Por pressão dos ruralistas, Bolsonaro revê fim da taxa sobre importação de leite em pó
Após forte reação da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o presidente Jair Bolsonaro orientou o Ministério da Economia a rever uma decisão anunciada na semana passada: o fim da cobrança de uma taxa extra que era cobrada sobre as importações de leite em pó da União Europeia e da Nova Zelândia. No entendimento dos ruralistas, a decisão vai acirrar a concorrência com o produto importado e levar a produção local ao “colapso”.
A área econômica ainda estuda que tratamento técnico dar à medida, publicada no Diário Oficial da União no último dia 5.
Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o presidente foi procurado por integrantes da base no Congresso, que reclamaram. Ele respondeu que havia sido surpreendido pela decisão.
A FPA tem perto de 250 parlamentares. Durante a campanha presidencial, o grupo foi decisivo para a consolidação do apoio do setor rural a Bolsonaro. Por liderar o movimento, a então presidente do grupo, deputada Tereza Cristina (DEM-MS), recebeu o comando do Ministério da Agricultura.
Na semana passada, ao comentar o fim da tarifa antidumping, um integrante da Frente, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), disse que essa medida “não ajuda” na construção de um ambiente positivo em relação a temas de interesse do governo no Congresso. Ele observou que o Congresso tem à frente discussões como o da Previdência do setor rural.
Já o presidente da FPA, deputado Alceu Moreira (MDB-RS), avaliou que os temas não se misturam.
A sobretaxa era cobrada sobre o leite em pó importado desde 2001 e se somava à tarifa já cobrada sobre o produto, que hoje é de 28%. No caso da Nova Zelândia, havia um adicional de 3,9%. Para o produto europeu, a sobretaxa era de 14,8%. Em ambos os casos, era uma taxação cobrada para compensar os efeitos do dumping, ou seja, da concorrência desleal praticada por esses países, ao vender para cá um produto abaixo de seu preço de custo, causando prejuízo à produção local.
A sobretaxa é revista a cada cinco anos e veio sendo sucessivamente prorrogada desde 2001. Porém, na revisão referente ao período 2012 a 2017, realizada ainda no governo de Michel Temer, o estudo técnico concluiu que não houve dumping. Pelo contrário, no período o Brasil não importou leite em pó da Nova Zelândia, o país mais competitivo do mundo nesse produto. E as compras da União Europeia foram na faixa de US$ 1.000 por dia, um valor considerado baixo. No total, o leite em pó importado contribui com 2,4% do consumo nacional.
Apesar dessas considerações técnicas, a reação do setor agrícola foi forte. A FPA emitiu nota dizendo que as consequências da decisão podem ser “intransponíveis”. Alceu Moreira disse ao Estadão/Broadcast que o setor pode “entrar em colapso” com a abertura do mercado. O Brasil possui 1,17 milhão de produtores de leite, a maioria deles agricultores familiares. O fim do antidumping está na pauta da reunião da Frente marcada para esta terça-feira.
A principal reclamação dos produtores de leite é a impossibilidade de competir com o produto importado. No caso do leite em pó europeu, eles apontam os subsídios pagos ao setor agrícola no bloco. “Não vamos concorrer com os produtores europeus, vamos concorrer com o Tesouro europeu”, apontou na semana passada o presidente da Comissão Nacional da Pecuária do Leite da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Alvim. “Vemos a medida com preocupação.”
Do Estadão