Guedes quer acabar com o salário-família

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES

Um dos possíveis programas assistenciais a serem extintos para a criação do futuro Renda Brasil, uma espécie de Bolsa Família repaginado, o salário-família pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) beneficia hoje cerca de 20,6 milhões de brasileiros.

O número apresentou uma forte queda nos últimos anos – em 2010, cerca de 75 milhões de pessoas recebiam o benefício –, mas mostra que milhões de famílias podem ser atingidas diretamente pela proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, para o novo programa.

O governo estuda unificar alguns benefícios considerados “ineficientes”, como o salário-família, o abono salarial e o seguro-defeso (destinado a pescadores, para que não trabalhem em determinado período), por exemplo, para incorporá-los ao Bolsa Família, que passaria a se chamar Renda Brasil.

Hoje, o salário-família é pago no valor de R$ 48,62 ao empregado de acordo com o número de filhos. Para ter direito, o cidadão precisa se enquadrar no limite máximo de renda estipulado pelo governo, atualmente de até R$ 1.425,56.

Assim, se um trabalhador que ganha um salário mínimo possui dois filhos menores de 14 anos, vai receber R$ 97,24 do INSS. Caso o valor da remuneração mensal ultrapasse a faixa máxima (R$ 1.425,56), não terá direito ao benefício.

Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro Ferreira analisa, com base no que tem sido anunciado, que a chance de beneficiários do salário-família ficarem de fora do futuro Renda Brasil é muito grande.

Ele elogia a posição do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que disse na quarta-feira (26/8) não ter gostado da proposta apresentada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. “Não posso tirar de pobres para dar a paupérrimos”, disparou o chefe do Executivo.

“Para incorporar o salário-família ao Bolsa Família e essas 20 milhões de pessoas não saírem perdendo, tem que aumentar a linha de corte de entrada no Bolsa Família a ponto de incorporar também essas pessoas”, explica Leandro Ferreira.

Hoje, o Bolsa Família é pago às famílias que têm renda de até R$ 178 por pessoa. O governo ainda não anunciou qual será a linha de corte do Renda Brasil. Segundo o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, Bolsonaro baterá o martelo nesta sexta-feira (28/8).

Leandro avalia que o salário-família é o melhor benefício a ser unificado com o Bolsa Família. Isso porque os dois programas se assemelham em vários aspectos, como no valor pago aos beneficiários e nas regras de condicionalidade.

Porém o benefício do INSS tem algumas fragilidades. “O problema é que o salário-família coloca a verificação da condicionalidade sobre responsabilidade do empregador, mas a maior parte das empresas não faz essa checagem”, diz.

Além disso, o salário-família é pago somente a empregados e ao trabalhador avulso. Ou seja, brasileiros de baixa renda que estão desempregados ou são informais, por exemplo, não têm direito às cotas pagas no benefício.

Isso ajuda a explica, inclusive, parte da queda registrada no número de salários-família pagos na última década. A concessão do benefício caiu de 56,3 milhões em 2014 para 37,6 milhões em 2015.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de brasileiros desempregados passou de 6,8% em 2014 para 8,5% em 2015. No ano seguinte, fim do governo Dilma, essa taxa foi de 11,5%.

Há ainda um outro fator que ajuda a explicar essa queda, destacada pelo professor Emerson Lemes, do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP): a faixa de renda usada para pagamento do salário-família vem se achatando.

Entre 2004 e 2019, o INSS usou duas faixas de renda para que as pessoas se enquadrassem no benefício. Logo, a primeira linha de corte tinha um valor menor referente à remuneração do empregado e recebia, em contrapartida, um benefício maior.

Eis um exemplo: em 2010, o trabalhador que tivesse uma remuneração de até R$ 539,03, iria receber cotas de R$ 27,64 por filho. Já quem recebia entre R$ 539,04 e R$ 810,18, a cota era de R$ 19,48, segundo dados do INSS.

No entanto, desde 2012, o limite da primeira faixa era menor do que o próprio salário mínimo, o que tornava praticamente inviável que o trabalhador – por lei, cada empregado deve receber ao menos o piso salarial – se enquadrasse nessa linha de corte.

Em 2019, por exemplo, quando o salário mínimo no país era de R$ 998, a primeira linha de faixa para receber o salário-família era de até R$ 907,77 para cota de R$ 46,54. Essa regra mudou, no entanto, com a reforma da Previdência.

Dessa maneira, a partir de 2020 existe apenas uma faixa de renda, que é maior do que o salário mínimo. Hoje, o trabalhador que ganha até R$ 1.425,56 recebe R$ 48,62 por filho. Por sua vez, o piso nacional está em R$ 1.045.

Metrópoles