Doria propõe modelo falido de prisões privatizadas

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Em campanha para governador de SP, o ex-prefeito da capital paulista propõe privatizar presídios se for eleito. O modelo vem sendo abandonado nos EUA, onde foi criado.

A campanha de João Doria (PSDB) segue a receita usada na Prefeitura de São Paulo e aposta nas privatizações. Se eleito governador, ele promete desestatizar o sistema prisional paulista.

O tucano deixou a prefeitura sem conseguir concluir nenhuma das privatizações e concessões prometidas. Entre elas, estão a venda do Anhembi, a concessão do Pacaembu, de parques e mercados.

No Estado, até agora a estrela do pacote de privatizações é a mudança em relação ao sistema prisional, responsável por um orçamento de R$ 4,5 bilhões ao ano. São Paulo tem 227 mil presos em 170 unidades, no ambiente dominado pela facção PCC (Primeiro Comando da Capital).

O modelo de prisão privada, usado nos Estados Unidos, é polêmico por ser visto como incentivo ao encarceramento em massa. Doria mira exemplo mais próximo, de uma parceria público-privada adotada em Minas Gerais, administrada pela GPA (Gestores Prisionais Associados).

“Vamos usar o modelo de Ribeirão das Neves [cidade perto de Belo Horizonte], que é de privatização. O complexo não tem fuga, não tem celular”, afirmou em entrevista à rádio Jovem Pan. “Todos os presos trabalham oito horas por dia, primeiro para pagar o custo que representam à sociedade”, completou ele, que promete emprego a todos os detentos em São Paulo.

O formato privado tem diferenciais positivos em relação ao sistema convencional, mas não quanto ao emprego bastante relacionado ao interesse de empresários.

O índice de detentos trabalhando no complexo mineiro é menor do que o do Estado de São Paulo. Na prisão privatizada, é de 23%, contra 27% no sistema prisional paulista.

Por outro lado, o modelo desestatizado tem mais presos estudando, taxa de 37%, contra 15% em SP.
Para o presidente da Comissão de Assuntos Carcerários da OAB-MG (Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Minas Gerais), Fábio Piló, o complexo apresenta condições melhores que os presídios comuns, como lotação dentro de sua capacidade. Outro ponto positivo, diz ele, é que administração privada é pressionada por multas em caso de problemas em áreas como limpeza e segurança.

O advogado diz, porém, que presos menos perigosos acabam indo parar ali. “Por que há uma espécie de seleção? Porque, se ocorrerem motins e rebeliões, é considerado uma falta para empresa e ela é multada”, afirma. A GPA nega haver seleção.

Inaugurado em 2013, o complexo mineiro ainda não teve rebelião, mas registrou casos de fuga –em um deles, um detento escapou no meio de trouxas de roupa.

A infraestrutura resulta num valor maior gasto por preso na unidade, que hoje é de R$ 3.750 –que inclui investimento na estrutura do complexo. A média das prisões mineiras, diz Piló, é menor: R$ 2.600.

Em SP, o valor seria de R$ 1.650, levando em consideração o orçamento da pasta responsável pelas prisões e o número de presos, embora possa haver outras variáveis.

Uma polêmica que gravita o tema é a mercantilização do sistema prisional, tema levantado pelo documentário 13ª Emenda. O filme mostra como prisões privadas nos Estados Unidos geraram uma indústria muito lucrativa, e o lobby do setor articulou aprovação de leis mais duras no Congresso e aumentou seu faturamento.

O advogado Fábio Tofic Simantob, presidente do IDDD (Instituto de Defesa do”‚Direito de Defesa), diz que os norte-americanos começaram a rever essa política. “São soluções que ficam bonitas perante a opinião pública. Como se privatizar seja sempre algo bem-vindo. Mas isso esconde outras questões”, diz.

O advogado diz que o modelo trará custo extra, por embutir o lucro das empresas sobre um serviço que o Estado já paga. “E vai mercantilizar um sistema que não pode trabalhar na lógica da oferta e procura”, diz.
Ele alerta para o risco do contato entre empresas privadas e facções criminosas. “Como o estado pode transferir para uma empresa privada o controle do crime organizador dentro dos presídios?”.

Doria enfrentará uma situação complexa, com prisões superlotadas e déficit de 88 mil vagas. O setor também acumula suspeitas de corrupção em licitações, além da presença da maior facção criminosa ordenando uma série de crimes pelo país.

O presidente do Sifuspesp (sindicato dos agentes), Fábio Ferreira, diz que Doria desconhece a realidade no estado. “Ele revela que o lobby observado no Congresso Nacional em defesa da privatização do sistema prisional encontra candidaturas que apoiam os seus interesses”, diz.

Sobre os maiores custos, a assessoria do tucano afirma que buscará solução economicamente viável, mas que não considera gasto “investimento na dignidade humana e em uma sociedade mais segura”.

A campanha de Doria afirma que a finalidade é aumentar o número dos presos trabalhando e estudando, além de evitar superlotação e motins. “O modelo de PPPs nos presídios do Estado vai ao encontro da defesa de um Estado mais eficiente”, diz em nota.

Com informações da Folha de S. Paulo.