Momento crítico na política brasileira ameaça investimentos no país

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A economia brasileira viu uma contração de 22% na entrada de investimentos estrangeiros nos primeiros seis meses de 2018, em comparação ao mesmo período de 2017. Como resultado, o País caiu da sexta para a nona posição entre os maiores receptores de investimentos no mundo. O principal motivo: a incerteza política diante das eleições nacionais.

Os dados são da Conferência da ONU para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), publicados nesta segunda-feira, 15, em Genebra. No total, multinacionais investiram US$ 25,5 bilhões no país entre janeiro e junho, contra US$ 29,8 bilhões na Espanha. Nos primeiros seis meses de 2017, o volume investido no Brasil foi de US$ 32 bilhões.

A redução de 22% no caso do Brasil foi a maior entre todos os países sul-americanos. Já o fluxo de investimentos para a Argentina se manteve estável, apesar da turbulência cambial. As demais economias da região viram saltos importantes nos investimentos, incentivados pela alta nos preços de minérios. No Chile, o aumento foi de 154%, contra 43% no Peru e 15% na Colômbia.

No total, a América Latina viu uma queda de 6% nos investimentos no começo de 2018. “Incertezas associadas ao ano de eleições em algumas das maiores economias foram em parte compensadas pela alta no preço de commodities”, apontou a entidade.

Superaram o Brasil neste ano as economias da Holanda, Austrália e Singapura, que no ano passado somaram investimentos inferiores aos do País.

“A incerteza é a inimiga dos investimentos”, disse Richard Bolwijn, um dos principais autores do levantamento, numa referência ao Brasil. De acordo com ele, empresas tomam decisões de investir em um país com base nos fundamentos econômicos. Mas o momento de concretizar os planos passa por uma avaliação da instabilidade política.

De uma forma global, os investimentos no mundo sofreram uma queda de 41% nos seis primeiros meses do ano, atingindo o ponto mais baixo em mais de uma década. No primeiro semestre de 2017, o volume havia atingido US$ 794 bilhões. Neste ano, o total chegou a US$ 470 bilhões.

Mas o que também pesou no Brasil e no restante do mundo foi a mudança nas leis americanas sobre tributação.

Segundo James Zhan, diretor do Departamento de Investimentos da Unctad, o fluxo internacional foi afetado pela  repatriação dos lucros aos EUA pelas empresas multinacionais americanas. Essas companhias se apressaram para aproveitar a reforma tributaria anunciada pelo presidente Donald Trump, que reduziu de forma importante os encargos sobre as multinacionais.

Zhan aponta que, já no início do ano, sua estimativa era de que multinacionais americanas tinham um estoque de US$ 2 trilhões no exterior, em forma de investimentos. “Agora, vemos que uma parte desse volume está voltando”, indicou.

Se em 2017 os americanos investiram no mundo US$ 147 bilhões, neste ano o fluxo se inverteu e a economia dos EUA viu a repatriação de US$ 247 bilhões. Já os investimentos de empresas estrangeiras nos EUA registraram uma queda de 73%, para apenas US$ 46 bilhões.

O resultado da política de Trump, portanto, não criou suficientes incentivos para a atração de capital externos, principalmente diante das incertezas que pairam sobre acordos comerciais.

Os acontecimentos nos EUA tiveram um impacto real no fluxo global de investimentos e os níveis registrados em 2018 são os mais baixos desde 2005.

No Brasil, os investimentos americanos caíram também de US$ 675 milhões em 2017 para apenas US$ 133 milhões em 2018. Parte do que é investido no Brasil por multinacionais americanas ocorre a partir de centros offshore do Caribe, o que também registrou uma redução.

Para a Unctad, os resultados do primeiro semestre de 2018 confirmam uma tendência mundial de queda do fluxo de investimentos. Em 2017, a retração já havia sido de 23% em comparação a 2016.

“O cenário continua sombrio”, alertou Zhan.  “Os investimentos globais estão em níveis muito baixos”, admitiu. Ele, porém, afirma que não há como dizer se essa é uma tendência que mostra apenas uma desaceleração da globalização ou um verdadeiro ponto de inflexão.

Mas quem não parou de atrair o capital estrangeiro foi a China, que já é o maior receptor de investimentos do mundo. Nos seis primeiros meses, foram US$ 70 bilhões, um aumento de 6%. O volume permitiu que os chineses desbancassem os britânicos, com US$ 65 bilhões e os americanos, que aparecem apenas na terceira posição. “Apesar da tensão comercial com os EUA, a China continua a ver um aumento na chegada de investimentos”, explicou Zhan.

Hoje, puxado pela China, os países emergentes recebem 66% dos investimentos estrangeiros no mundo, uma taxa inédita. De cada dois dólares investidos na economia internacional, um vai para a Ásia. Em 2018, os países ricos receberam apenas US$ 135 bilhões e, na Europa, a queda foi de 90%.

Para a segunda parte de 2018 e para o ano de 2019, a Unctad não aposta numa recuperação forte do fluxo de investimentos. O crescimento do PIB mundial deve perder força e incertezas continuam elevadas. “As perspectivas não são positivas”, completou Zhan.

Do Estadão.