Prossegue guerra do MP com a Lava Jato

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Foto: ANPR / Divulgação

Relator da proposta de criação da Unidade Nacional Anticorrupção (Unac) no Ministério Público Federal (MPF), o subprocurador Nívio de Freitas disse em entrevista ao Estadão ser contra o compartilhamento irrestrito de dados da Lava Jato com a Procuradoria-Geral da República (PGR). A possibilidade de ter um novo órgão para unificar as forças-tarefa do País está em discussão no Conselho Superior do Ministério Público, colegiado presidido pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.

Uma das propostas sob análise daria mais poder ao procurador-geral, pois centralizaria em Brasília o comando de operações como a Lava Jato – que além de Curitiba tem braços no Rio de Janeiro e em São Paulo. Essa proposta também prevê que as bases de dados das forças-tarefas sejam administrado por uma secretaria ligada à PGR. O debate sobre a criação da Unac ganhou força após integrantes da força-tarefa paranaense acusarem a cúpula da PGR de tentar ter acesso ao banco de dados da operação de forma “informal”. A suposta manobra abriu uma crise no Ministério Público e levou a uma sindicância na corregedoria do órgão.

Para Freitas, no entanto, o novo órgão deve servir de apoio, mas manter a independência dos procuradores originais de cada caso, para não “desfigurar a instituição”. “Qualquer estrutura que se criar tem de ser de dar suporte ao procurador natural, para evitar que haja qualquer contaminação política na instituição”, disse. A proposta de criar a Unac ainda está em fase inicial e não tem prazo para ser votada no Conselho do MP. Além de Aras, integram o colegiado outros nove subprocuradores eleitos pela categoria.

Uma sugestão ao texto apresentada em abril prevê que “as bases de dados atualmente custodiadas” pelas forças-tarefa da Lava Jato serão “transferidas e administradas pela SPPEA (Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise)”, órgão ligado à PGR. O substitutivo foi apresentado pelos conselheiros Hindemburgo Chateaubriand, aliado de Aras e secretário de cooperação internacional, e José Adonis Callou, que coordenou a atuação da Lava Jato na PGR até janeiro.

O relator do projeto no conselho, no entanto, diz que a concentração de dados em Brasília precisa ser discutido com cuidado. “Eu acho isso sensível e preocupante”, disse Nívio, que exemplifica: “Em um caso de quebras de sigilo fiscal e bancário, elas não devem ser compartilhadas. Ainda que sejam compartilhadas, para serem acessadas, dependeriam de autorização judicial, inclusive, para o PGR ter acesso”, disse o subprocurador.

Freitas disse ter em suas mãos duas propostas diferentes sobre a Unac. “Faremos uma terceira compilando e fazendo o melhor para instituição MPF e principalmente, a sociedade, que é o valor principal”, disse ao Estadão.

Embora não seja contra a Lava Jato, desde antes de assumir o cargo máximo no MP Aras já fazia críticas a alguns pontos da operação. Em sabatina no Senado em setembro do ano passado, afirmou que era preciso corrigir alguns “desvios”. “Eu sempre apontei os excessos, mas sempre defendi a Lava Jato”, afirmou ele na ocasião.

Em maio deste ano, o procurador-geral requisitou às forças-tarefas da Lava Jato no Rio, em São Paulo e no Paraná as bases de dados completas da operação. Enviada por Aras a Curitiba para copiar as informações, a coordenadora da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Lindôra Araújo, não foi autorizada pelos procuradores, que acionaram a corregedoria para apurar o que chamaram de “busca informal” de provas.

Em paralelo às discussões, a PGR decidiu não renovar a permissão para que alguns integrantes destas forças-tarefas atuassem de forma exclusiva nos casos. Cinco procuradores cedidos temporariamente à Lava Jato no Paraná e em São Paulo e à Greenfield no Distrito Federal agora terão que acumular o trabalho com processos de suas unidades originais.

Nos bastidores do MPF, a leitura é que a PGR está desidratando as forças-tarefas justamente para forçar a aprovação da Unac.

Na avaliação de Freitas, neste cenário, seria melhor continuar com estruturas precárias nas forças-tarefas do que ter uma estrutura muito boa, mas sem a independência dos procuradores que atuam nos casos. “A pior coisa que poderia surgir é que haja uma quebra da independência institucional, e que a atuação possa vir a ser tolhida ou de alguma forma controlada. Isso iria em detrimento não só do MPF, como da sociedade”, disse o relator da proposta da Unac.

Estadão