A coragem das mulheres

Crônica

No dia internacional da mulher, o texto praticamente se escreveu sozinho. Dentre tudo que as torna admiráveis, para quem, como eu, foi dado à luz por uma guerreira, Joanna Guimarães, que lutou sozinha para me criar – e sem apoio moral ou financeiro do marido, suportando o preconceito que vigia na metade do século passado contra mulheres separadas –, a coragem é o principal atributo do sexo “frágil”.

É da coragem comum às mulheres que vou tratar, então. Coragem que tem início quando dão à luz em meio a um nível de dor que qualquer médico poderá confirmar que dificilmente um homem suportaria sem desmaiar pelo que tem de lancinante e prolongada após meses e meses de desconforto incessante. O sexo “forte” seria reduzido a um bagaço após nove meses de gestação e um parto, mesmo sendo por cesariana.

Aqui entre nós, brasileiros, é possível encontrar uma vastidão de exemplos de mulheres guerreiras. Neste ano, aliás, a coragem feminina vem emoldurada por um simbolismo que beira o épico e o lírico. O Brasil está sendo governado por uma heroína de guerra, Dilma Vana Rousseff, que, aos 19 anos, enfrentou seres desprezíveis, menos do que homens, portadores de covardia tão exacerbada que foram capazes de torturar uma garota pouco mais do que adolescente.

Mas há outras. Marta Suplicy, por exemplo. Enfrentou toda a hipocrisia, todo o preconceito que sofrem as mulheres persistindo em sua carreira política, tendo sua vida íntima levada a jornais sem ética, sendo pintada como “devassa” por ter ousado separar-se para refazer sua vida amorosa.  E tudo para que? Não almejava o dinheiro, a fama, a ascensão social, pois já tinha tudo isso quando entrou na política. Foi coragem de servir ao país, o que a moveu.

Há Luiza Erundina, humilhada, vilipendiada em sua honra, alvo das piadas sexistas mais dolorosas de adversários políticos covardes, sobretudo da imprensa, que não podiam suportar que a cidade mais conservadora do país fosse governada por uma nordestina que ali chegou para vencer, superando a origem humilde e a luta para estudar e se tornar uma das primeiras mulheres a ocupar um cargo importante no Sudeste brasileiro.

Poderia escrever o dia inteiro e não daria conta de mencionar uma fração sequer das heróicas brasileiras que, com coragem e determinação maiores do que de qualquer homem por serem fisicamente mais frágeis e alvos preferenciais de preconceitos, desempenham o papel vital de mães da humanidade e formaram uma rede de amortecimento à truculência e à insensibilidade masculinas que tanto mal já causaram à nossa espécie.

Mas há um último exemplo de coragem que não poderia deixar de dar. É de duas brasileiras que, juntas, estão vencendo uma luta feroz contra a paralisia cerebral de uma delas depois de passarem um ano inteiro (de 2009 a 2010) em um hospital, sendo três meses ininterruptos em uma UTI. Refiro-me à minha filha Victoria e à minha esposa, Cristina, que velou dia e noite pela filha e, o mais impressionante, sem permitir que o resto da família ficasse sem o seu apoio.

Victoria, que tantas vezes apareceu neste blog, renasceu. E está vencendo a doença. Após aquele período doloroso que tantas vezes relatei aqui, engordou 12 quilos – chegou a pesar 19, aos 12 anos – e está contrariando toda a literatura médica, as fases de sua doença, e se tornando mais lúcida e mais hábil a cada dia, tendo começado a usar os membros como nunca usara, suportando estoicamente dolorosas sessões de fisioterapia, cirurgias e tudo mais.

Abençoadas sejam as mulheres, pois, sem as quais nós homens nem mais existiríamos, pois já teríamos sucumbido à violência, à insensatez, à insensibilidade que nos caracterizam e que fazem das mulheres o contrapeso que permitiu à humanidade sobreviver ao meio ambiente hostil, perpetuando-se como espécie.