Garimpeiros querem que Salles puna fiscais que cumpriram a lei

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Foto: Ibama/PF

Garimpeiros do Pará afirmaram, em áudios distribuídos em grupos de aplicativos, que cobraram dos ministros Onyx Lorenzoni (Casa Civil) e Ricardo Salles (Meio Ambiente) a abertura de investigação contra servidores do Ibama e do ICMBio que destruíram equipamentos flagrados pela fiscalização em crimes ambientais no final de agosto e início de setembro.

A reunião com Salles, ocorrida na segunda-feira (16) na Casa Civil, não apareceu na agenda diária divulgada pelo Ministério do Meio Ambiente. Na agenda de Onyx não constaram nomes de entidades de garimpeiros, apenas os dos representantes do governo, como se fosse uma reunião interna entre órgãos públicos, e o do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB). À tarde, a Casa Civil divulgou uma notícia sobre o assunto em seu site na internet.

O grupo de garimpeiros que esteve em Brasília é o mesmo que, durante cinco dias, organizou a interdição da rodovia BR-163, perto de Itaituba (PA), após uma operação de fiscalização do Ibama, ICMBio e Força Nacional ter flagrado a invasão da floresta nacional do Crepori, área protegida pela legislação ambiental. Baseados em legislação aplicada desde o ano 2008, os fiscais queimaram pelo menos duas retroescavadeiras e vários motores usados pelos garimpeiros nos crimes ambientais.

“Nós precisamos com urgência de, no prazo de uma semana, apresentarmos ações que foram feitas de forma truculenta, arbitrária, onde destruíram maquinários ao arbítrio, fora da lei. Gente, quem tiver alguma ação me passe por favor, precisamos apresentar isso. Ministro exigiu [isso] na mão para abrir sindicância contra os agentes. […] Eles vão tomar, junto com a Polícia Federal, ação com relação a isso, contrário [a] aos atos arbitrários”, disse o advogado Fernando Brandão em áudio distribuído aos garimpeiros. Ele defende uma cooperativa de Moraes de Almeida, um bairro de Itaituba. Segundo o advogado, a cooperativa tem cerca de 1,8 mil filiados.

Um outro garimpeiro foi além, afirmando que o governo se comprometeu a “rever a legislação” sobre queima de equipamentos – o advogado nega que essa promessa ocorreu. “Mostramos a nossa causa, as nossas reivindicações. […] O que eles nos pediram foi um prazo de uma semana para poder rever a lei em questão da queimada de máquinas e mostrar uma solução para nós, para a nossa legalização de áreas de Flonas [florestais nacionais], de APAs [áreas de proteção] e de reservas indígenas. Então no dia 2 está marcada uma nova audiência em Brasília, às 10h da manhã, e eles vão mostrar para nós as soluções para poder mudar essa vida nossa aí, beleza?”, diz um garimpeiro. O governo tem prometido abrir garimpo em terras indígenas.

Um terceiro garimpeiro que disse ter participado da audiência afirmou que tinha “uma ótima notícia”. “Marcaram uma nova audiência para o dia 2 e até lá eles vão rever a lei sobre as queimadas de máquinas, entendeu? Eles vão rever a lei sobre as APAs, sobre as reservas e sobre as Flonas e dia 2 vão dar a decisão deles. Então até o dia 2 nós estamos mais ou menos calçados”, disse o garimpeiro.

À Folha o advogado Fernando Brandão confirmou que será apresentado “um levantamento” de ações do Ibama para que medidas sejam tomadas pelo governo contra servidores que tenham praticado “ilegalidades”. Segundo o advogado, na reunião ele “interpelou” Salles porque um diretor do Ibama teria afirmando que só existe uma ação judicial “sobre atos arbitrários do Ibama”. Brandão disse que “não generaliza” as acusações contra os servidores do Ibama, “são alguns que estão fazendo de forma arbitrária”. Para o advogado, somente em “caso muito raros” a legislação permite a destruição do maquinário.

Brandão afirmou que os garimpeiros aceitaram “dar uma trégua” e suspender o bloqueio da rodovia BR-163 até a realização da reunião e “a garantia de que as pautas pudessem ser garantidas”. “Agora, eu te garanto uma coisa, se daqui para o dia 2 tiver uma única queima de máquinas você pode segura porque… Não é a minha promessa, eu inclusive sugiro que não façam, mas [os garimpeiros] vão começar a trancar as BRs não só do Pará, mas do Brasil inteiro”, disse Brandão. O advogado disse que Salles “não teve um posicionamento enfático em relação à queima de maquinários”. “O que nós gostaríamos realmente era que ele tomasse a postura de falar para o presidente do Ibama, ‘olha, aqui nós não aceitamos que queime’, até por ele ser um operador do direito. Nós queríamos que ele determinasse aos dois órgãos que não queimassem mais o maquinário antes do devido processo legal”, disse o advogado dos garimpeiros.

‘DERRUBA ESSE TREM’

Em outros áudios que circularam entre garimpeiros, eles falam em derrubar um helicóptero do Ibama que fazia sobrevoos na região da floresta nacional do Crepori, perto de Itaituba, em apoio à fiscalização. “Não tem ninguém aí na região que tem um [fuzil] AR-15 para derrubar esse bicho, não? Joga esse trem pro chão, menino”, provoca um garimpeiro.

“Vou falar uma coisa o que eu penso, eu sou brasileiro também mas o povo mais covarde que existe se chama brasileiro. Porque se fosse um país qualquer aí fora já tinha derrubado esse helicóptero faz é hora. Tem é medo”, concordou outro garimpeiro. “Aí sim, aí eu dou valor. Derruba esse trem aí, uai. Eles não chegam aqui e metem fogo, não apavora, e não dá nadinha? Vamos ver se nós derrubar um helicóptero aí se não vai dar nada também, uai.”

Na nota publicada no site da Casa Civil na internet, o órgão informou que o governo recebeu “representantes de garimpeiros paraenses que haviam bloqueado trecho da BR-163 na semana passada”. Segundo o órgão, Onyx “assegurou que o governo se compromete a achar uma solução ‘estruturante e de longo prazo’ para as demandas trazidas pelos garimpeiros”. “O governo do presidente Jair Bolsonaro respeita o setor produtivo e tem a verdade como um valor fundamental”, afirmou, segundo a notícia distribuída à imprensa. “Em duas semanas nos reuniremos novamente e apresentaremos nossas propostas de soluções para a questão da regularização fundiária e a exploração mineral em terras indígenas”, informou o texto da Casa Civil divulgado no site.

Folha indagou à Casa Civil se houve ordem do governo para investigar fiscais, mas não houve resposta a esse quesito até o fechamento deste texto.

Da FSP