Procurador acusa Bolsonaro de incentivar discriminação a mulheres

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Foto: Pedro Machado

Um dos autores da ação civil pública que pede reparação por declarações desrespeitosas feitas pelo presidente Jair Bolsonaro e seus ministros sobre mulheres, o procurador regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo Pedro Machado afirma que quando alguém com alto cargo na administração pública assume uma postura misógina ajuda a aumentar a desigualdade e a discriminação na sociedade.

“Quando você compara a Amazônia ‘a uma virgem que todo tarado de fora quer’ ou fala que a esposa do presidente da França é feia, você acentua essa cultura de desigualdade e discriminação e o tratamento diferenciado entre homens e mulheres. Tudo isso gera um dano à coletividade”, afirma Machado, em entrevista ao Estadão por telefone.

Segundo Machado, algumas frases ditas por Bolsonaro ou sua equipe representam um abuso da liberdade de expressão e vão no sentido contrário de tratados internacionais sobre igualdade de gênero e redução de desigualdade, dos quais o Brasil é signatário.

A ação também é assinada pela procuradora Lisiane Braecher, para quem o Estadão também pediu entrevista, mas não foi atendido.

O que mais chamou a atenção nas declarações do presidente e de ministros sobre mulheres?
Foi a forma como o presidente se dirigiu a uma repórter da Folha de S.Paulo sobre uma investigação que ela estava fazendo. Ele se dirigiu de forma desproporcional. A partir disso, comecei a fazer uma retrospectiva dessas declarações do presidente e seus auxiliares, uma garimpagem nas notícias de jornais. Me chamou a atenção também o presidente ter revogado uma nota do Ministério da Saúde orientando as unidades de saúde a manterem o atendimento das vítimas de violência sexual. Ele não só revogou como destituiu as pessoas do cargo de confiança.

Quais as consequências de declarações públicas desse tipo de declaração contra as mulheres?
Essas declarações são graves por elas mesmas. É grave também que pessoas com alto cargo na administração pública façam esse tipo de declaração porque elas têm influência social. Isso prejudica ainda mais a situação de desigualdade e discriminação e vai no sentido contrário do que determinam tratados internacionais que o Brasil sancionou e viraram lei. Quando você compara a Amazônia ‘a uma virgem que todo tarado de fora quer’ ou fala que a esposa do presidente da França é feia, você acentua essa cultura de desigualdade e discriminação e o tratamento diferenciado entre homens e mulheres. Tudo isso gera um dano à coletividade. A partir do momento em que se assume um cargo, há compromissos, e a sua ideologia não pode anular isso.

Acredita que a ação será suficiente para evitar que o presidente e os demais integrantes do governo voltem a fazer declarações discriminatórias e preconceituosas contra mulheres?
O MPF está provocando o Judiciário. Estamos mostrando que vemos um problema e achamos importante que ele seja debatido. A intenção é que isso influencie no comportamento, mas se vai de fato acontecer, não consigo saber. O presidente já foi condenado a pagar danos morais em mais de uma situação, como a da Maria do Rosário. Mas isso não o impediu de fazer outras declarações.

O presidente pode argumentar que a ação que vocês propuseram fere a liberdade de expressão.
Se a declaração (de uma pessoa) vai contra o que determina a lei, há um abuso da liberdade de expressão. Há precedentes que indicam que, às vezes, no uso da liberdade de expressão tem havido um abuso, um passo além, que tem gerado danos (para diversas áreas).

Como avalia a forma com o governo está tratando as políticas relacionadas aos direitos das mulheres, especialmente no campo da violência de gênero?
Há situações concretas na ação que demonstram um movimento no sentido contrário da implementação de políticas públicas nessa área. Uma é que o Banco do Brasil fazia um curso de assédio sexual e o presidente (Bolsonaro) foi contra e pediu para acabar. Ele achou ele que isso era uma ideologia de gênero, e não uma política pública. Acredito ser um problema não só do governo federal, mas do Estado brasileiro.

Estadão