Especialista diz que decisão de Toffoli é ilegal
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Recordemos a sequência dos fatos, com atenção para as datas.
Em 24 de dezembro passado, foi publicada a Lei 13.964 de 2019, que deu vida ao chamado “pacote anticrime” desenhado pelo ministro Sérgio Moro, com os acréscimos que o Congresso Nacional achou por bem fazer – jogo jogado. Um desses acréscimos foi o chamado “juiz das garantias”, medida que visa a aprimorar a garantia de imparcialidade do juiz criminal.
A própria lei previu 30 dias para sua entrada em vigor. O prazo, que não era folgado, transcorreria em boa parte durante o recesso de final de ano, quando tribunais encontram-se desmobilizados.
Três ações, cujos (de)méritos não vêm ao caso aqui, foram ajuizadas no STF com variados argumentos contra o juiz das garantias, entre os dias 27 de dezembro de 2019 e 1o de janeiro de 2020. Foram distribuídas para relatoria do ministro Luiz Fux, com pedidos de liminar.
Em 15 de janeiro de 2020, o ministro Dias Toffoli, na qualidade de presidente e plantonista, concedeu decisão liminar que, entre outras coisas, suspendia a vigência da nova garantia pelo prazo de seis meses. Como a autoridade do Supremo é limitada à revisão de atos e leis com fundamento na Constituição, era preciso que Toffoli indicasse por que um prazo administrativamente inconveniente para a vigência de uma lei seria, só por isso, inconstitucional. Poderia ter invocado a sempre abusada proporcionalidade, embora não fosse mesmo caso de sua aplicação; ou a separação de poderes, embora seja próprio ao Legislativo criar garantias processuais que cabem ao Judiciário observar; ou ainda a razoabilidade, que demonstraria ao menos um esforço de sua parte. Nada disso, contudo, apareceu em sua decisão.
Eis que nesta quarta-feira, 22, apenas sete dias depois da decisão liminar de Dias Toffoli, o ministro Luiz Fux tomou nova decisão liminar que se sobrepõe à decisão de Toffoli. Criticando, não sem razão, as muitas invenções contidas na decisão individual do presidente do Tribunal, saiu-se ele mesmo com suas próprias jabuticabas, ao condicionar a previsão de direitos processuais à previsão orçamentária. Curiosa a repentina preocupação do ministro com a higidez orçamentária do Judiciário, cujos cofres por anos sangraram pagando a juízes um penduricalho indevido por força de decisão liminar sua. Fux sonegou ao Plenário do STF a apreciação de sua decisão até que a pressão pública tornou-se insuportável.
Do imbróglio, algumas conclusões são possíveis: a primeira, é palpável uma relativa desmoralização do ministro Dias Toffoli, cuja decisão foi atropelada de um modo que, se não chega a ser ilegal, vai contra a liturgia de um órgão que deve funcionar colegiadamente, sob a liderança de seu presidente, sobre pena de gerar insegurança jurídica. A segunda, o descontrole do exercício de poderes individuais por seus ministros, que abusam de liminares que frequentemente usurpam poderes que a Constituição conferiu apenas ao Tribunal, como conjunto de julgadores. Por fim, a certeza de que quem perde com esses conflitos são os de sempre: os jurisdicionados e a reputação pública do próprio STF.