Minha dívida com José Dirceu
Vai se aproximando a hora de José Dirceu pagar a multa que a Justiça lhe impôs por conta da condenação que sofreu na ação penal 470, vulgo mensalão. Diante disso, tal qual outros petistas condenados ele optou por recorrer àqueles que sabem da dívida que este país tem consigo por ter lutado com tanto empenho pela restauração de nossa democracia.
A dívida dos brasileiros com o Zé, que já era grande antes de ele ter sido condenado em um processo cercado de inflexões políticas e de críticas de tantos e tão eminentes juristas, aumentou por conta da condenação injusta que sofreu.
Todavia, apesar de tantos de nós estarmos conscientes do papel ímpar que ele exerceu não só na redemocratização do Brasil, mas na luta política que culminou com a primeira eleição de um homem do povo para governar este país, diante de tantas “vaquinhas” que têm sido levadas ao público não posso pedir ainda mais.
Mas posso fazer algumas coisas pelo Zé, ainda que nada signifiquem diante da dívida que tenho consigo.
Uma das coisas que posso fazer é dar meu testemunho sobre ele. Nosso primeiro contato foi em 1998. À época, era deputado e, por uma razão que não me lembro, enviei-lhe um e-mail contendo considerações políticas. A partir dali, durante anos passamos a nos corresponder, ainda que de forma esparsa ao longo do tempo.
Fui conhecer o Zé pessoalmente só em 2009, em um evento qualquer da blogosfera. Ele já me conhecia pelo meu trabalho na internet, publicava meus artigos em seu blog, trocava e-mails comigo, mas nunca estivéramos frente a frente.
Deu-me, então, seu telefone e durante os anos seguintes passou a ser uma de minhas melhores fontes. Deu-me várias entrevistas exclusivas, várias informações em primeira mão e sempre me atendeu com a maior presteza e atenção, chegando a me receber em sua residência em São Paulo várias vezes.
O Zé, porém, nunca me pediu para defendê-lo, nunca me pediu para publicar nada e sempre se mostrou ciente do suplício a que seria submetido – ele nunca revelou publicamente, mas com sua impressionante visão política anteviu a própria condenação em um processo espúrio, o que acabou ocorrendo mesmo.
Esse é um fato que nunca comentei, mas que conheço desde bem antes de ele ser condenado.
O que sempre me impressionou no Zé, portanto, foi a sua serenidade diante do calvário que se avizinhava, a sua concentração na causa a que dedicou sua vida e pela qual tanto sofreu num passado remoto e agora, de novo. Eu lhe digo, então, leitor: esse homem é uma rocha.
Em uma das entrevistas exclusivas que me deu em sua residência, pouco após confidenciar que achava que seu caso estava perdido porque o Judiciário se agacharia para a mídia, falava-me de seus planos para quando terminasse de cumprir sua pena. Sim, ele sempre esteve disposto a não deixar a luta nem após ser supliciado com privação de liberdade.
Outra coisa que posso fazer pelo Zé, portanto, será colaborar com algum dinheiro para sua campanha de arrecadação para pagar sua multa com o STF. Não vou, no entanto, pedir a você, leitor, que faça o mesmo. Essa é uma decisão que deve tomar sozinho.
De minha parte, só posso dizer que me sinto em dívida com ele e que, apesar de não poder fazer uma doação maior do que algumas poucas centenas de reais, não me furtarei a dar essa contribuição. Nunca poderei pagar a dívida que contraí com esse homem por ter se disposto a enfrentar a máquina de moer gente da direita midiática.
Prisão, exílio, prisão. A história se repete com o Zé, mas ele jamais desistirá. Cumprirá pena de novo nas masmorras do Estado e prosseguirá lutando, segundo ele, até que seus pulmões deixem escapar seu último suspiro.
Como pagar por tanta devoção à democracia? Por certo não será com algumas centenas de reais, mas é o que posso fazer no momento.
Se por acaso alguém tiver a mesma visão que a minha sobre o Zé, seus amigos criaram um site como o de José Genoino. Lá serão encontradas as instruções para contribuir a fim de pagar uma multa de quase um milhão de reais. O endereço é http://apoiozedirceu.com/
Temo, porém, que a jogada suja de Gilmar Mendes ao fazer acusação às “vaquinhas” dos amigos de outros condenados do mensalão possa inibir alguém. Entretanto, se alguém estiver em dúvida sobre contribuir ou se tiver decidido não fazê-lo por medo de alguma retaliação, estará pagando com covardia a coragem que o Zé nos deu ao longo de sua vida.
Não se intimide. Se achar que ele merece, faça o que seu coração manda e de forma serena, com a consciência tranquila. Caso ceda ao medo, estará cedendo sua alma, trocando-a por uma paz que não virá, pois quando um cidadão teme agir de acordo com a própria vontade para não se arriscar a uma retaliação, tornou-se escravo do autoritarismo.