Grupo de mulheres da política se reúne por pautas feministas e antirracistas

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Foto: Marlene Bergamo/Folhapress

A hesitação que ronda a discussão sobre a descriminalização do aborto no Congresso passou longe da casa da ex-senadora e ex-prefeita Marta Suplicy nesta sexta-feira (28), em São Paulo.

O tema foi debatido abertamente em um encontro promovido pela ex-petista com cerca de 30 líderes políticas, ativistas, personalidades, intelectuais e escritoras —todas mulheres—, com o objetivo traçado por Marta de estimular a inclusão de propostas para a mulher nas campanhas à Presidência.

A reunião, que começou pela manhã e se estenderá até o fim da tarde, deve resultar em uma carta aberta com proposições de políticas com recortes de gênero e de raça para as eleições deste ano.

Cada convidada recebeu a tarefa de apresentar sugestões que poderão ser incorporadas ao documento e a um site que será lançado. Marta, que apoia Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou que a iniciativa tem caráter suprapartidário e será direcionada a todas as campanhas do chamado campo democrático.

A presidenciável Simone Tebet (MDB) foi uma das que compareceram. Também estiveram no evento a ministra do Supremo Cármen Lúcia, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, a professora Ana Estela Haddad (PT-SP) e a socióloga Maria Alice Setubal (Neca).

Discursando sobre a questão da interrupção da gravidez, a presidente da OAB-SP, Patricia Vanzolini disse que essa “é uma questão que tem que estar na pauta, não pode ser um tabu. Ela não pode ser uma lepra política que nenhum político se atreve a tocar a mão porque imediatamente perderá votos”.

Vanzolini destacou que as previsões de aborto legal no Brasil, em casos de estupro, risco à vida da mãe e anencefalia, não são asseguradas a todas as mulheres. “Nós já temos uma lei muito restritiva e que não é respeitada. Quando uma mulher é estuprada e vai a um [hospital] Pérola Byington, ela tem que passar por uma junta que vai avaliar se ela foi estuprada ou não”, disse.

“A gente vive um momento no Brasil em que a gente não pode falar sobre o aborto, e isso é um grande problema. A gente precisa falar sobre os nossos direitos reprodutivos”, disse a escritora e diretora-executiva da Casa Sueli Carneiro, Bianca Santana, sob aplausos.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) 442, que pede a descriminalização da interrupção voluntária da gestação até a 12ª semana, foi lembrada durante o encontro. Protocolada no STF (Supremo Tribunal Federal) pelo PSOL em 2017, a ação não tem previsão de vir a julgamento.

“A gente precisa pensar nisso não só em termos da ADPF, mas da implicação que isso tem para as mulheres, para a sociedade”, afirmou a advogada criminalista Cecília Pereira de Mello.

“O aborto necessita urgentemente de um novo olhar do poder público. Precisa ser compreendido como um direito, ser aceito como uma decisão de foro íntimo de quem o escolhe e, principalmente, ser tratado como problema de saúde pública, que tem natureza universal e se insere dentro do espectro do dever estatal”, disse Mello.

A descriminalização e a regulamentação do aborto estão sendo consideradas para constar na versão final da carta.

As convidadas de Marta fizeram teste de Covid-19 ainda na entrada do prédio da ex-senadora, hoje secretária municipal de Relações Internacionais de São Paulo. Elas tinham à sua disposição álcool em gel, antibactericida em spray e máscaras dos padrões PFF2 e KN95 oferecidas em uma bandeja de prata.

Todas as participantes mantiveram a máscara no rosto enquanto discursavam.

A lista de presenças teve ainda debatedoras como: a diretora do Instituto Marielle Franco, Anielle Franco, a líder do Movimento dos Sem-Teto do Centro, Carmen Silva, a artista e ativista Preta Ferreira, a advogada Sheila de Carvalho, a secretária municipal de Cultura de São Paulo, Aline Torres, a especialista em educação Claudia Costin, a escritora e roteirista Tati Bernardi e a jornalista Mariliz Pereira Jorge —as três últimas são também colunistas da Folha.

Ilustração criada para o encontro com mulheres promovido por Marta Suplicy sobre as eleições 2022.

As convidadas eram convidadas a apresentar suas propostas por ordem alfabética. “Eu me pulei, então vou ter que ser rápida”, brincou Marta Suplicy, ao perceber que não tinha se pronunciado quando chegou a vez da letra “M”.

A ex-prefeita propôs políticas de Estado para combater o racismo estrutural e para promover a discussão sobre gênero e combate a preconceitos contra mulheres, negros, indígenas e pessoas com deficiência nas escolas, além de paridade em lista de escolha de candidaturas.

