Lula participará de ato pela democracia
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) participarão da leitura de um manifesto em defesa da democracia na Universidade de São Paulo em 15 de agosto, data de retorno das aulas.
Trata-se de de documento elaborado pelo coletivo USP Pela Democracia, formado por professores, estudantes e servidores da USP, diferente do que será lido no Largo de São Francisco na quinta-feira (11). O manifesto pode ser lido na íntegra abaixo.
Intitulado “A democracia no Brasil corre risco. Basta”, o texto conta com assinaturas de figuras como Marilena Chauí, Paulo Arantes, Ermínia Maricato, José de Souza Martins, Olgária Matos, Fernando Novais, João Adolfo Hansen, entre outros.
O evento contará também com uma aula pública ministrada por Chauí e Maricato, professoras da universidade, e acontecerá no vão do prédio de História e Geografia da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas).
Nesta segunda-feira (8), membros da campanha de Lula estiveram no local para analisar as condições de circulação e de segurança.
Em um jantar em 29 de junho, na casa de Haddad, o presidenciável interessou-se por relatos a respeito de mudanças na USP, que teria se tornado mais progressista desde o surgimento da lei de cotas. Ele então teria manifestado vontade de participar de uma atividade na universidade.
O vice de Lula, Geraldo Alckmin (PSB), também participou do encontro, que teve a presença do reitor da USP, Carlos Carlotti Júnior.
A democracia no Brasil corre risco. Basta.
Por esta razão nós, docentes, servidores técnico-administrativos e estudantes da Universidade de São Paulo, propomos ampliar o debate sobre as incertezas e apreensões da conjuntura política afirmando, como exigência democrática, a necessidade de que os direitos sociais declarados na Constituição de 1988 devam ser respeitados e devidamente concretizados. As próximas eleições serão decisivas para o destino de nosso país, num momento em que as desigualdades sociais se aprofundam em ritmo acelerado e que a violência contra as populações vulnerabilizadas tornou-se rotineira e assustadoramente naturalizada.
Em janeiro de 1959, professores e professoras, sentindo-se “mais uma vez convocados”, escreveram um texto histórico a favor do direito à educação pública e de qualidade, referido na epígrafe deste documento. Hoje também nos sentimos mais uma vez convocados: a Democracia no Brasil corre risco!
E corre risco porque o passado autoritário parece não ter passado de todo, quando torturadores permanecem impunes por seus crimes e ainda são elogiados publicamente na “Casa do Povo”. Esse contrassenso, perpetrado por quem deveria proteger o Estado Democrático de Direito, abriu espaço para a emergência de situações de instabilidade jurídica, assim como para todo tipo de violação de direitos fundamentais. A partir daí avolumaram-se as fake news mais abjetas e arquitetaram-se práticas de lawfare, já utilizadas para o impeachment da presidenta Dilma Roussef, acontecimentos conjugados que deram início ao processo de desconstrução das instituições da República brasileira. As forças que representam o governo atual operam em favor dos interesses da necropolítica neoliberal em escala mundial; e, ao estimularem a expansão das milícias, a grilagem de terras dos povos originários e o garimpo ilegal, indicam a grave corrosão da soberania política interna. Etnocídio e ecocídio irreparáveis.
O desmonte das políticas de fomento à ciência e de preservação do patrimônio cultural comprometem o futuro das próximas gerações e as conquistas consolidadas nas últimas quatro décadas. O ataque neoliberal à educação pública, em que empresários se tornaram mentores de políticas educacionais, amplifica a ameaça contra a qual também se insurgiu o Manifesto de 1959. O negacionismo científico, associado ao anti-intelectualismo, tem sido a marca da ação e da omissão governamental, responsável pela morte (e também pelo deboche) de centenas de milhares de pessoas durante a pandemia do Covid-19. Todo esse quadro se agrava intensamente pela PEC 95 que congelou e definiu para o governo federal, por vinte anos, um teto de gastos com os direitos sociais, medida a exigir revogação imediata.
Como aqueles que tiveram sua liberdade cassada e sua expressão calada pela prisão nos anos de chumbo da ditadura, sentimo-nos na obrigação de reagir aos ataques à Universidade pública e ao Estado Democrático de Direito.
Conclamamos a comunidade da USP ao debate capaz de expressar nossa indignação diante das violações à democracia brasileira. É imperativo que a Universidade pública reafirme o seu compromisso com as políticas que enfrentam a desigualdade social e as discriminações, na defesa do ensino público, gratuito e de qualidade, assim como na manutenção dos programas de permanência e de ação afirmativa sócio-étnica e racial.
A democratização dos direitos implica, além disso, o fortalecimento da Educação Básica pública, que assegure a apropriação do conhecimento e o acesso de todos à Universidade. Esse acesso, no entanto, vem sendo inviabilizado pela nova Lei do Ensino Médio, a qual deve ser revogada. Na mesma direção, manifestamos nossa preocupação com a expansão dos programas de filantropização das creches, com a recente liberalização da educação domiciliar e a militarização das escolas públicas.
Nossa ação acadêmica deve se voltar ainda ao direito à cidade, à saúde, à moradia, à segurança pública, ao trabalho digno, à cultura, ao lazer – ao bem viver, em suma, fundamentos de uma sociedade plenamente democrática.
A Universidade abriga, como sabido, diversas tendências ideológicas e político-partidárias no seu interior. Mas o momento exige, de todas e todos, a grandeza de reconhecer, como dever moral e político inadiável, o agir em conjunto pela reconstrução da cidadania brasileira.
A democracia no Brasil está em risco. Basta.
Folha