Moro parece se abdicar de convicções éticas ao aceitar cargo de Bolsonaro
Leia a coluna de José Padilha, cineasta, diretor dos filmes “Tropa de Elite” (2007), “Tropa de Elite 2” (2010) e “RoboCop” (2014).
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Sergio Bolsomoro
O governo Bolsonaro já começou carimbado por suspeitas gravíssimas de corrupção. Flávio Bolsonaro, senador eleito pelo Rio de Janeiro, está para lá de enrolado com as movimentações atípicas nas contas de seu ex-assessor e na sua própria conta.
Não precisamos de Sherlock Holmes, ou de Capitão Nascimento, ou mesmo do deputado Fraga para concluir o óbvio: ninguém movimenta recursos de maneira tão anormal quanto Flávio Bolsonaro e seu ex-assessor. Depósitos em dinheiro, feitos um seguidinho do outro, dia após dia… Se o cara não tem algo sério a esconder, no caso a famosa prática de receber parte do salário de funcionários da Alerj, podemos dizer que se esforçou muito para parecer culpado.
Aliás, o senador continua se esforçando para parecer culpado nas entrevistas que concede para tentar explicar o que parece ser inexplicável, e faz o mesmo em sua atuação no âmbito jurídico.
Seu pai, o presidente eleito para salvar os brasileiros da corrupção (real) de PT/PMDB, já o jogou do convés do barco: “Se errou, vai ter que pagar”. Presidente, ao que tudo indica, vai ter que pagar. Muito provavelmente por corrupção e desvio de verbas públicas, além de possível associação com milicianos. E não se esqueça: teve um capilé que foi parar na conta da primeira-dama…
O que me leva ao título deste artigo: Sergio Moro, o novo e poderoso ministro da Justiça, ungido pela eficiente luta contra a corrupção empreendida no âmbito da Operação Lava Jato, vai ficar assistindo a tudo isso sem fazer ou falar nada?
Queira ou não queira, ao aceitar o convite de Jair Bolsonaro para trabalhar no Ministério da Justiça, Sergio Moro avalizou implicitamente o governo Bolsonaro. Deu a este governo um carimbo de ética e de luta contra a corrupção. E, ao fazê-lo, colocou a sua biografia em jogo.
Lembro a Sergio Moro a famosa história do grande economista liberal Eugênio Gudin (1886-1986), que, apesar de ter controlado a crise econômica resultante da instabilidade política durante a transição do governo Vargas para o de Juscelino Kubitschek, pediu o boné assim que percebeu que o governo de Juscelino não seria orientado por visão liberal do controle dos gastos públicos.
Ou seja, não flexibilizou as suas convicções pessoais sobre a economia para se ater ao poder. (Espero o mesmo de meu amigo Paulo Guedes!) Pois bem: Sergio Moro vai flexibilizar as suas posições éticas para ficar em um governo que já nasce maculado?
Posto o problema está. Restam ao ministro três formas de lidar com ele: primeiro, pode calar e consentir. Segundo, pode pedir o boné. E, por fim, pode atuar decisivamente em favor de suas convicções éticas, colocando todo o aparato policial e jurídico que tem a sua disposição para investigar o senador Flávio Bolsonaro, dando um sinal claro para a sociedade de que, enquanto ministro, vai trabalhar pela justiça, doa a quem doer.
Em seu primeiro artigo como jornalista, Eugênio Gudin escreveu criticamente sobre a política de investimentos, conhecida como “50 anos em 5”, do então presidente JK. Consta que Gudin dizia o seguinte acerca das gastanças de Juscelino em Brasília: “O Juscelino era um bom rapaz, bem intencionado, mas muito playboy. Ele criou uma capital que não produz nada”. Sergio Moro criou um capital moral, e os brasileiros apostaram nele. Resta ver se este capital vai produzir algo de concreto.
Se não produzir nada, não chamarei o ministro Sergio de playboy, que isso ele não é. Mas, se o ministro Moro capitular em suas convicções éticas quando essas se aproximam dos Bolsonaros, corre o risco de ficar conhecido pela alcunha de Sergio Bolsomoro.
Da FSP