Cartilha de Temer explicando golpe aos EUA é derrota golpista
A embaixada do Brasil em Washington vai lançar nas próximas semanas uma cartilha sobre a transição política e econômica do Brasil. Segundo apurou a Folha de São Paulo, serão distribuídos 3.000 exemplares a políticos, empresários, think tanks, congressistas e jornalistas”.
O ministério pilotado por José Serra afirma que a iniciativa será para “explicar a formadores de opinião americanos o que o Brasil está fazendo para sair da crise econômica, e como se deu o impeachment da presidente Dilma Rousseff”.
O que o Brasil está (ou não) fazendo para sair da crise econômica é uma coisa, mas explicar “como se deu o impeachment” é coisa muito diferente, pois ações para alegadamente o governo Temer tirar o Brasil da crise são atos concretos que podem ser apenas relatados, mas o impeachment envolve questões puramente políticas, idiossincráticas.
Com efeito, qualquer diplomata que vier a ler a cartilha dos inimigos do governo derrubado certamente conhecerá apenas um lado da moeda. O que se prevê é que dinheiro público será usado em benefício político de tucanos e peemedebistas.
O Itamaraty diz que um dos objetivos da cartilha é “deixar os investidores estrangeiros mais tranquilos e aumentar seu interesse no programa brasileiro de concessões de infraestrutura”. Segundo Temer, o Brasil, agora, teria “estabilidade política”, qualidade atrativa ao investimento.
Como Temer pode falar em “estabilidade política” se, em breve, o Tribunal Superior Eleitoral poderá tirá-lo da Presidência? E as investigações contra ele na Lava Jato? Um presidente ameaçado de sofrer processo penal tem “estabilidade política”?
Além dos problemas do governo de plantão, ele tem que se preocupar em não ser derrubado em um país que já relativiza ao extremo o voto popular ao cassar o segundo presidente em pouco mais de vinte anos – nos EUA, em toda história, só Nixon renunciou para não ser cassado, nos anos 1970.
E Temer não terá do que reclamar se for golpeado, pois será consequência do próprio golpismo.
Ainda sobre a cartilha ilegal que o governo quer distribuir nos EUA, ao listar áreas onde o governo oferecerá concessões Temer vai dizer que o Brasil está disposto a ajustar o marco regulatório como quiserem os estrangeiros.
É a direita descalçando os sapatos para os gringos, bem próprio de um Itamaraty tucano, como o dos tempos de Celso Lafer.
Haverá também versão digital da cartilha. O custo, segundo o embaixador brasileiro, Sergio Amaral, não vai passar de US$ 5.000.
O problema não é o custo. O problema é o uso do Itamaraty para fazer política partidária e para defender um processo ilegal ao custo de mentiras.
“É importante reforçarmos a comunicação no exterior, as pessoas estão interessadas sobre o que vai acontecer no Brasil”, diz o embaixador Sergio Amaral, de um governo que em larga medida reedita o governo FHC, ao menos em nomes e ideologia.
Segundo a Folha, estarão listadas na cartilha tabelas com indicadores do país apresentadas pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em suas palestras a investidores. Foram tomadas ainda outras medidas para reforçar a credibilidade do Brasil.
O que quer dizer isso? Ninguém sabe, mas esse é outro item que, à semelhança da “explicação do impeachment”, vai ter que ser analisada com lupa.
O jornalão antipetista diz também que “fontes do governo e do Congresso americano disseram à Folha que o impeachment não é mais uma preocupação, embora alguns setores do mundo acadêmico mantenham suas críticas ao processo. Mas a economia e as investigações de corrupção despertam muita inquietação”.
Uau! Então são só “alguns setores do mundo acadêmico” que mantêm “críticas ao processo”. A tradução disso é a de que os setores mais informados e preparados da maior potência mundial não têm dúvidas de que houve um golpe no Brasil.
Aliás, a necessidade de essa cartilha ser confeccionada é também reconhecimento tácito de que a comunidade internacional tem outra visão sobre o que ocorreu no país.
Um governo sempre teve e sempre terá todas as condições de dar grande publicidade aos seus pontos de vista, à sua versão dos fatos. Após seis meses ocupando ilegalmente um cargo que é de Dilma Rousseff até 1º de janeiro de 2019, Temer perdeu a guerra da comunicação no exterior.
Ganhou no Brasil, mas perdeu no exterior.
Na versão edulcorada da Folha, “a aprovação do teto de gastos foi recebida de forma positiva, mas integrantes do setor privado e governo se mantêm em compasso de espera, querem que o governo brasileiro consiga aprovar outras reformas que ajudem a pôr a dívida do país em trajetória sustentável”.
Toda essa conversa mole neoliberal procura restringir a situação do Brasil à sua capacidade de espancar seu povo com este conformado e votando nos espancadores. Até os postes de Wall Street sabem que não é assim que a banda toca.
A instabilidade política continua e os planos de tirar direitos dos brasileiros e piorar serviços públicos preocupam, sim, os países centrais porque sabem que após um novo arrocho da direita a população se voltará para a esquerda de uma forma ou de outra.
Como, no caso, o bem é feito em pequenas doses e o mal vai ser feito de uma só vez, não deve demorar muito para a população brasileira se dar conta de que foi vítima de um engodo – foi jogada contra o governo que lhe melhorava a vida para dar lugar a quem tira de pobre pra dar pra rico.
Enquanto isso, como por enquanto vai ser difícil furar o bloqueio da mídia no Brasil, há que continuar denunciando ao mundo o golpe e os atos consecutivos de arbítrio contra opositores do regime, como a perseguição a Lula. Só o que impedirá mais endurecimento do regime será denunciação internacional.
Nesse contexto, a correria de Temer pelo mundo para explicar o golpe, o alvoroço da direita com o acolhimento pela ONU da denúncia de Lula contra a Lava Jato, tudo isso constitui a única forma, no momento, de enfrentar ditadura que cassou o voto de 54 milhões e agora persegue opositores do regime.