Bolsonaro quer usar ação contra Dilma para se salvar no TSE

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Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vai argumentar que ele não teve direito à ampla defesa nem ao contraditório no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que terá início hoje e pode torná-lo inelegível até 2030. O advogado Tarcísio Vieira, que foi ministro da Corte, deve alegar que fatos novos, como a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, foram incluídos no processo sem que o ex-presidente tivesse tempo hábil para se defender. A inspiração é o julgamento que absolveu da cassação a chapa Dilma-Temer, em 2017.

No entorno do ex-presidente, o clima é de pessimismo. Ontem, à CNN Brasil, ele afirmou que é quase “unanimidade” que ele será condenado.

Movida pelo PDT, a ação trata de uma reunião na qual Bolsonaro convocou embaixadores para atacar sem provas o sistema eleitoral brasileiro, em julho de 2022. Nos últimos dias, Vieira foi ao TSE entregar em mãos aos ministros do TSE os memoriais da defesa — ontem, foi recebido pelo presidente da Corte, Alexandre de Moraes. O advogado do PDT, Walber Agra, também fez o mesmo com as peças da acusação.

Na visão da defesa do ex-presidente, houve uma extrapolação na “causa de pedir” do processo — ou seja, o objeto central que motivou a ação. Em suma, o advogado deve argumentar que o encontro com os representantes estrangeiros não tem nenhuma relação com a minuta golpista e os ataques de 8 de janeiro.

A defesa deve trazer como exemplo o entendimento firmado no TSE no julgamento sobre a chapa Dilma-Temer, em junho de 2017. A Justiça Eleitoral absolveu a aliança entre Dilma Rousseff e Michel Temer dos crimes de abuso de poder político e econômico. Na época, a maioria dos ministros, incluindo Tarcísio Vieira, votou por não admitir as provas de caixa dois relatadas nas delações dos executivos da Odebrecht e de ex-marqueteiros do PT. Isso enfraqueceu a ação.

— A ação é exatamente igual à da chapa Dilma-Temer. Novos fatos foram apensados. A partir do momento que o TSE aproveitar a jurisprudência de 2017, por questão de coerência, a acusação se torna frágil — disse Bolsonaro ontem.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) repetiu a argumentação do pai e acrescentou outros dois termos jurídicos para defendê-lo — “fishing expedition” e “preclusão consumativa” —, que também devem vir à tona no julgamento.

O primeiro se dá quando instrumentos de investigação, como mandados de busca e apreensão, são utilizados de forma genérica para “pescar” uma prova que pode subsidiar uma futura acusação. É isso que os bolsonaristas alegam que aconteceu com a apreensão da minuta golpista na residência de Torres no âmbito do inquérito sobre o 8 de janeiro. O segundo argumento se refere à alegação de que foram anexadas novas provas na ação quando a fase processual reservada a isso já havia terminado.

Sob condição de anonimato, um ex-ministro do TSE e um advogado eleitoral consideraram frágil a estratégia da defesa de Bolsonaro de comparar o caso atual com o da chapa Dilma-Temer. Isso porque, em fevereiro, a Corte já decidiu por unanimidade incluir a minuta golpista na ação. Caberia agora apenas verificar se as provas são fortes ou não para condenar Bolsonaro.

No entendimento do relator do caso, o ministro Benedito Gonçalves, as provas foram consideradas válidas por terem relação com o contexto da reunião com os embaixadores. A acusação entende que a reunião com os diplomatas faz parte de uma estratégia de Bolsonaro para desacreditar as eleições de 2022.

— Não há como dar guarida à ideia de que a delimitação da “causa de pedir” provoca um recorte completo e irreversível, gerando um descolamento tal dos fatos em relação a seu contexto que chega a impedir o órgão judicante de levar em conta circunstâncias que gradativamente se tornem conhecidas ou potenciais desdobramentos das condutas em investigação — disse ele, no julgamento de fevereiro.

O Globo