez o Brasil perderá a oportunidade de aumentar a presença das mulheres no exercício de mandatos públicos municipais no Legislativo e Executivo.

Uma rápida análise das últimas eleições municipais já nos mostra que em 2012 os partidos atingiram 32,57% de candidatas do sexo feminino e nas eleições de 2016 — a última — esse percentual caiu para 31,60% (ou 155.587 mulheres concorrendo). Em números absolutos, pode até ser que haja uma superação em relação à eleição passada, mas, a julgar pelas movimentações apuradas nas dezenas de municípios que tenho visitado, esse número vai cair percentualmente.

Porém se essa já é uma má notícia, há ainda outras piores, pois o que comprovaremos após as eleições que se avizinham é que vivemos verdadeiramente um retrocesso, que, inclusive, está na contramão do que acontece no mundo desenvolvido e até em relação aos nossos vizinhos da América Latina.

Primeiro precisamos olhar para o resultado efetivo da implantação da Lei de Cotas e hoje, 11 anos depois, podemos afirmar sem medo de errar que ela é uma política esgotada em si mesma e se não vier acompanhada de outras medidas — como as adotadas na Argentina, por exemplo — poderemos também perder os próximos 4 anos.

Na disputa pelos cargos de vereador em todo o país, 30%, em média, são candidatas e 12% das cadeiras são efetivamente vencidas por mulheres. Na disputa para prefeito, 12%, em média, são candidatas e 10% dos prefeitos são mulheres. Então, em que pese termos 30% de mulheres disputando as eleições para o Legislativo, o fato é que apenas 12% vencem e ocupam cargos efetivamente. Esse modelo estatístico se repetiu, na média, nas últimas eleições desde a implantação da Lei de Cotas. Isso significa que é quase igual ao percentual de ocupação de cadeiras por mulheres quando a disputa é para cargos majoritários do poder executivo. Ou seja, temos mais mulheres disputando para o legislativo por obrigação da lei, mas, na prática, a quantidade na ocupação de cadeiras é muito parecida a de cargos para os quais não há obrigatoriedade de cotas para candidatas, como nas disputas para prefeito. Essa é a maior prova de que a Lei se esgotou. Precisamos avançar.

Estamos interpretando os resultados das eleições municipais porque acontecem neste ano, mas é fato que as mulheres ocupam também baixos percentuais de vagas nos cargos eletivos na esfera federal: são 10% dos deputados federais e 14% dos senadores, embora sejam metade da população e da força de trabalho na economia. O percentual é idêntico nas Assembleias Estaduais.

Somos o penúltimo país, entre os 21 da América Latina, em ocupação de cargos no Poder Legislativo por mulheres. Ao nos compararmos com o mundo, apresentamos um dos menores índices de presença feminina nos Parlamentos. Entre 190 países, estamos em 158º lugar. Precisamos urgentemente de uma nova legislação para que nas eleições de 2022 e de 2024 não tenhamos que voltar a lamentar que 50% de singular riqueza da nossa espécie esteja sub-representada nas esferas de comando da nossa consolidação como sociedade. Será que temos consciência do que estamos perdendo como civilização?

Estadão