Viúva de Marielle avisa deputado fascista que vai entregar a ele a outra metade da placa quebrada

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Causou indignação a imagem no gabinete do deputado Rodrigo Amorim (PSL), na Assembleia Legislativa do Rio, de um quadro feito com um pedaço da placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, rasgada por ele em outubro do ano passado . O comportamento de Amorim foi considerado um desrespeito a Marielle, assassinada, ao lado de seu motorista, Anderson Gomes, em 14 de março de 2018, um crime que, passados 11 meses, ainda não foi solucionado. Ontem à tarde, o presidente da OAB nacional, Felipe Santa Cruz, classificou como gravíssima a atitude, afirmando que “Marielle deve ser símbolo de força e caráter” e, por isso, sua morte “não pode ser objeto de disputa política”.

Procurado, Amorim, que se elegeu como o deputado mais votado do Rio com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, disse que a peça decorativa era “símbolo da restauração da ordem no Rio de Janeiro”. Essa foi, inclusive, a mesma justificativa que apresentou quando circularam imagens dele arrancando a placa, em frente à Câmara de Vereadores, na Cinelândia, durante a campanha.

— O fragmento da falsa placa é o símbolo da restauração da ordem no Rio de Janeiro. Há alguns dias me manifestei no plenário da Alerj quanto à desordem protagonizada por alguns deputados da esquerda que pretendem transformar os corredores do Legislativo em local de doutrinação ideológica. Minha manifestação é na privacidade do meu gabinete, sem afrontar absolutamente ninguém — disse, em referência a placas com o nome de Marielle Franco afixadas nas portas de gabinetes do PSOL.

“Minha manifestação é na privacidade do meu gabinete, sem afrontar absolutamente ninguém”

Após a foto, feita por um leitor, ser exposta no site do GLOBO, deputados, até mesmo da ala conservadora, manifestaram-se contra a atitude de Amorim. Rosenverg Reis (MDB), que dividiu palanque com Jair Bolsonaro durante a inauguração da escola que leva o nome do pai do presidente, em Caxias, em dezembro, criticou a atitude de Amorim:

—Eu não faria isso. Acho que uma questão partidária não pode ser levada para o campo pessoal. Tem que respeitar a mulher e vereadora que ela foi, eleita pelo povo, pelo voto popular.

Já a deputada Mônica Francisco (PSOL), que foi assessora de Marielle Franco, afirma que Amorim agiu com “requintes de perversidade”.

— É um total desrespeito à memória da Marielle e aos familiares dela. Em um país com aumento de feminicídio e a execução de uma vereadora legitimamente eleita, um gesto como esse tem requintes de perversidade.

Viúva ironizou

Companheira de Marielle Franco, a arquiteta Mônica Benício reagiu com ironia à atitude de Rodrigo Amorim:

— Recebo a notícia com grande alegria. Ele entendeu que o lugar da Marielle é de destaque, para ser emoldurado em todos os gabinetes, seja de políticos de esquerda ou de direita. Pena que ele só tenha metade da placa. Vou doar a outra metade para que a homenagem fique completa — disse.

Procurados, quatro deputados do mesmo partido de Amorim, o PSL, preferiram não comentar o assunto. São eles: Alana Passos, Márcio Gualberto, Marcelo do Seu Dino e Gil Vianna, líder da legenda na Alerj.

Já Alexandre Knooplch (PSL) e Filippe Poubel (PSL) defenderam o correligionário.

—Rodrigo Amorim zelou pela ordem (ao retirar a placa de Marielle da Cinelândia). Só a prefeitura retirou mais de 140 placas como aquela, que, inclusive, geravam confusão para quem precisava se orientar. O artefato está dentro do gabinete dele. Mau caratismo foi quem entrou no gabinete e tirou a foto — avaliou Knoploch.

Para Poubel, Amorim tem o direito de, dentro do gabinete dele, expor suas convicções:

— Nós do PSL não negociamos nossos princípios — disse, acrescentando que não viu desrespeito a Marielle. — Respeitamos a dor de todo e qualquer familiar vítima dessa violência desenfreada, e justamente contra isso o nosso mandato está voltado.

Ex-chefe da Polícia Civil, a deputada Martha Rocha condenou o ato:

— Quero lamentar essa decisão do deputado Rodrigo Amorim. Acho que ainda devemos esclarecimento da morte da vereadora Marielle. Ela foi uma mulher que tinha lutas importantes na sociedade. Ela e todas as pessoas assassinadas devem ter suas mortes esclarecidas. Acho que o deputado Rodrigo Amorim tem projetos muito importantes para o Estado do Rio de Janeiro para serem defendidos nesta Casa, em vez de ostentar o fragmento de uma placa.

Na opinião de Renato Cozzolino (PRP), o aspecto religioso foi desconsiderado.

— Um dos mandamentos de Deus diz: ame o próximo como a ti mesmo.

Flávio Serafini (PSOL) lembrou que a polícia investiga se milicianos, que tiveram parentes lotados na Alerj, estão por trás do assassinato de Marielle:

— A gente não pode esquecer a gravidade desse crime.

De O Globo