Bolsonaro pretende flexibilizar também o porte de armas por decreto

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O presidente Jair Bolsonaro diz que poderá assinar um decreto para permitir não apenas a posse de armas, como já anunciara antes, mas também seu porte.

O novo mandatário brasileiro deu a declaração nesta quinta-feira (3), em sua primeira entrevista após assumir o Palácio do Planalto, concedida ao SBT, uma das emissoras exaltadas pelo público que assistiu à sua posse.

“Vamos flexibilizar também” o porte, disse o presidente, acrescentando que isso poderá ser feito por decreto. “Pode ter certeza disso aí.”

A posse significa que a pessoa está autorizada a ter uma arma dentro de casa ou em seu local de trabalho. Já o porte é hoje proibido para quase todos os cidadãos brasileiros (há exceções, como membros de forças de segurança pública ou privada).

Bolsonaro disse que armas podem ser usadas em casos de legítima defesa e citou situações em que “muitas mulheres são vítimas de violência”.

Com a posse, afirmou, elas “poderão se defender” e entrarão no “excludente de ilicitude”, ou seja, não poderão ser punidas se machucarem ou matarem seu agressor (algo que defende para policiais). “Pode ter certeza que a violência vai cair.”

O presidente afirmou ainda que os moradores de estados com altos índices de homicídios por arma de fogo poderão ter a posse facilitada.

Segundo Bolsonaro, o decreto com novas regras para a posse —ou seja, o direito de ter uma arma em casa — deve sair ainda em janeiro e deverá definir critérios objetivos para tanto. Esta definição está sendo feita com o ministro da Justiça, Sergio Moro, que, segundo o presidente, recomendou o decreto.

“Por exemplo, uma das ideias que está no papel, e isso sai agora em janeiro com toda certeza. Ele [Moro] falou município. Como tem município que não tem muita estatística, eu falei estado que, por exemplo, o número de óbitos por 100 mil habitantes, por arma de fogo, seja igual ou superior a 10, essa comprovação da efetiva necessidade é um fato superado, ele vai poder comprar sua arma de fogo”, disse o presidente.

De acordo com o presidente, o “homem do campo” também terá direito à posse de arma. A ideia é permitir que civis possam ter duas armas e agente de segurança, “quatro, seis armas”.

​Bolsonaro já havia indicado sua intenção de liberar o uso de armas por decreto. Três dias antes de sua posse ele usou as redes sociais para afirmar que pretende assinar um decreto para permitir a posse de arma de fogo a todas as pessoas sem ficha criminal.

“Por decreto, pretendemos garantir a posse de arma de fogo para o cidadão sem antecedentes criminais, bem como tornar seu registro definitivo”, escreveu o presidente eleito.

A posse de armas atualmente no Brasil é regulamentada pela lei federal 10.826, de 2003, conhecida como o Estatuto do Desarmamento. De acordo com ela, são necessárias algumas condições para que um cidadão tenha uma arma em casa, como por exemplo ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal, comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento e declarar a efetiva necessidade da arma.

Hoje a declaração de necessidade é feita pela Polícia Federal, que pode recusar o registro se entender que não há motivos de posse para o solicitante. Segundo especialistas, uma pessoa que mora em um local ermo, afastado de delegacias e batalhões de polícia, ou alguém ameaçado, por exemplo, tem mais chances de conseguir a autorização. O rigor com a comprovação da necessidade também pode variar de acordo com o estado e a cultura local.

Caçadores, colecionadores e atiradores desportivos também podem ter a posse de armas, mas o registro é realizado pelo Exército e segue critérios específicos para cada categoria. Para atiradores, por exemplo, é preciso comprovar a participação em clubes de tiro e competições.

A posse, de acordo com a lei, significa que o proprietário pode manter a arma apenas no interior da sua casa ou no seu local de trabalho, desde que seja o responsável legal pelo estabelecimento.

Apesar dos limites, cerca de seis armas são vendidas por hora no mercado civil nacional, segundo dados do Exército obtidos via lei de acesso à informação pelo Instituto Sou da Paz. Neste ano, até 22 de agosto, haviam sido vendidas 34.731 armas no total.

Além das vendas recentes, o número de novas licenças para pessoas físicas, concedidas pela Polícia Federal, tem crescido consistentemente nos últimos anos. Passou de 3.029, em 2004, para 33.031, em 2017.

Para os contrários ao Estatuto do Desarmamento, a lei “desarmou cidadãos de bem” e não impediu o acesso de criminosos a armas. Eles afirmam que o estatuto não evitou o aumento da taxa de homicídio, hoje em cerca de 30,8 para cada 100 mil habitantes, em um total de 63.880 em 2017.

A cada 1% a mais de armas de fogo em circulação, os homicídios aumentam 2%, segundo pesquisa do economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Daniel Cerqueira, conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2016, 71,1% dos 62.517 homicídios no Brasil foram causados por armas de fogo, de acordo com o Atlas da Violência, do Ipea e do Fórum.

Segundo o Atlas, estima-se que, sem o Estatuto do Desarmamento, os homicídios teriam crescido 12% além do observado.

O total de brasileiros que se declaram contrários à liberação da posse de armas de fogo aumentou desde outubro, segundo a mais recente pesquisa Datafolha.

Em dezembro, 61% dos entrevistados disseram que a posse deve “ser proibida, pois representa ameaça à vida de outras pessoas”. No levantamento anterior, de outubro, 55% concordavam com essa posição.

No mesmo período, a parcela de pessoas que considera a posse de armas “um direito do cidadão para se defender” oscilou negativamente, passou de 41% para 37%, ou seja, no limite da margem de erro da pesquisa, que é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Outros 2% não souberam responder.

Foram entrevistadas 2.077 pessoas em 130 municípios em todas as regiões do país, nos dias 18 e 19 de dezembro.

Da FSP