Julgamento do aborto vai virar espetáculo
Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou o julgamento da ação que discute a descriminalização do aborto no Brasil. À 0h desta sexta-feira (22/9), a ação entrou em plenário virtual e seria apreciada até 29 de setembro, mas houve um pedido de destaque por parte do ministro Luís Roberto Barroso. Assim, a votação vai a plenário presencial.
Ainda não há data para essa votação presencial acontecer. Antes de Barroso, a primeira a votar foi a ministra Rosa Weber, relatora do caso, desde 2017. E ela votou pela descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.
Em seu voto, Weber citou decisões mundo afora sobre o assunto. Segundo ela, existem a proteção dos direitos futuros do nascituro, mas que, para o direito civil, essa definição clara do que é vida não existe.
“Dar ao direito à vida interpretação no sentido de conferir-lhe proteção absoluta desde o momento da concepção implicaria reconhecer a proibição de qualquer hipótese de interrupção da gestação (em casos de aborto, por exemplo), a despeito da finalidade ou da necessidade de tutela de outro direito ou bem jurídico”, explicou.
A ministra apontou que entende a dignidade humana do feto, no sentido da moral, e que esse conceito é compartilhado pela sociedade. “Mas a moralidade majoritária da sociedade encontra limites na ordem constitucional frente aos direitos e liberdades fundamentais”, na opinião de Rosa Weber, que destacou ainda que o aborto, nesse caso, é um problema de saúde pública.
“É convergente em classificar o aborto como um problema de saúde pública das mulheres, notadamente considerando que o aborto inseguro é uma das quatro causas diretas da mortalidade materna”, exemplificou. “Com efeito, a criminalização do ato não se mostra como política estatal adequada para dirimir os problemas que envolvem o aborto, como apontam as estatísticas e corroboraram os aportes informacionais produzidos na audiência pública”, continuou, antes de votar contra a criminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.
Weber pautou o julgamento dias antes de sua aposentadoria para que possa dar seu parecer. A discussão é dentro de ação do PSol que pede a legalidade da interrupção da gravidez com consentimento da gestante até a 12ª semana de gestação, sem que a prática seja considerada crime.
Hoje, o aborto é autorizado no Brasil em três situações: se houver risco de morte para a mulher por causa da gestação; se a gravidez foi provocada por estupro; e se o feto é anencéfalo (sem cérebro). Nos demais casos, a gestante que realiza aborto terá de cumprir pena de 3 a 10 anos, em casos sem consentimento.
De acordo com o PSol, a norma citada nos artigos 124 e 126 do Código Penal de 1940 viola preceitos fundamentais da dignidade da pessoa humana, da cidadania, da não discriminação, da inviolabilidade da vida, da liberdade, da igualdade, da proibição de tortura ou tratamento desumano ou degradante, da saúde, entre outros.
Com um calendário apertado até sua aposentadoria, no fim deste mês de setembro, Rosa Weber não abrirá mão de votar em ações que considera de suma importância. Esta é uma delas. O caso vai a julgamento, e a presidente da Corte pode proferir seu voto, mesmo que o Supremo não dê prosseguimento à análise. Assim, fica registrado o posicionamento.
Em 2016, a Primeira turma do STF considerou que a criminalização do aborto no 1º trimestre da gestação viola diversos direitos fundamentais das mulheres. Entre eles, a autonomia, a integridade física e psíquica, a igualdade de gênero e os direitos sexuais e reprodutivos.
Dois anos depois, instituições foram convocadas para debater o assunto. Foram dois dias ouvindo 60 especialistas do Brasil e do exterior, entre eles pesquisadores de diversas áreas, profissionais da área de saúde, juristas, advogados e representantes de organizações da sociedade civil de defesa dos Direitos Humanos e entidades de natureza religiosa.
Entidades ligadas à religião entraram com o pedido contra a análise da APDF por entender que o plenário virtual não seria a via correta de análise.
A Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure) pediu nulidade regimental da ADPF 442 por considerar que a prática fere o princípio da publicidade.