Ricardo Barros foi “ministro da doença” e segue fazendo estragos
Foto: Reprodução
Era o dia de votação do projeto que concederia autonomia ao Banco Central (10 de fevereiro deste ano) quando, no plenário da Câmara, o deputado de sexto mandato e líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), colocou a mão direita no peito do ministro da Economia, Paulo Guedes, e pediu que ele se retirasse do local.
O ministro, que tinha ido ao Legislativo para prestigiar parlamentares governistas que aprovariam a mudança legal, incomodou o deputado paranaense por este entender que a oposição poderia usar a presença de Guedes antes do resultado favorável para tentar obstruir a votação. O resultado não mudou, e o governo teve a aprovação da proposição, por 339 votos a 114.
A descortesia, porém, demonstra a relação que o parlamentar tem com os colegas. Próximo do Centrão, mas não “querido” pelos pares, Barros, segundo alguns deputados e servidores ligados ao bloco, tem o costume de deixá-los desconfortáveis ou em alguma saia justa.
O congressista, contudo, possui a fama de ser um “bom estrategista” por estes mesmos colegas do Centrão e, em especial, do PP, mas recentemente perdeu a confiança do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que atuou junto a interlocutores do Palácio do Planalto em maio deste ano na tentativa de tirar a liderança de Barros.
Recentemente, porém, Barros se viu no meio da maior crise vivida pela atual gestão, sob a acusação de ter interferido na compra bilionária do Ministério da Saúde para a aquisição das vacinas Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech, por meio da representante brasileira Precisa Medicamentos.
A citação explícita de Barros no depoimento dos irmãos Miranda na última sexta-feira (25) à CPI da Covid, porém, já era esperada pelo Centrão, que já sabia quem era o parlamentar mencionado pelo deputado Luis Miranda (DEM-DF) em entrevista à CNN Brasil. Miranda disse que um colega da Câmara foi citado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em um encontro em que informou sobre possíveis irregularidades na compra do imunizante.
Na quarta-feira (30), a CPI da Covid aprovou a convocação de Ricardo Barros para a semana que vem. Três requerimentos (de nº 960/21, nº 976/21 e nº 977/21) foram apreciados pelo colegiado.
Pela característica corporativista do Centrão, o bloco deve esperar o transcorrer dos trabalhos da CPI da Covid para tomar alguma decisão contra Barros.
A carreira política de Ricardo Barros deu um salto graças ao seu apoio ao impeachment de Dilma Rousseff (PT), ocorrido em 2016. A atuação do paranaense, que integrava a ala do PP contrária à gestão petista, levou o deputado a ser contemplado com o Ministério da Saúde na gestão seguinte, de Michel Temer (MDB).
Antes de assumir a pasta, o congressista oriundo de Maringá (PR), que é empresário na área da construção civil na cidade, foi relator do Orçamento de 2016, responsável por um corte de R$ 10 bilhões no programa Bolsa Família.
Enquanto ocupava o principal cargo da Saúde, ficou conhecido como “ministro da doença” após tentar cortar recursos do SUS (Sistema Único de Saúde) e defender o interesse de planos privados de saúde.
Ele também teve o nome associado a um escândalo de compra de medicamentos sem eficácia para o tratamento de câncer. A droga, intitulada Leuginase, chegou a ser distribuída a crianças mesmo com proibição expressa do juiz do Distrito Federal Rolando Spanholo, assinada em 24 de setembro de 2017.
Dez dias antes, o MPF havia mandado uma recomendação para que o ministério suspendesse a distribuição do remédio, que, segundo especialistas ouvidos pelo órgão, traz sérios riscos à saúde dos pacientes. O documento, assinado pelas procuradoras Eliana Pires Rocha e Ana Carolina Roma, enfatiza que o medicamento não possui estudos clínicos que comprovem sua eficácia e segurança.
Segundo reportagem do Fantástico, da TV Globo, investigações apontaram indícios de superfaturamento na compra da Leuginase, havendo, inclusive, suspeita de envolvimento de uma empresa de fachada com sede no Uruguai.
Procurado, o parlamentar disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que “não houve irregularidades neste contrato”, e que “a compra foi realizada e o medicamento tem apresentado desempenho superior ao (remédio que antes era fornecido pelo ministério) Medac, com menos efeitos adversos nas crianças”.
O parlamentar também é acusado de improbidade administrativa pelo MPF (Ministério Público Federal) por ter supostamente favorecido, enquanto ministro, a Global Saúde na compra de medicamentos para o tratamento de doenças raras pela pasta. A empresa é sócia da Precisa, responsável pela Covaxin no Brasil.
Por meio de nota, Barros também informou que, “embora a Global seja sócia da Precisa Medicamentos, em análise pela CPI, o processo do MPF em nada se relaciona com a aquisição de vacinas da Covaxin”. Ele também afirmou que, “não participou de qualquer negociação para a compra desse produto (vacina)”.
Em uma denúncia feita dois anos antes pelo Ministério Público do Paraná, o deputado chegou a ser citado como o responsável por “orientar” o então secretário de Saneamento de Maringá a negociar a licitação de contratação de agências de publicidade que acontecia na prefeitura. O gestor à época era o irmão dele, Silvio Barros, também do PP. O processo, porém, está suspenso para julgamento sobre a licitude ou não das provas coletadas.
Segundo o parlamentar, o processo resume-se a “acusações infundadas com a finalidade de gerar desgaste político”. “Foram oito anos de investigações sem encontrar provas. Não houve qualquer interferência, tentativa de interferência na licitação e muito menos dano ao erário”, disse.
Sobre as acusações feitas pelos irmãos Miranda, o congressista informou que “não há dados concretos ou mesmo acusações objetivas” nas falas deles.
Desde 2020, quando Bolsonaro melhorou a relação com o Legislativo, o deputado se aproximou da ala militar do governo e do próprio presidente, com quem tem familiaridade nas pautas de costumes.
Enquanto ministro, o agora deputado chamou a atenção da mídia ao dizer que queria envolver as igrejas nas discussões sobre o aborto. Em um outro momento, Barros também afirmou que homens não procuram tanto atendimento médico quanto as mulheres por terem “menos tempo” e porque “trabalham mais” sendo os “provedores” das famílias.
Atuante na área da Saúde, o agora líder do governo também voltou a ser cotado para o ministério após a saída do general Eduardo Pazuello do comando da pasta. No entanto, a vaga foi preenchida pelo médico Marcelo Queiroga.
O ex-ministro também tem outros familiares com atuação na política. A mulher dele, Aparecida Borghetti, por exemplo, foi governadora do Paraná e, recentemente, foi nomeada para o Conselho de Administração da Itaipu Binacional por Bolsonaro, onde recebe um salário de R$ 27 mil. Já a filha do deputado, Maria Victória, é deputada estadual pelo PP.
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