Manipular número de mortes por pandemia é crime
Foto: Miguel Schincariol/Getty Images
Na democracia o princípio é a transparência. Por isso, essa confusão deliberada com os dados da pandemia é um desrespeito aos cidadãos, e também revela o caráter autoritário do governo. Ele quer com isso convalidar a insustentável posição do presidente da República que, desde o início, nega a gravidade da doença. É dessa negação que sai o “gripezinha” e o “E daí?”. A briga com os números já teve vários capítulos, até uma tétrica ideia de recontar os mortos. No domingo, o governo chegou ao cúmulo. Foram duas divulgações com diferenças gritantes.
No primeiro momento, o Ministério da Saúde divulgou o registro de 1.382 novos óbitos em 24 horas. Depois, na mesma noite de domingo, foi informado que seriam 525 mortes registradas no espaço de um dia. Em qual número do Ministério acreditar? Houve conflito também nos dados de novos casos confirmados. Foram 12.581 na primeira divulgação e 18.912 no segundo momento.
A ação do governo é um desrespeito à população brasileira, aos que se cuidam, aos que precisam voltar ao trabalho. É um problema também para as autoridades estaduais e municipais, que combatem a pandemia localmente. Gera confusão.
Em debate no domingo na “GloboNews”, Marina Silva chamou a situação de “pedaladas pandêmicas”. Para ela, esconder números em meio à pandemia é um crime de responsabilidade do presidente. O governo Bolsonaro tem um comportamento típico de regimes que escondem dados e fazem confusão deliberada com os números.
O nível de transparência começou a cair com a saída de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde. Ele respondia a perguntas diariamente e isso ajudava os gestores locais e a população. Na gestão de Nelson Teich, a transparência caiu. Depois dele, a pasta foi militarizada. A informação é uma arma poderosa no combate à qualquer crise. Com ela, governos e população tomam decisões mais sábias.
Essa gestão age de forma mesquinha. O próprio presidente disse que vai atrasar a divulgação dos dados para que o “Jornal Nacional” não consiga veicular a notícia durante o programa. Depois disso, o ex-futuro secretário de Ciência e Tecnologia disse que iria recontar os mortos da pandemia. Carlos Wizard desistiu de entrar no governo. Melhor. Se é para piorar, o Brasil não precisa disso. No final da pandemia, os números serão revistos sim, mas para cima, porque o que há é uma subnotificação.
Brincar com os números, e ainda mais, com número de mortos em plena pandemia, é um ato grave demais.