Alemanha diz que nazismo foi de direita

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Foto: Everett Historical e Shutterstock

Apesar de Jair Bolsonaro (sem partido) declarar “não ter dúvidas” de que o nazismo é de esquerda, a história e estudiosos da ideologia que marcou o Terceiro Reich da Alemanha contradizem o presidente do Brasil. Em abril do ano passado, o chanceler Ernesto Araújo havia retomado essa discussão quando afirmou que o nazismo era de esquerda – opinião corroborada por Bolsonaro. Agora, a demissão do secretário de Cultura, Roberto Alvim, após a polêmica causada por um vídeo com referências nazistas, trouxe a questão de volta à tona.

Uma das justificativas apresentadas pelo presidente está no nome do partido de Adolf Hitler. “Não há dúvida (que o nazismo foi de esquerda). Partido Socialista… como é que é? Partido Nacional-Socialista da Alemanha”, disse Bolsonaro. Já o chanceler disse em entrevista ao canal Brasil Paralelo, do Youtube, que o nazismo e o fascismo são resultados de “fenômenos de esquerda”. Segundo Araújo, regimes totalitários distorceram o sentimento de nacionalismo, o que, para ele, seria uma tática da esquerda.

As declarações vão de encontro ao que o Museu do Holocausto, visitado por Bolsonaro, diz em seu site: que o Partido Nazista da Alemanha era um entre vários “grupos radicais de direita”. Para o historiador Marcos Guterman, o nazismo não pode ser qualificado como de esquerda em nenhuma circunstância. “Não tem nada a ver com o socialismo marxista. Tem a ver com o sentido da totalidade da sociedade alemã”, afirmou ele.

Para ele, o argumento de que o nazismo é de esquerda é insustentável e tem um único objetivo: mobilizar a militância. “Ele está respondendo a um pensamento do eleitor.” Em entrevista à Deustche Welle no ano passado, o embaixador da Alemanha no Brasil, Georg Witschel, chegou a afirmar que essa discussão “não tinha base honesta”.

O nazismo foi uma corrente política alemã que surgiu na esteira da ascensão do fascismo na Europa. Fundamentou o Estado totalitário de Adolf Hitler. Assim como o fascismo, se caracterizou pelo nacionalismo, autoritarismo e anticomunismo. O historiador Uzi Rabi, da Universidade de Tel-Aviv, ao ter contato com as declarações de Bolsonaro, demorou para entender a linha de raciocínio do presidente. “Eu nunca ouvi isto antes. Não sei do que eles estão falando.”

A embaixada alemã no Brasil publicou em 2018 um vídeo em sua conta oficial no Twitter em que afirma que alemães “não escondem seu passado”. Com imagens de arquivo, o vídeo expõe:

“O pensamento é: ‘conhecer e preservar a história para não repeti-la’. Na Alemanha, é crime: negar o Holocausto, exibir símbolos nazistas, fazer a saudação ‘Heil Hitler’. E quando o extremismo de direita volta a acontecer no país?” A embaixada coloca no vídeo uma imagem de um protesto antinazista onde é possível ler um cartaz com a mensagem: “Quem protesta contra os nazistas não é de esquerda, mas normal.”

 

No Brasil, o extinto Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), órgão de repressão política e social ativo durante a ditadura, classificou o nazismo como um extremismo da direita. “Vigilantes estamos para todas as formas de extremismo aqui alimentadas, sejam da esquerda, como o comunismo, sejam da direita, como o fascismo e o nazismo”, apontou o órgão em nota registrada nos arquivos do Acervo Estadão, datada de 27 de julho de 1949.

Como publicou o Estado, o brasileiro Avraham Milgram, que trabalhou como pesquisador do Museu do Holocausto, atribui a declaração de Bolsonaro à política brasileira. “Esta teoria não tem base histórica nenhuma. Acho que tem mais a ver com o presente do que com o passado. É uma ignorância, mas que talvez seja uma reação ao fato de a esquerda ter ligado Bolsonaro a Hitler.”

Estadão