Desembargador que favoreceu Flávio é extremista de direita

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Foto: Reprodução

O desembargador Paulo Rangel, que desempatou o julgamento de ontem que deu foro privilegiado ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), compartilhou publicações em defesa do porte de armas e críticas à ‘comoção’ pela morte de criminosos.

Nem sempre foi assim. Até 2016, Rangel costumava repassar a seus seguidores mensagens mais voltadas para os direitos humanos. A partir de 2017, contudo, o tom mudou. Em julho daquele ano, compartilhou um vídeo em que o hoje deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) fala sobre como se faz para obter uma arma nos Estados Unidos e critica a dificuldade no Brasil.

“Programa de fim de semana com a família! Durante 30 anos no Brasil, entraram em nossas mentes para termos medo de nos defendermos: ‘Nunca reaja’ e onde chegamos? Triplicaram os homicídio (sic), 3x mais entre liberar e não liberar as armas para pessoas de bem! Pensem nisso! #MenosEstado”, diz a publicação endossada pelo desembargador, que deturpa dados sobre as mortes no País pós-desarmamento.

Em dezembro de 2017, Rangel apareceu em foto publicada ao lado do juiz Marcelo Bretas, relator da Lava Jato no Rio, durante um treinamento de tiro oferecido pela Polícia Civil. Ambos portavam fuzil. Bretas é simpatizante do presidente Jair Bolsonaro, o que já demonstrou diversas vezes nas redes sociais e até em agendas públicas do mandatário em terras cariocas.

De três anos para cá, o desembargador tem indicado insatisfação com o que considera uma comoção desmedida pela “morte de bandidos”. Ao publicar vídeo irônico em que um ator interpretando um repórter de TV entrevista um homem que acabara de cometer um assalto e ser agredido, o magistrado escreveu: “Não estamos muito longe dessa ironia não. Lamentável ao ponto que chegamos (sic).”

Em outra publicação, compartilhou um texto de opinião com o seguinte título: “Militar morto hoje com a esposa grávida não gerou 1% da comoção de quando morre um bandido. Esse país perdeu a vergonha na cara.” E ainda uma outra, na qual o autor original do texto critica a postura de ‘PSOL, PT, PCdoB, ONGs de ‘direitos humanos’, setores da Defensoria Pública’ nas discussões sobre Segurança Pública.

Reportagem do jornal O Globo publicada nesta sexta-feira, 26, mostrou que Rangel já criticou o direito a foro em um livro. Defendeu o cancelamento de uma súmula antiga do Supremo Tribunal Federal (STF) que mantinha o foro mesmo após o político deixar o cargo.

“A razão de ser do cancelamento da súmula é simples: se o agente não mais ocupa o cargo para o qual foi estabelecida a competência por prerrogativa de função, não faz (e não fazia) sentido que permaneça (ou permanecesse) com o foro privilegiado”, escreveu, antes de classificar um caso como esse de ‘desrespeito à sociedade’.

O caso de Flávio se aplica nesse mesmo contexto: a defesa alegou que, por ser deputado estadual na época dos crimes que teria praticado, o hoje senador tem direito a ser julgado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça, onde os parlamentares fluminenses têm foro, e não por um juiz de primeira instância. A decisão dada pela 3ª Câmara Criminal do TJ, ontem, vai contra o que tem entendido ultimamente o STF, que aponta para a extinção do foro especial após a saída do cargo.

Com a vitória na Justiça do Rio, Flávio ganhou tempo. A denúncia contra ele estava prestes a ser apresentada pelo Ministério Público, que investiga desde 2018 o suposto esquema de “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio. Ao longo do processo, os promotores apontaram indícios da prática de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa pelo filho do presidente.

Caberá ao relator do processo no Órgão Especial, que vai ser definido por sorteio, decidir se mantém ou anula as decisões já proferidas até aqui pelo juiz Flávio Itabaiana Nicolau, que cuida do caso desde o início e determinou, por exemplo, a prisão preventiva de Fabrício Queiroz e quebras de sigilo bancário, fiscal e eletrônico.

O MP pode recorrer da decisão de ontem, mas ainda não se manifestou. O recurso pode ser apresentado tanto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto ao Supremo Tribunal Federal (STF), se a Promotoria entender que os desembargadores desrespeitaram um entendimento da Corte.

Procurados, o Tribunal de Justiça e o desembargador Paulo Rangel ainda não se manifestaram sobre o perfil do magistrado.

Estadão