Divergência entre juízes favorece réus “políticos” do mensalão

Análise

A esta altura, os réus políticos do julgamento do mensalão devem estar soltando foguetes. Tudo por conta do estrondoso voto do ministro-revisor do processo, Ricardo Lewandowski, o qual deixou o ministro-relator, Joaquim Barbosa, em situação tão difícil que se viu obrigado a pedir espaço para tréplica.

Os réus políticos desse inquérito, como se sabe, são o ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-ministro-chefe da Casa Civil de Lula, José Dirceu.

A condenação desses quatro réus é vital para que prevaleça a teoria de que o governo Lula institucionalizou um esquema de compra de votos de parlamentares para apoiá-lo em votações na Câmara – até hoje não há explicação sobre por que o esquema teria sido engendrado só para uma das Casas do Congresso, tendo o Senado ficado de fora.

A absolvição parcial de Cunha põe em xeque a teoria de esquema criminoso engendrado pelo governo Lula. A divergência em relação à aceitação de grande parte das teses da Procuradoria Geral da República pelo relator foi tão contundente que fez Barbosa pedir “réplica”, deixando ver que seu relatório não fala por si mesmo.

Como se diz, toda explicação que precisa de explicações adicionais não é boa.

Mais do que isso, a parcela do público que se acostumou a ler ou a ouvir análises da mídia sobre o mensalão que deixavam poucas dúvidas de que teria sido “o maior escândalo de corrupção da história” e de que haveria provas robustas de corrupção institucionalizada no governo Lula, já começa a refletir sobre a politização do julgamento.

Não há dúvida de que o que se viu na última quinta-feira no plenário do STF foi um embate político. A divergência de Lewandowski mostra que as acusações estão longe de ser inquestionáveis. As pessoas começam a entender que carregam boa dose de subjetividade.

A peça de acusação do procurador-geral da República buscou demonstrar um caso aparentemente simples de ser julgado por ser dotado de provas robustas. Quem mergulhou na argumentação de Lewandowski certamente se surpreendeu, pois revelou que não é tudo tão simples.

As pessoas dotadas de um mínimo poder de análise dos fatos já percebem a fragilidade, ao menos, do discurso que colocou no mesmo balaio todos os 38 indiciados no inquérito, pois vai ficando claro que deve haver inocentes e culpados sendo julgados.

Mais: os embates políticos entre juízes, as picuinhas, tudo isso contribui para a tese de que há interesses ocultos ou de condenar ou de absolver, e de que isso ocorre por razões que não se coadunam com o Direito.

Para os que transformaram um juízo que deveria ser sóbrio e técnico em um espetáculo, em um verdadeiro circo ou em uma novela, tudo o que não poderia ocorrer é o que está ocorrendo. Sem uma condenação rápida e indubitável de todos, sem a sobriedade dos juízes que se espera em um caso assim, fica difícil ignorar que há algo mais por trás disso tudo.

Para ajudar a extirpar o caráter técnico do julgamento, surgem ataques na mídia a Lewandowki por ter absolvido Cunha. Isso logo após ela ter demonstrado agrado pela parte do trabalho desse ministro que concordou com o relator do processo.

Então ficamos assim: juiz que concorda com as teses políticas da mídia sobre o mensalão, é bom; juiz que discorda, é ruim. Evidentemente que a antítese dessa premissa acaba se viabilizando, ou seja, juiz que concorda é ruim e juiz que discorda, é bom.

Ao dividir o STF entre juízes honestos e juízes tendenciosos, a mídia põe a Corte sob suspeita e cria ambiente para que qualquer resultado sobre os réus políticos, ao menos, torne-se questionável. Para quem sonhou com uma condenação inquestionável do governo Lula, esse é o pior cenário.