Haddad fecha acordo com Centrão

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Foto: Divulgação/Diogo Zacarias

Ao abrir o gabinete para receber parlamentares e participar das reuniões de líderes, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), se aproximou do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ampliou o capital político e protagonizou o caminho para a formação de uma possível base aliada no Congresso, com adesão do centrão.

Haddad recebeu uma missão crucial para o governo Lula dar certo, logo após a posse do presidente. A avaliação era que somente com a economia voltando a crescer haveria sucesso na gestão petista.

A prioridade era emplacar propostas econômicas no Congresso. Seria necessário aprovar novas regras para gastos, aumentar o caixa com a volta do voto de qualidade do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) — ou seja, em casos de empate, o presidente do colegiado deve desempatar — e a reforma tributária.

Projetos importantes avançaram no Congresso, mas não foram totalmente aprovados. O novo arcabouço fiscal já foi aprovado na Câmara, mas senadores fizeram alterações e os deputados analisarão as mudanças na volta do recesso. Tanto a reforma tributária como o Carf já saíram da Câmara e ainda devem ser analisados pelo Senado.

Durante as negociações para a reforma tributária, o governo Lula liberou valor recorde em emendas parlamentares: R$ 7,5 bilhões em dois dias. Só o PL, partido do ex-presidente de Jair Bolsonaro, ganhou R$ 699,8 milhões. O PP, de Lira, recebeu R$ 660 mi e o PSD, terceiro partido que levou mais recursos, ganhou R$ 611,2 milhões.

Ativou o modo de “escuta”. O cortejo de Haddad começou ainda na transição, quando o governo recém-eleito se empenhou para aprovar em dezembro a PEC (proposta de emenda à Constituição) que ampliou o teto de gastos por um ano.

Começou a articulação política enquanto ainda escolhia os nomes para integrar a pasta. Segundo aliados, Haddad se dividia entre o CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) e as residências oficiais da Câmara e do Senado.

Dividiu os louros com deputados, o que foi apontado como primeiro acerto. Após a aprovação da emenda que garantiu o pagamento de R$ 600 para o Bolsa Família, Haddad agradeceu a deputados que ajudaram a costurar a votação e frisou em mensagens se tratar de “vitória compartilhada” — gesto considerado o pontapé para estreitar a relação.

Tomou iniciativa de ir a campo para atuar na parte política. Durante tratativas pelas propostas econômicas, ele agiu na negociação enquanto secretários e assessores da Fazenda trabalhavam nos textos.

Barganhou por conta própria com o centrão. Haddad deixou para trás a fama de não ser um bom articulador e acabou conhecido como “cumpridor de acordos”. Isso aconteceu principalmente quando houve um “gargalo” na ala da articulação política do Planalto, alvo de críticas.

Negociou com Lira e líderes partidários. Na votação do Carf, funcionários da Fazenda já haviam desistido da aprovação do texto. Interlocutores contam que o clima era de pessimismo — até que Haddad foi à residência oficial do presidente da Câmara negociar com Lira e com os líderes partidários.

Comemorou aprovação da reforma em aeroporto. Quando começou a votação da reforma tributária, o ministro da Fazenda estava sem sinal, em voo, rumo a São Paulo. Só soube da aprovação quando chegou. De acordo com aliados, a vitória foi comemorada em solo paulista, com muita interação no WhatsApp.

As conversas entre técnicos do governo e da Câmara sobre a reforma tributária tomavam toda a semana do ministro. Às segundas-feiras, Haddad se reunia com as lideranças para tomar decisões políticas em pontos que os assessores divergiam.

Em alguns casos, ele foi contra os pareceres de técnicos do governo. Secretário da Reforma, Bernardo Appy não queria que houvesse mais de uma alíquota. Os deputados não aceitavam que educação, saúde e transporte pagassem o mesmo imposto que o restante dos setores.

Haddad considerou a posição dos parlamentares correta e autorizou percentual diferente. Avaliar sugestões e ceder quando convencido fez o ministro da Fazenda ganhar pontos com deputados.

As aprovações de projetos econômicos só foram possíveis porque Haddad percebeu que a relação entre Executivo e Legislativo mudou, afirmou um deputado governista à reportagem.

Na avaliação dele, a Câmara não age mais como uma Casa carimbadora dos projetos do governo federal. Ou seja, o Planalto apresenta “parâmetros”, mas a proposta é construída pelos parlamentares — sobretudo do centrão, que integram a maioria das bancadas.

Além de Haddad, a ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), também é citada como um destaque na relação com o Congresso.

A frequência dos encontros ajudou na quebra do gelo existente por causa das resistências do centrão, sobretudo no início do governo Lula.

Deputados ganhavam chá de cadeira na sala do ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT). O presidente falava em cancelar privatizações e mudar o Marco do Saneamento, medidas feitas no governo passado com aval dos deputados.

Haddad marcou posição fazendo o contrário e mostrando disposição para conversar. Um deputado conta que é normal a área econômica ter interlocução com deputados, mas lembra que na época de Jair Bolsonaro (PL) era diferente.

O então ministro da Economia, Paulo Guedes, enviava assessores e era refratário a mudanças sugeridas no Congresso. O líder do PSD na Câmara, o deputado Antonio Brito (BA), afirmou que o atual ministro tem postura diferente: “O Haddad é outra coisa”.

Passado o primeiro semestre, Haddad avançou em reconhecimento. Pesquisa divulgada pela Quaest semana passada mostrou que 78% das menções a Haddad nas redes sociais foram positivas. No primeiro levantamento, o índice ficou em 10%.

Um deputado governista afirmou à reportagem que o “casamento” do centrão com o Planalto tinha como requisitos básicos: ceder ministérios, cargos de segundo e terceiro escalão e liberar emendas a deputados do bloco.

A costura política para a eventual formação da base aliada se deu em paralelo às conversas com Haddad — e foram feitas com os ministros palacianos.

Mas ainda que essa união não tenha sido celebrada com Haddad, a aproximação do ministro com Lira mostrou que é possível uma relação de confiança do governo com o centrão, segundo relatos de aliados de Lula.

Um deputado petista que conversou com o UOL declarou que a economia ajudou Haddad e no casamento com o centrão. A inflação em junho foi de – 0,08%, existem elementos para queda dos juros e a retomada econômica é uma possibilidade palpável.

Isto significa expectativa de aumento da popularidade do governo, o que se traduziria em votos nas eleições do ano que vem.

Uol