O documento final da carta aberta deverá dar grande destaque à bandeira antirracista e em defesa de políticas para mulheres negras. “É importante reconhecer o racismo e o machismo como fatores estruturantes da desigualdade no país”, afirmou Anielle Franco.

Propostas para o sistema prisional também foram abordadas no âmbito da pauta racial. A atriz, cantora e ativista Preta Ferreira afirmou que os presídios do país estão repletos de corpos negros, e que é preciso olhar para eles.

“Tem mulher que usa pedaço de colchão porque não tem absorvente. A pobreza menstrual é devastadora, é imensa”, disse Preta sobre o interior das prisões.

Ao menos cinco das mulheres sondadas informaram que não poderiam estar presencialmente no encontro, mas mandaram suas contribuições para o debate. Entre elas, a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) e a filósofa Djamila Ribeiro.

A ministra do Supremo Tribunal Federal Cármen Lúcia, que era aguardada com grande expectativa desde o início do encontro, chegou ao local por volta das 13h. “Eu achei que já estava tudo resolvido”, brincou sobre a conclusão das discussões. A magistrada carregava consigo um exemplar da Constituição.

“Acho muito importante que a gente exteriorize, com certeza sem raiva, mas com muita ciência, que nós estamos vivendo num mundo e no Brasil, especificamente, de muitas violências”, afirmou. “Não pode haver a experiência democrática convivendo com a violência”, seguiu.

A ministra disse que é preciso sensibilizar a sociedade para o fato de que há agressões que se dão em contextos específicos. “A violência praticada contra um homem é grave porque toda forma de violência é grave. Contra o animal idem, contra o meio ambiente idem. Mas a violência que se pratica contra a mulher tem uma carga de agressão e de ofensa que parecem culturalmente plantadas nas pessoas”, afirmou.

Cármen Lúcia ainda destacou o aumento nas denúncias de violência doméstica durante a pandemia da Covid-19 e disse que o país já tem boas leis formuladas, mas carece que elas sejam colocadas em prática. “A Lei Maria da Penha é ótima, mas não foi integralmente aplicada até hoje”, disse.

Simone Tebet, única mulher na disputa pela Presidência da República, foi também a única presidenciável a comparecer à casa de Marta. A emedebista, que a princípio não seria chamada por estar concorrendo, foi convidada por sua atuação como senadora e por seu envolvimento na causa feminina.

“Eu vim aqui como senadora”, destacou Tebet no início de sua fala. Ela defendeu que quem presidir o país pelos próximos anos seja pressionado a não patrocinar nem apresentar ao Congresso projeto ou medida provisória que resulte em retrocesso ao combate à violência contra a mulher e à busca por igualdade de gênero.

“Existem bons projetos dentro do Congresso nacional. Ou [o texto] para na Câmara, ou para no Senado. Ou, quando é aprovado, é vetado pelo presidente da República”, disse a senadora.

A presidenciável ainda prestou homenagem à anfitriã da reunião. “Sou discípula de Marta Suplicy”, afirmou Tebet, em referência ao histórico da ex-senadora como ativista feminista e pioneira no debate público sobre questões como pílula anticoncepcional e libertação das mulheres.

“O meu nome é Simone graças a Simone de Beauvoir, porque a mulher não nasce mulher, ela se torna mulher. Eu comecei a entender o que é isso ainda jovem, assistindo à Marta na televisão falando naquele momento sobre sexo, que era um verdadeiro tabu para a nossa geração”, seguiu Tebet.

Marta também foi homenageada pela presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann (PR). “Eu tive duas pessoas que foram fundamentais na minha formação, na caminhada feminista: Rose Marie Muraro e Marta Suplicy. Minha formação toda foi com essas mulheres que eu tenho referência.”

“Queria cumprimentar a nossa querida Simone, senadora, com quem tive o prazer de conviver. É muito importante você pôr a sua candidatura. Nós estamos em campos diferentes, mas acho fundamental a presença das mulheres na disputa política”, emendou Gleisi.

A deputada petista celebrou a criação da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e disse que muitas das políticas implementadas pelo ex-presidente podem ser aprimoradas nos próximos anos.

“A gente tinha plano na educação, na saúde, de crédito, acho que isso foi muito importante”, afirmou.

“Nós tivemos a experiência com o plano nacional de alimentação escolar, em que o Estado compra a alimentação escolar do pequeno agricultor. Isso é plenamente possível fazer com as mulheres, o Estado consome muito, seja na educação, na saúde, na assistência social. Do ponto de vista do empreendedorismo feminino, seria fantástico”, disse Gleisi.

Folha  

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