Manifestações de junho de 2013 não produziram nada

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Foto: Pablo Jacob/

Marcadas pela pauta ampla e difusa, entoadas por matizes da direita à esquerda, as manifestações de junho de 2013 tiveram respostas pontuais em medidas do Executivo e do Legislativo, tanto na esfera federal quanto estadual e municipal, ao mesmo tempo que deram visibilidade a temas que desde então passaram a figurar no centro do debate político nacional. No longo prazo, porém, boa parte das suas reivindicações ficaram pelo caminho.

Uma das principais mudanças acatadas pela classe política, sob pressão dos protestos pelo país, veio já naquele mês no preço do transporte público. Estopim dos atos de rua, o aumento das passagens de ônibus em R$ 0,20 foi rapidamente revertido nas principais capitais, como Rio e São Paulo, após reunião de integrantes do governo Dilma Rousseff (PT) com os prefeitos das duas cidades, respectivamente, Eduardo Paes e Fernando Haddad.

Levantada pelo Movimento Passe Livre (MPL), a pauta brecou a aplicação do reajuste naquele ano, mas não impediu a correção do valor nos anos seguintes — a avaliação leva em consideração as oscilações nos preços dos combustíveis, correções salariais de funcionários e renovação de frota, por exemplo, que podem variar ano a ano. Em São Paulo, a tarifa de ônibus custa R$ 4,30, mesmo valor cobrado no Rio de Janeiro. Há dez anos, o valor era de R$ 2,75 na capital fluminense, quando foi anunciado um aumento de também R$ 0,20. Já em Salvador, onde a passagem era de R$ 2,80 à época, hoje os soteropolitanos pagam R$ 4,90. Todas as correções, porém, foram abaixo da inflação acumulada no período, de 79,8%.

Por outro lado, em Belo Horizonte, onde manifestantes foram às ruas questionar uma correção de R$ 2,65 para R$ 2,80 na passagem, a discussão hoje é aumentar ou não o valor para R$ 6,90 — bem acima da atualização pela inflação, que levaria a passagem a R$ 5,04.

A demanda pelo passe livre estudantil, que garantisse a gratuidade em transporte público coletivo a estudantes dos ensinos fundamental, médio e superior, também apareceu nas ruas em 2013. No final de junho daquele ano, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AM), propôs um projeto de lei que determinava a criação de um passe livre estudantil.

O texto chegou a receber emendas de comissões no começo de 2014, mas não avançou. Alguns estados implementaram a medida, como São Paulo, Goiás, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, além do Distrito Federal, mas não há uma legislação nacional que determine a aplicação em todo o território.

Apesar disso, a pauta do passe livre, trazida nos protestos, entrou na agenda de prefeituras e passou a ser adotada pelo país. Ao menos 74 municípios mantém a tarifa zero no sistema de transporte, de acordo com dados de março da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). A maioria é formada por cidades de pequeno porte. Dez anos depois, o tema também é discutido pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), de olho na sua campanha à reeleição no próximo ano.

Outro tema presente nos protestos e que mobilizou a agenda legislativa foi a bandeira anticorrupção. No Congresso Nacional, o período marcou a aprovação e o arquivamento de uma série de medidas. O principal nessa seara foi o arquivamento da PEC 37, de 2011, que restringia a atuação do Ministério Público em investigações. A proposta, que estampou cartazes nas ruas e se tornou foco de desgaste para os parlamentares, chegou a tramitar em comissões da Câmara, mas não avançou. Depois dessa proposta, não houve outra articulação similar para alterar as competências do órgão.

Em outra frente, o Senado aprovou um projeto que torna a corrupção ativa e passiva crimes hediondos, ainda em tramitação na Câmara. As duas Casas aprovaram também a chamada PEC do voto aberto, que aboliu a votação secreta nos processos de cassação de colegas.

Em meio às demandas de manifestantes por uma saúde e uma educação “padrão Fifa”, referência à Copa do Mundo que seria realizada no país em 2014, o Congresso aprovou ainda, em junho de 2013, uma lei para destinar 75% dos royalties do petróleo para educação e 25% para a saúde. Na época, Dilma reconheceu que as manifestações criaram um ambiente político que “ajudou muito” na aprovação. O governo também reagiu com a criação do programa Mais Médicos, um mês após o início dos atos. Após mudar de nome no governo Jair Bolsonaro, o programa voltou a ganhar protagonismo como bandeira do governo Lula.

O Globo