Marcelo Yuka, o ativista que levou denúncia social ao pop e às multidões, morre aos 53 anos
O compositor, baterista e ativista carioca Marcelo Yuka, fundador do Rappa, morreu, às 23h40 desta sexta-feira, aos 53 anos, em decorrência de um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico. Ele estava internado no hospital Quinta D’Or, em São Cristóvão, e na madrugada do dia 4 de janeiro entrou em coma induzido.
Marcelo Fontes do Nascimento Viana de Santa Ana, o Marcelo Yuka, teve uma trajetória baseada em lutas.
Luta pela vida, após ser baleado nove vezes na rua José Higino, na Tijuca (quando saiu de seu carro para tentar proteger uma mulher que estava sendo assaltada), e ficar paraplégico, em novembro de 2000. Teve diversos problemas de saúde desde então —seu último disco, “Canções para depois do ódio”, foi lançado em janeiro de 2017 , quando o músico estava num quarto de hospital, onde passou boa parte do ano
Lutas, outras, escancaradas também nas letras que escreveu para a banda carioca de reggae-rock O Rappa , em que tratava das questões brasileiras como desigualdade social e racismo em canções como “A feira”, “Minha alma (A paz que eu não quero)” e “O que sobrou do céu”, nos anos 1990. Conseguiu, junto com os seus companheiros de banda, fazer o ativismo chegar ao rádio, à TV e às grandes plateias — enfim, ao mainstream.
Yuka foi um dos fundadores do Rappa em 1993, e permaneceu na banda até 2001, pouco após ficar paraplégico. A saída teve tons de amargura. Ele dizia que tinha sido “tirado da banda 50% por ganância, 50% por poder”. A partir de então, o Rappa (então liderado por Marcelo Falcão; agora parado) e Yuka seguiram caminhos diferentes.
Sem poder mais tocar bateria por conta do problema de saúde, a composição virou seu principal ofício. Fundou a banda F.UR.T.O. (Frente Urbana de Trabalhos Organizados), que gerou ainda uma ONG epônima, com a qual lutou em prol das pesquisas com células-tronco.
O acidente e o ativismo que Yuka liderou após ficar paraplégico foram também o foco do documentário “No caminho das setas”, lançado em 2011. O filme da diretora Daniela Broitman foi premiado pela melhor montagem no Festival do Rio daquele ano.
Mas era do livro “Não se preocupe comigo”, lançado em 2014 com Bruno Levinson, que Yuka sentia especial orgulho, por retratar de forma completa sua trajetória. Ao longo de 224 páginas, a autobiografia aborda lembranças dos bailes de subúrbio, dos contatos com a turma do reggae na Baixada Fluminense nos anos 1980 (o nome Yuka veio quando integrava o grupo KMD5), passando pelo encontro casual e marcante com o traficante Marcinho VP no alto do Morro Santa Marta durante um evento de hip-hop, pelas lembranças tristes da saída do Rappa e pela amizade com personalidades como o poeta Waly Salomão (1943-2003), o delegado Orlando Zaccone e o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL).
Apelidado de Lombriga durante a adolescência em Angra dos Reis, Yuka cresceu em Campo Grande, mas foi na Tijuca que se encontrou e viveu até o fim de sua vida. Como ativista, participou de entidades como a FASE (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional do Rio de Janeiro), em parceria com o AfroReggae, e a B.O.C.A. (Brigada Organizada de Cultura Ativista), que buscava levar atividades culturais para a população carcerária. Filiado ao PSOL, foi candidato a vice-prefeito do Rio na campanha de Freixo em 2012.
Ainda não há informações sobre o local e horário do velório de Yuka.
De O Globo